Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quinta-feira, janeiro 31, 2013

CBF anuncia tabela da Copa do Brasil e sorteio definirá confrontos a partir das oitavas de final

Do Uol, São Paulo

Palmeiras é o atual campeão da Copa do Brasil - venceu o Coritiba na final de 2012

Palmeiras é o atual campeão da Copa do Brasil - venceu o Coritiba na final de 2012

A CBF (Confederação Brasileira de Futebol) divulgou na tarde desta quinta-feira a tabela da Copa do Brasil 2013. A competição terá uma novidade: partir da quarta fase (oitavas de final), com a entrada dos times brasileiros que estão na Libertadores, os confrontos serão definidos por sorteio.

O Santos, um dos grandes times do torneio, estreará contra o Flamengo-PI, fora de casa. Já o Flamengo duelará contra o Remo. A Copa do Brasil começa no dia 3 de abril, com 80 equipes.

Final da Copa do Brasil - Coritiba x Palmeiras

Foto 39 de 56 - Luiz Felipe Scolari comemora a conquista do título da Copa do Brasil pelo Palmeiras. Time paulista ficou com a taça após o empate por 1 a 1 com o Coritiba no estádio Couto Pereira MaisDanilo Verpa/Folhapress

Corinthians, Palmeiras, Fluminense, Atlético-MG e Grêmio estão automaticamente classificados para as oitavas de final, e se juntarão a outros dez times classificados na terceira fase.

O São Paulo é a única exceção. Campeão da Copa Sul-Americana em 2012, os paulistas terão que defender o título este ano. Por isso, serão substituídos pelo Vasco da Gama, que só entra na disputa a partir do dia 21 de agosto.

A CBF ainda não divulgou as datas dos confrontos da primeira fase, o que será feito na próxima segunda-feira, dia 4 de fevereiro.

Confira todos os confrontos:

CONFIRA TODOS OS CONFRONTOS DA PRIMEIRA FASE DA COPA DO BRASIL

Flamengo/RJ x Remo/PA Sport/PE x Vitória da Conquista/BA Botafogo/RJ x Sobradinho/DF Portuguesa/SP x Naviraiense/MS
Sampaio Corrêa/MA x Campinense/PB ABC/RN x Parnahyba/PI CRB/AL x Fast Clube/AM Paysandu/PA x São Raimundo/RR
Ceará/CE x Ceilândia/DF Vitória/BA x Mixto/MT Figueirense/SC x AC ou ES* Santos/SP x Flamengo/PI
ASA/AL x RN3* Boa/MG x Salgueiro/PE São Caetano/SP x Arapongas/PR Joinville/SC x Aracruz/ES
Internacional/RS x Rio Branco/AC Paraná/PR x São Bernardo/SP Cruzeiro/MG x CSA/AL Náutico/PE x CRAC/GO
Santa Cruz/PE x Guarani/CE Criciúma/SC x Noroeste/SP Caxias/RS x Resende/RJ Betim/MG x Bangu/RJ
Avaí/SC x RJ4* Coritiba/PR x CSP/PB Atlético-GOx Cametá/PA Bahia/BA x MAC/MA
América-MG x Gurupi/TO Águia de Marabá/PA x Nacional/AM Grêmio Barueri/SP x Cianorte/PR Luverdense/MT x Tupi/MG
Goiás/GO x Oratório/AP Ponte Preta/SP x Itabaiana/SE Atlético-PR x Brasil/RS Guarani/SP x Confiança/SE
Santo André/SP x Veranópolis/RS Bragantino/SP x Águia Negra/MS América-RN x Ji-Paraná/RO Fortaleza/CE x Luziânia/DF
  • *Equipes ainda não foram definidas

STJD intima presidente da Federação Gaúcha para explicar acidente em estádio do Grêmio

O que resultou da “avalanche”

O STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) da CBF intimou na tarde desta quinta o presidente da Federação Gaúcha de Futebol, Francisco Novelleto, a dar explicações sobre o acidente com torcedores na Arena do Grêmio nesta quarta.

Ele terá que dizer ao STJD os motivos para não terem sido instaladas cadeiras no local em que ocorreu a tradicional “avalanche”, que feriu torcedores gremistas.

Novelletto confirmou ao blog a convocação, mas não soube dizer a data em que será ouvido por estar fora da federação, sem o documento em mãos. Ele afirma que não tinha poder para obrigar o Grêmio a instalar as cadeiras. Apesar de o jogo contra a LDU ser pela Libertadores, o STJD considera a federação uma das responsáveis pela partida.

A geral em que aconteceu o problema foi alvo de diversas polêmicas antes da inauguração do estádio. A Brigada Militar era contra a geral. A federação também registrou no Ministério Público ser contrária a não instalação de cadeiras por motivos de segurança. Mas a diretoria gremista ficou do lado da torcida.

