Os clubes brasileiros de futebol vivem, historicamente, uma realidade de irresponsabilidade em sua gestão corporativa. O esporte e a cultura de administração se desenvolveram de forma contrária aos preceitos de uma administração transparente e saudável, mantendo, desde a origem, o amadorismo típico da Associação Esportiva.
Seus Estatutos permitem que dirigentes incapacitados sejam eleitos, gerando diversos problemas, como: (i) amadorismo da gestão e dos mecanismos de controle e fiscalização do Clube, inviável diante da complexidade que envolve o dia-a-dia do futebol, com inúmeros contratos, regulações específicas de diversos entes e grande movimentação financeira; (ii) pouca democratização no processo de eleição aos cargos diretivos: a não remuneração de dirigentes estatutários é regra, que, concentra o poder na mão de grupos políticos formados por pessoas abastadas que podem abrir mão de salários, em vez de trazer pessoas que possam, de fato, contribuir de forma profissional. Não raramente, esse fator enseja conflitos de interesse entre os dirigentes e os clubes.
Dessa forma, apesar de movimentar bilhões no país, a realidade dos grandes clubes brasileiros é de endividamento.
Quando essa bolha do endividamento dos clubes estava prestes a estourar e tornar os grandes clubes do país inviáveis, fora sancionada a Lei 13.155/15, conhecida como PROFUT (Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro), criada com o intuito de parcelamento do endividamento dos Clubes em até 240 vezes.
O PROFUT estabeleceu princípios e práticas de responsabilidade fiscal e financeira e de gestão transparente para entidades esportivas como contrapartida para o pagamento dos parcelamentos especiais das dívidas pela União, dispondo também sobre gestão temerária.
Com esse novo cenário legislativo para os clubes, a criação da Autoridade Pública de Governança de Futebol (APFUT) e a previsão de sanções administrativas no futebol, os Clubes que não se adequarem, além de perderem o parcelamento e as certidões positivas com efeito de negativas, podem perder pontos nos campeonatos ou ser rebaixados automaticamente.
Sendo assim, com as novas exigências trazidas pelo PROFUT, que vão ao encontro de modelo de regulamentação que visa moralizar e profissionalizar o futebol, criar um novo cenário no combate à corrupção e na promoção do Compliance e Gestão Corporativa no âmbito da Lei Federal nº 12.846/13 (a Lei da Empresa Limpa ou Lei Anticorrupção), faz-se necessária uma mudança no paradigma da administração dos clubes, que deve ser pautada por uma gestão transparente e profissional.
Esse novo cenário exige dos clubes uma mudança em sua governança corporativa, que pouco evoluiu ao longo dos anos, tendo, praticamente, as mesmas características amadoras dos primórdios das práticas do esporte, ignorando o grande salto dado pelo esporte em todos os outros aspectos. O esporte cresceu em complexidade e volume financeiro de forma astronômica, mas ainda continua sendo gerido praticamente como era quando concebido enquanto associação esportiva amadora, sendo que grande parte do problema é o modelo dos Órgãos Diretivos destes Clubes, que permite que a gestão seja feita por profissionais, em regra, amadores.
Essa estrutura associativa tradicional dos clubes condiciona-os à manutenção de uma forma de administração inviável para sua sustentação saudável, podendo ser a base para a análise de riscos da estruturação de um sistema de Compliance.
Sendo assim, o Compliance nos clubes de futebol é uma ferramenta para ajudar a sanar vários problemas de governança corporativa, funcionando como um mecanismo de controle interno nos clubes, com viés de proteger a instituição e moralizá-la.
A forma como são feitas as eleições e mudanças nos estatutos e a forma como é estruturada a Diretoria destes clubes são fatores primordiais para se formar uma base na qual se sustenta a formação de um Sistema de Compliance específico para o futebol, principalmente no Brasil. Dessa forma, é necessário que se faça um estudo da estrutura dos Clubes.
Seguindo esse raciocínio, foi promovido pelo Coritiba Football Club o primeiro sistema de Compliance em um clube de futebol da América Latina, lançado com o nome de Conduta Coxa Branca, liderado pelo Diretor Jurídico do Clube, Gustavo Nadalin.
Há muito que se produzir em termos de Compliance no futebol e, com as novas exigências trazidas pelo PROFUT e o recente licenciamento dos clubes promovido pela CBF, que entrará em vigor em 2018, e que cobra diversas mudanças na gestão dos Clubes, o uso de sistemas de controle interno será um caminho necessário para a sobrevivência dos Clubes.
Fernando Monfardini é advogado formado na Faculdade Brasileira-MULTIVIX no ano de 2015. Atualmente cursa especialização em Compliance, Lei anticorrupção e Controle da administração Pública na Faculdade de Direito de Vitória-FDV.
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Benê Lima