- Fonte: Blog do Perrone

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Mariano Moreno, diretor da escola de técnicos da Espanha

“Atentem para o texto a seguir. Ninguém vai ensinar o pulo do gato, mas com esforço podemos inferir algumas das artimanhas do esperto bichano.” (Benê Lima)
"Estamos à frente porque aprendemos a trabalhar com os jovens", aponta
Guilherme Yoshida
 

Quando conversamos com Mariano Moreno entendemos o porquê de dois treinadores espanhóis terem sido eleitos os melhores do mundo por duas temporadas seguidas (Pep Guardiola, em 2012, e Vicente del Bosque, neste ano).

O diretor técnico da Escola Nacional de Treinadores da Federação Espanhola de Futebol sabe exatamente as razões para a Espanha ter conseguido este destaque na área do treinamento e da gestão de assuntos relacionados ao campo nos últimos anos.

"Formamos treinadores desde 1944. Além disso, aprendemos a trabalhar melhor com os jovens no futebol. As categorias de base espanholas são melhores que de outros países. Utilizamos mais trabalhos com bola, mais fundamentos técnicos, enfim, temos trabalhado muito melhor. E, isso influencia na qualidade da formação de um treinador", justificou ele, em entrevista exclusiva à Universidade do Futebol, durante um curso de que participou no clube Audax, em São Paulo.

Moreno foi jogador de futebol durante os anos de 1955 a 1966. Após a aposentadoria, não fugiu à regra e tornou-se treinador, atuando em clubes como Atlético de Madrid, Sporting de Gijón, Celta de Vigo, Tenerife e Cadiz.

Mas, para o atual dirigente europeu, o ritual desta passagem de comandado para comandante só foi possível por que na Espanha exige-se um aprendizado contínuo para o exercício da profissão de técnico.

"Na Espanha, exige-se que os treinadores que atuam em equipes profissionais façam um curso de reciclagem a cada três anos. Eles têm de renovar o diploma com uma jornada de atualização. Se eles não fizerem isso, eles perdem sua certificação. Por que a cada Copa do Mundo, a cada Copa América ou Eurocopa, sempre há alguma ligeira variação ou evolução do futebol e o técnico tem de estar ciente disso. Quando um treinador encerra sua formação, ele pensa que sabe tudo e isso é muito ruim", afirmou.

Mariano Moreno, que ainda foi diretor de futebol do Barcelona de 1988 a 1992 e, desde então, trabalha na federação espanhola e também é instrutor técnico na Fifa e Uefa, apontou também que a padronização do trabalho de formação de técnicos em todo o território espanhol contribuiu muito para este avanço.

Isso porque, em toda a Espanha, a formação para atuar como treinador é a mesma: no primeiro nível, são formados profissionais para treinamentos com crianças até o juvenil; o segundo é voltado para dirigir equipes amadoras, enquanto a terceira etapa é para trabalhar no futebol profissional, da primeira ou segunda divisão. E a ideia da Uefa, segundo ele, é unificar os conteúdos em toda a Europa.

Nesta entrevista, Mariano Moreno ainda falou de metodologias, futebol brasileiro e por que um técnico de futebol precisa ter uma grande capacidade de liderança. Confira:

Universidade do Futebol – Como funciona o trabalho da escola em relação à formação de treinadores de futebol? Como é a grade curricular, duração e qual a abordagem e a metodologia ensinada?

Mariano Moreno – Na Espanha, o trabalho de formação de treinadores de futebol existe há muito tempo. O primeiro curso com este perfil foi realizado na Espanha em 1944. Naquela época, as aulas eram voltadas mais para profissionais que queriam atuar com crianças e realizar trabalhos de formação. Já a formação para técnicos da categoria profissional, o primeiro curso aconteceu entre 1948 e 1949.

E a formação de treinadores na Espanha, desde aquele tempo, aconteceu ininterruptamente e sempre em três níveis. No primeiro nível, são formados profissionais para treinamentos com crianças até o juvenil; o segundo é voltado para dirigir equipes amadoras, enquanto o terceiro nível é para trabalhar no futebol profissional, da primeira ou segunda divisão. Então, desde 1944, a escola nacional forma treinadores sem interrupções. Todos os anos se formaram treinadores de lá para cá. Além da escola nacional, que pertence à Federação Espanhola de Futebol, existe também uma escola em cada federação regional.

São 22 federações regionais que possuem um curso certificado de formação de técnicos. Todas com o mesmo conteúdo da escola nacional: aulas de técnica, tática, preparação física, organização de futebol, todos os programas são os mesmos. Qualquer que seja o nível, primeiro, segundo ou terceiro, é o mesmo em toda a Espanha. Não há diferenças. E cada nível dura cerca de um ano.

 

Mariano Moreno revela que atualmente profissionais de outros países vão à Espanha saber como se formam técnicos
 

Universidade do Futebol – Mas sr. Mariano, quem definiu estes conteúdos na Escola Nacional de Treinadores da Federação Espanhola de Futebol?

Mariano Moreno – Os conteúdos de futebol, de tática, de técnica, de estratégia, de preparação física, de metodologia, são os professores da Escola Nacional de Treinadores da Federação Espanhola de Futebol que definem. A cada quatro ou cinco anos, fazemos uma atualização dos programas das aulas. Agora, sempre buscamos trabalhar para melhorar os conteúdos ao longo dos anos.

Atualmente, em cada nível, há dez matérias. Há áreas importantes como as aulas de fundamentos técnicos, táticos, estratégicos, sistemas de jogo; é muito importante também a de preparação física específica, de metodologia, e agora temos também no curso uma abordagem sobre sociologia, regras de jogo e uma nova parte que criamos para conhecimentos de inglês e de informática.

 

Diretor técnico da Escola Nacional de Treinadores da federação espanhola esteve no Brasil para participar de um curso no Audax, em São Paulo
 

Universidade do Futebol – Baseado em quais necessidades essenciais foi desenvolvida a grade curricular para a formação de treinadores de futebol na Espanha?

Mariano Moreno – Os conteúdos da formação de técnicos são muitos lógicos e claros. São conteúdos relacionados ao futebol. Agora, inclusive, teremos um curso específico de formação de treinadores para o futsal. Bem diferente obviamente. Mas, então, para os alunos do nível um, por exemplo, são desenvolvidas aulas para quem for trabalhar com o futebol para crianças, desde oito anos até 18. E assim por diante. No nível dois ou três, é a mesma coisa, mudando apenas a profundidade e a complexidade do curso.

Cada curso também tem um livro. Na primeira etapa, por exemplo, voltado para a iniciação, os conteúdos são basicamente divididos em 50% teoria e 50% prática. No entanto, nos níveis dois e três, as aulas são 30% de teoria e 70% de prática. São oferecidos mais trabalhos de campo nestas últimas fases do curso. Portanto, a grade curricular varia de acordo com as necessidades de cada nível.

 

Para Mariano Moreno, as categorias de base espanholas são melhores que de outros países
 

Universidade do Futebol – Mas, em relação à metodologia utilizada nos cursos da Escola Nacional de Treinadores da Federação Espanhola de Futebol, ela segue a mesma linha que Paco Seirul-lo trabalha no Barcelona?

Mariano Moreno – Sim, seguimos. Mas, lembrando que Paco Seirul-lo é um preparador físico, que tem a especialidade em treinamentos físicos. Não é técnico de futebol. Ele trabalha no Barcelona como preparador físico. Já um treinador de futebol tem de dominar o todo: a parte técnica, a parte tática, sistemas de jogo, a preparação física, o treinamento, a psicologia, a metodologia, entre outras. São dez conteúdos diferentes que fazem parte da formação de um técnico em cada nível.

Universidade do Futebol – Sim, compreendo. Mas, é por que gostaríamos de saber um pouco mais sobre o conceito que a Federação Espanhola de Futebol opta por implantar no seu curso de formação...

Mariano Moreno – Sim, sim. A escola nacional é um departamento muito importante para a federação. Estou como diretor há 22 anos e como professor ainda mais tempo. E, em todo este período, sempre tive e ainda tenho uma preocupação e uma inquietude com o conceito para melhorar a formação dos técnicos.

Com o tempo, o futebol vai mudando, vai revolucionando, e a formação dos treinadores também. Um técnico de futebol tem de estar antenado com o que está acontecendo hoje em dia. Na Espanha, exige-se que os treinadores que tenham a formação profissional, do nível três, façam um curso de reciclagem a cada três anos. Eles têm de renovar o diploma com uma jornada de atualização. Se eles não fizerem isso, eles perdem sua certificação. Por que a cada Copa do Mundo, a cada Copa América ou Eurocopa, sempre há alguma ligeira variação ou evolução do futebol e o técnico tem de estar ciente disso. Quando um treinador encerra sua formação, ele pensa que sabe tudo e isso é muito ruim.

 

Na eleição da Fifa dos dois últimos anos, os vencedores foram treinadores espanhóis: Vicente del Bosque, da seleção espanhola, e Guardiola, agora no Bayern de Munique
 

Universidade do Futebol – Há alguma regulamentação na Espanha para se trabalhar como técnico de futebol?

Mariano Moreno – Para iniciar o curso de técnico do nível um da Escola Nacional de Treinadores, o interessado tem de ter, no mínimo, o ensino médio completo. E, na Espanha, o governo reconhece esta formação de técnico de futebol como uma profissão.

Mesmo assim, o profissional, após formar-se, pode continuar estudando e ingressar em uma universidade. Pode ser uma licenciatura ou graduação em Educação Física, por exemplo, pois o governo tem comprovado que o curso é bom, reconhecendo a formação e dando acesso, aos técnicos de níveis três, para chegar às universidades. Mas, uma coisa: na Espanha, não se pode trabalhar como técnico se não tiver diploma de treinador.

Universidade do Futebol – Quais as semelhanças e especificidades que esta grade curricular (programa de conteúdos) tem se comparado com as grades curriculares para formação de treinadores na Inglaterra, Itália, Alemanha e outros países europeus que têm uma tradição na formação de treinadores?

Mariano Moreno – Boa pergunta, pois a Uefa está trabalhando muito nesta parte de unificar a formação de técnicos de futebol na Europa. E a Espanha é um país que a Uefa reconhece que o trabalho de formação é bom. Na verdade, há um reconhecimento da entidade por programas de seis países da Europa: Alemanha, França, Itália, Holanda, Dinamarca e Espanha. Então, há um reconhecimento por todas as titulações feitas na Espanha, que tem trabalhado muito também para igualar o trabalho de formação de treinador em toda a Europa.

Hoje em dia, no curso da Uefa, há os níveis um, dois e três, igual ao que é oferecido na Espanha. Os conteúdos são similares, o que muda são o idioma e um pouco da mentalidade. Porém, tanto a formação da Uefa quanto à da Espanha, por exemplo, vale para toda a Europa. Os cursos são reconhecidos em 53 países do continente europeu.

 

Para manejar um grupo de 22 ou 24 atletas, a liderança é muito importante para um treinador, aponta Mariano Moreno
 

Universidade do Futebol – A escola forma mais professores ou treinadores? Qual a proposta pedagógica do curso?

Mariano Moreno – Os dois. Porque todo treinador tem de ser um pouco professor. Tem de saber ensinar, transmitir o conhecimento. Então, sempre procuramos formar o profissional com estes dois perfis. Porém, nós formamos profissionais que acabam atuando somente como professor. Porque, por exemplo, para se dar uma aula de fundamentos da área de Medicina é necessário ser um médico ou doutor, para dar aula de Psicologia é preciso ser licenciado em Psicologia, para dar Pedagogia há que ser diplomado em Pedagogia.

Então, para dar técnica, tática, preparação física, regras de jogo, tem de ter o diploma do nível três da escola nacional de treinador. Não pode ser professor com a formação apenas do nível dois. Para falar de sistemas de jogo, estratégia, enfim, tem de ser técnico formado para atuar no futebol profissional. Se não, ele não pode atuar como professor também.

Universidade do Futebol  Qual a importância que a escola dá à liderança em relação aos demais conhecimentos técnicos dos treinadores?

Mariano Moreno – Muito, porque um técnico de futebol tem de ser um líder. Tem de ser líder. A liderança é bastante abordada nas salas de aulas do curso. Um treinador precisa lidar com diretores de clubes, elenco, imprensa, enfim, precisa saber fazer com que todas essas pessoas que o cercam acreditem e confiem nele.

Então, para manejar um grupo de 22 ou 24 atletas, a liderança é muito importante. No entanto, depende um pouco da personalidade de cada um, há treinador que é mais líder, o outro é menos. Mas, para ser um bom treinador, é preciso ter uma grande capacidade de liderança.

 

Mariano Moreno conta que, no nível um do curso, que é voltado para a iniciação, os conteúdos são divididos em 50% teoria e 50% prática. Nos níveis dois e três do prgrama, as aulas são 30% de teoria e 70% de prática
 

Universidade do Futebol – Você acredita que a Espanha, atualmente, está à frente dos demais países em relação à formação de técnicos de futebol? Por quê?

Mariano Moreno – Sim, porque formamos treinadores desde 1944. É muito tempo. E todos os anos, desde então, sempre há uma nova geração de técnicos formados. Além disso, também fizemos muito intercâmbio com outros países para ampliar o nosso conhecimento. E agora, profissionais de outros países vêm à Espanha saber como formamos técnicos. Então, o trabalho de formação de treinadores na Espanha é muito bom.

Universidade do Futebol – Mas, sr. Mariano, apesar de historicamente a Espanha sempre ter formado bons treinadores, você não acredita que houve uma evolução neste aspecto mais acentuada nos últimos anos em relação ao que foi no passado mais distante?

Mariano Moreno – Sim, também acho. Mas, sabe por quê? Porque aprendemos a trabalhar melhor com os jovens no futebol. As categorias de base espanholas são melhores que de outros países. Utilizamos mais trabalhos com bola, mais fundamentos técnicos, enfim, temos trabalhado muito melhor. E isso influencia na qualidade da formação de um treinador.

 

Diretor espanhol aponta que na Espanha, hoje em dia, há jogadores jovens com qualidades que antes não havia

 

Universidade do Futebol – O que o senhor acha do futebol brasileiro atual?

Mariano Moreno – É o melhor futebol do mundo. Não há dúvidas. Há outras equipes, outros países, como Argentina, Alemanha, Espanha, que também têm futebol de qualidade. Mas, o melhor de todos é o Brasil. O jogador brasileiro tem muita qualidade e, onde há bons jogadores, há bom futebol. Hoje, na Espanha, há jogadores jovens com qualidades nas seleções sub-16, sub-17 e sub-19. Então, nós treinadores espanhóis, estamos tranquilos também.

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Núcleo de Futebol da Faculdade de Motricidade Humana

Grupo de alunos portugueses que está na Universidade do Futebol apresenta as ideias sobre a modalidade
Equipe Universidade do Futebol
 

O Núcleo de Futebol da Faculdade de Motricidade Humana (NF-FMH), tal como o projeto que o inspirou, o "Gabinete de Futebol", foi fundado por estudantes em 2009 e encontra-se atualmente incorporado no Gabinete de Perícia do Desporto da tradicional faculdade portuguesa.

Os objetivos dele centram-se na realização de encontros, workshops, estudos multidisciplinares, entre outros, com o intuito de ajudar no desenvolvimento do pensamento e da metodologia de ação na modalidade, mantendo sempre uma estreita relação com a sua aplicabilidade no terreno.

O NF-FMH está presente na seção “Grupo de Estudos” da Universidade do Futebol, colaborando com discussões sobre o esporte a partir de um viés técnico-científico. Nesta entrevista, respondida a várias mãos, Diogo Pereira, Filipe Neto, João Peres, José Barbosa e Sérgio Raimundo, os alunos apoiados pelos professores Carlos Neto, Duarte Araújo e Ricardo Duarte, traçam alguns diagnósticos.

Para eles, neste momento, a formação de treinadores no país natal encontra-se estagnada, devido a divergências entre a Federação Portuguesa de Futebol e o Instituto do Desporto de Portugal.

“Já há alguns anos que em Portugal se treina de maneira diferente. Há já alguns anos que se procura otimizar as relações que se estabelecem em campo, não separando as diferentes dimensões. Tudo isto resulta de um constante questionamento acerca das práticas diárias de um treinador e metodologias de treino”, avaliam.

O grupo cita uma característica portuguesa que se reflete nos treinadores: a adaptabilidade rápida a diferentes contextos, tal como na vida – Portugal apresenta uma grande taxa de emigração e de sobrevivência às diversas crises que o assolam.

“Na nossa opinião, é cultural, é histórico, está nos genes. O povo português mantém, na sua maneira de encarar a competição, a alma que tinha quando da Era dos Descobrimentos. Somos competitivos, somos estratégicos, e quando gostamos de algo, entregamo-nos de coração”, resume.

Universidade do Futebol – Como surgiu a ideia de criação do grupo, quantas pessoas estão envolvidas e quais os objetivos do projeto?

NF-FMH – A ideia surge numa de muitas tardes à conversa sobre o futebol, os clubes nos quais estávamos inseridos e as possibilidades de fazer algo proativo, numa faculdade bastante reconhecida internacionalmente, mas onde cada vez menos “se investigava” o futebol.

Como já nos conhecíamos há alguns anos, pois nos cruzávamos em aulas teóricas, cafés, e convívios diários, sabíamos que em cada um de nós havia um empreendedor, havia alguém interessado em ir mais além. Todos já tínhamos tido diferentes experiências no futebol, debatíamos os jogos das nossas equipes e das competições nacionais e internacionais durante toda a semana... Estávamos empolgados com o futebol e a possibilidade de fazer parte dele.

O Núcleo foi então fundado em 2009 por cinco estudantes da Faculdade de Motricidade Humana (Diogo Pereira, Filipe Neto, João Peres, José Barbosa e Sérgio Raimundo), e na altura contou com o apoio de alguns professores (prof. Carlos Neto, prof. Duarte Araújo, prof. Ricardo Duarte). Inspirados pela mística do famoso antigo “Gabinete de Futebol”, composto por elementos como o prof. Arcelino Mirandela da Costa, Jesualdo Ferreira, Nelo Vingada, Carlos Queiroz, entre outros, iniciamos as nossas atividades.

Com algum receio, mas com muita vontade, as ideias foram surgindo – umas mais utópicas que outras – e o 1º seminário realizou-se, contando com a presença de oradores como: prof. Sidónio Serpa, prof. Silveira Ramos, prof. Fonte Santa, prof. Paulo Cardoso, prof. João Barnabé, e os moderadores prof. Carlos Neto e prof. Duarte Araújo. Após este evento, onde o Salão Nobre da FMH esteve completamente cheio, chegaram-nos os parabéns de vários professores, muitos alunos perguntaram se podiam fazer parte, e nós acreditamos ainda mais na ideia. Com os pés bem assentes no chão, mas cheios de planos e ambições, continuamos paulatinamente.

Neste momento estão envolvidos cerca de 15 alunos e ex-alunos, alguns professores, e outros colaboradores diretamente ligados ao futebol. Associados ao Laboratório de Perícia do Desporto da FMH, estamos envolvidos em vários projetos dentro e fora da faculdade, permitindo um maior envolvimento dos alunos no mundo do futebol, e o seu contributo para a ciência.

Os objetivos inicialmente traçados eram os seguintes:

“Realização de tertúlias, workshops, estudos multidisciplinares, entre outros, com o intuito de ajudar ao desenvolvimento do pensamento e metodologia de ação na modalidade, mantendo sempre uma estreita relação com a sua aplicabilidade no terreno. Pretendemos também promover estágios e protocolos com diversas entidades desportivas. A nossa vontade de saber é grande, e queremos estar preparados, o melhor possível, para as incertezas do futuro.”

Convidamos o leitor ainda a fazer o download gratuito das nossas revistas por aqui.
 




Quem é José Mourinho
 

Universidade do Futebol – De que modo a Motricidade Humana pode ajudar no processo de desenvolvimento do futebol e das modalidades esportivas de uma forma geral?

NF-FMH – Como refere Manuel Sérgio, “a motricidade humana é o ser humano em movimento intencional, visando a superação” e “o ser humano só o é, enquanto ato de superação ou de criação”. Nesta busca pela transcendência, tem sido estudado o referido movimento intencional. Decomposto em partes, ou tendo em conta o seu contexto, este estudo contínuo compreende o todo como mais do que a soma das partes, tem levado a constantes novos paradigmas ao nível do treino desportivo. E tal como nos mostra a história, a evolução resulta do questionamento e do pensamento crítico, sempre em busca da superação e da transcendência. No fenômeno desportivo, a evolução significa novas metodologias de treino, novas técnicas de salto, novos materiais desportivos, novas metodologias de análise da performance, etc.

Ou seja, a teoria aliada à prática, considerando que “a prática é mais importante que a teoria (...) No entanto, a teoria é indispensável... para perspectivar e antecipar uma nova prática.” (Manuel Sérgio, 2009), conduz-nos a novos paradigmas, conduz-nos a novas práticas. Característica indissociável à evolução, à superação e à transcendência. Que é para isso que cá andamos, para nos superarmos, para nos transcendermos.

 



Manuel Sérgio, filósofo do futebol



Universidade do Futebol – Na visão do grupo, de que modo o esporte - e mais precisamente o futebol - pode funcionar como um instrumento capaz de possibilitar a emancipação e a autonomia dos sujeitos?

NF-FMH – Aproveitando a resposta à pergunta anterior, “o ser humano só o é, enquanto ato de superação ou de criação”, e no desporto, estes são dois pressupostos inerentes à sua prática. O contexto desportivo permite e proporciona a convivência com os seus valores através das sensações que transmite, das relações interpessoais que permite, da procura de ser melhor que ontem.

Quem o pratica, viaja e conhece o mundo, chora e ri com os colegas do vestiário, ganha/perde jogos no último minuto, bate/perde recordes, emociona-se, sacrifica-se, magoa-se, enfim, vive! Todos os valores de entreajuda, sacrifício, respeito, responsabilidade, e todos os demais importantes na vida em sociedade, estão presentes no desporto.

Tal como podemos ler em “A origem Desportiva do Estado”, de Ortega e Gasset, o desporto e o mundo são o espelho um do outro, e a organização das sociedades tem origem desportiva. Então, que melhor contexto para viver em sociedade, que o contexto desportivo? O desporto impõe regras e impõe valores. Tanto nas relações interpessoais como no conhecimento de si mesmo. Aliado o competir contigo e o competir contra ele, o desporto oferece a possibilidade da emancipação, da autonomia, da superação e da transcendência.




Entenda mais sobre as peculiaridades da Uefa e de que forma o Brasil pode avançar em relação à formação de treinadores
 

Universidade do Futebol – Em um texto de autoria de Ricardo Duarte, há uma referência de que o sucesso do atacante está relacionado com a sua habilidade em detectar o momento adequado para aumentar o seu diferencial de velocidade relativamente ao defensor. De modo prático, como potencializar essa condição?

NF-FMH – Tal como o professor também refere no mesmo artigo, essa habilidade pressupõe que “o atacante esteja afinado perceptivamente à informação proveniente da movimentação do adversário”, ou seja, para potencializar essa condição, é necessário que “os jogadores desenvolvam flexibilidade na sua afinação e re-afinação perceptiva”. Como? Proporcionando aos atletas exercícios de treino que lhe permitam vivenciar, inúmeras vezes, a situação de 1x1, orientando-os para onde devem retirar a informação necessária para melhor se “afinarem”, colocando os constrangimentos necessários para que o atleta detectar quando se abrem as janelas de oportunidade para sair em vantagem do lance.

Se o mesmo estudo nos refere que tal habilidade apenas é eficaz quando as distâncias interpessoais são curtas, devemos proporcionar isso no exercício. Se o referido estudo nos diz que o atleta apenas se deve focar na informação cinemática fornecida pelo adversário direto, devemos guiar o atleta nesse sentido.

Resumindo, de acordo com o objetivo pretendido, devemos proporcionar aos atletas o experienciar de situações semelhantes, através de constrangimentos ao exercício, como sendo o espaço de ação, a situação de início do exercício (p. ex. em perseguição, organizado, orientado para a baliza etc..). Como complemento, mas não menos importante, o exercício deve ser acompanhado de um feedback, feedback este não apontado o caminho certo, mas guiando para que o atleta lá chegue por ele próprio.

Ainda assim, o referido autor aponta sugestões de exercícios no mesmo artigo, que pode ser consultado no nº 1 da nossa revista.




Jogos Reduzidos e Adaptados no Futebol: 
confira as novidades sobre a Metodologia de Treinamento através de jogos com o curso online da Universidade do Futebol
 

Universidade do Futebol – Ainda de acordo com aquele artigo, especificidades como o espaço de jogo, o tempo de exercício e/ou o número de jogadores, têm uma relação estreita com a idade, o nível de desempenho e o próprio diagnóstico feito pelos treinadores?

NF-FMH – A partir das condicionantes que impomos aos exercícios, não só encaminhamos os jogadores para determinados comportamentos, como aumentamos ou diminuímos a complexidade do mesmo e o número de informações a detectar e selecionar pelos jogadores, para agirem. Ou seja, quando mais jovem for o atleta, menos desenvolvido estará cognitivamente para captar, interpretar e selecionar tais informações. Logo, estas devem ser em menor número, menos complexas.

Se o nível de desempenho é reduzido, é normal que o atleta necessite de mais tempo para agir, mais tempo para decidir. Logo, se o contexto for complexo, mais dificuldade terá o atleta em decidir bem. O inverso também se aplica: mais desenvolvido cognitivamente/melhor nível de desempenho necessita de um estímulo mais complexo para que possa errar, corrigir, evoluir. Em suma, tarefas com mais informação. Essas mesmas condicionantes podem influenciar o desempenho do atleta e consequentemente o diagnóstico dos treinadores.

 

"Como Ensinar Futebol": curso online da Universidade do Futebol apresenta os pilares da Pedagogia da Rua; aprenda a criar ambientes de aprendizagem

 

Universidade do Futebol – Pedro Guerreiro, treinador do Juvenil B do C.F. “Os Belenenses”, indica que um atleta com dificuldades sociais necessita de ter outra afetividade e para tal é importante que o grupo perceba isso, que se solidarize com isso. Os clubes portugueses, de modo geral, compartilham dessa visão?

NF-FMH – Pensamos que sim. A sociedade portuguesa é altruísta e normalmente coloca-se à disposição para ajudar, e isso também se reflete no futebol. Ainda para mais quando se fala num colega de equipe. Alguém com quem se sofre, e tal como supra referi, alguém com quem se partilham emoções.

Contudo, tal como a sociedade em geral, também os jovens estão cada vez mais egoístas e mais preocupados somente com o seu bem estar. Mas é o papel do desporto, ainda para mais quando se fala num desporto coletivo, transmitir esses valores de solidariedade, amizade e entreajuda.

É muito comum vermos os clubes a darem a mão aos atletas, tomando atenção à sua alimentação, indo buscá-los em casa para treinarem ou jogarem, dando apoio aos estudos, etc. Portanto, sim, podemos afirmar que os clubes portugueses, de um modo geral, compartilham da visão do treinador Pedro Guerreiro.




Formação de jogadores de futebol: as ações e as consequências 
 

Universidade do Futebol – O comportamento lúdico tem uma dimensão ancestral independente da cultura ou da situação geográfica. O brincar vive-se, experimenta-se e dificilmente se explica. Qual é a importância do “ludus” na vida das crianças e para o desenvolvimento do futebolista?

NF-FMH – Ninguém melhor que o presidente da nossa FMH consegue falar sobre o referido assunto. Tal como diz o professor Carlos Neto, “brincar é treinar para o inesperado, é adaptar-se a situações imprevisíveis”, e não é a imprevisibilidade uma das principais características do futebol? O ludus garante o chamado ‘alfabetismo ou literacia motora’, que fornece aos jovens maior adaptabilidade física nas diferentes situações de vida e de jogo.

O brincar proporciona um sem número de experiências motoras e cognitivas, preparando a criança não só para o futebol como para qualquer desporto. A criança torna-se mais ágil, mais “esperta”, mais rápida, decide melhor, procura soluções, resumindo, “safa-se” melhor.

Para perceber realmente a importância do comportamento lúdico, podemos ler o artigo do Prof. Carlos Neto.

 

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Universidade do Futebol – Qual é a importância do erro neste processo de ensino-aprendizagem das categorias de base?

NF-FMH – Em primeiro lugar temos de caracterizar o erro. Só há erro quando existe algo correto, um padrão. Ou seja, quando a criança joga na rua não há erro, há sim insucesso na sua ação. Ela queria fintar e perdeu a bola, ela queria rematar ao gol, e saiu pelo lado. Através desse insucesso a criança vai procurando calibrar as suas ações, de maneira a atingir o seu objetivo. E sempre por: tentativa-erro, tentativa-erro, tentativa-erro. Durante todo este processo a criança passa por diferentes experiências e vai descobrindo novas soluções, o que é bastante benéfico para a sua evolução.

Na rua, se eles se querem “safar” (leia-se ter sucesso), têm de resolver melhor. E assim, ele próprios vão experimentando e procurando novas soluções.

O erro acontece quando entra em cena um adulto, preocupado em fazer com que o jovem atleta compreenda o jogo (passa a existir um padrão, passa a existir erro). Aqui o erro constitui-se mais uma vez muito importante, desde que bem aproveitado pelo adulto, levando a criança a perceber o que fez mal e o que pode fazer melhor: Descoberta Guiada.

Se a criança não perceber porque errou, não vai perceber porque tem de fazer de outra maneira. Então vai optar por determinada ação, só porque lhe disseram que era assim, não adaptando o seu comportamento às diferentes situações. O erro permite isso, ir experimentando, ir vivenciando e, enfim, ir-se adaptando dando cada vez melhores respostas.

É importante experimentar diferentes contextos, ou melhor, as mesmas situações em condições diferentes e perceber que normalmente, nesta situação é melhor optar por aqui, e na outra é melhor ir por ali. Porque mesmo sendo um desporto imprevisível, o futebol tem a sua ordem e linearidade dentro do seu caos. E normalmente, há uma tendência para ocorrer determinado comportamento. Quanto mais afinado estiver o atleta, melhor responderá às alterações do contexto.

O erro nos mostra o caminho por onde não seguir, num determinado contexto, obrigando-nos, pois, a buscar soluções, a optar pelo caminho que nos garanta o sucesso da ação.
 


Confira especial da Universidade do Futebol sobre trabalho desenvolvido nas categorias de base dos clubes brasileiros; clique aqui 
 

Universidade do Futebol – Por que muitos treinadores e dirigentes transportam a responsabilidade do insucesso ao jovem atleta quando este não consegue se firmar e uma equipe principal? Há medidas a serem tomadas para o desenvolvimento desta etapa e a consequente conclusão do ciclo?

NF-FMH – Esse é um processo muito sensível. As medidas tomadas dependem de diversas variáveis: momento da equipe, talento, maturidade e posição do jogador, competições em disputa, etc. Quando estamos perante um atleta fora de série (Cristiano Ronaldo, Neymar, Messi), o mais certo é que as preocupações caiam sobre o lidar com a imprensa, com o dinheiro, com os empresários, a fama, pois são atletas que desde cedo (ainda juniores) já dão o seu contributo e fazem a diferença na equipe principal, seja qual for o momento da equipe. Resumindo: quando o jogador é bom, é bom e pronto! Assume-se assim que lhe é dada uma oportunidade.

Falando agora nos atletas que demoram mais um pouco a afirmar-se, devem sim ser tomadas medidas para um bom desenvolvimento e conclusão do ciclo (afirmação na equipe principal). É este um período sensível, pois, tal como referi acima, pode sofrer a influência de diversas variáveis. É importante que os colegas ajudem na sua integração, que o motivem e que o disciplinem, principalmente os mais velhos, indicando-lhes a conduta a seguir enquanto jogadores.

É também importante que o treinador saiba ler os momentos certos para lançar o jovem atleta (dificuldade do jogo, probabilidade de ter sucesso, etc.), e que o acompanhe de perto a fim de verificar como vai estando a sua confiança e capacidade de trabalho. O jovem atleta deve estar ciente de que necessita de trabalhar afincadamente para que as oportunidades que lhe forem concedidas, sejam realmente aproveitadas.

Não esquecendo que estas oportunidades devem sim aparecer (não só os cinco minutos finais de uma partida que já está ganha), e o atleta deve experienciar diferentes contextos/níveis de jogo.


Sérgio Raimundo, coordenador técnico do Étoile Lusitana

 

Universidade do Futebol – Qual é o valor de promover nos jogadores o espírito de partilha e entreajuda, através do conhecimento e contato com realidades e contextos diversificados e desafiadores?

NF-FMH – Os referidos contextos proporcionam a procura da superação, e quando os atletas perceberem que com o colega do seu lado, tudo se torna mais fácil, irá transportar também isso para a competição. Os desportos coletivos acarretam a necessidade de sofrer, trabalhar, partilhar, com/pelo outro, e quanto mais isso estiver presente na cabeça dos atletas, mais fácil é encarar a competição. Já nem falando na importância desses valores para a vida.

Universidade do Futebol – O que seria um atleta inteligente?

NF-FMH – Um atleta inteligente é um atleta que decide bem, sempre! Tanto fora da competição (cuidar da sua carreira, alimentação, descanso, etc.), como dentro desta: ao saber identificar as janelas de oportunidade para as diferentes ações (passar, rematar, cruzar, interceptar, fechar linhas de passe, etc.).

Em suma, um atleta inteligente sabe selecionar a informação mais pertinente que o jogo lhe transmite, e decide em conformidade. Normalmente os atletas mais experientes são quem melhor detecta as informações mais importantes, e, como já experienciaram várias situações semelhantes, decidem melhor e mais rápido. A diferença está no saber, dentre a enorme quantidade de informações que o jogo fornece, identificar as mais pertinentes, para decidir.
 


Especial Footecon - Atleta Inteligente

 

Universidade do Futebol – Em um editorial, Filipe Neto fala sobre uma hipotética função: o “adepto desportivo”. Qual é a importância destes agentes externos para a imagem e sustentabilidade dos clubes e o próprio desenvolvimento da modalidade?

NF-FMH – Hoje em dia, as vitórias já não significam só pontos para o campeonato ou avançar eliminatórias. Significa também mais espectadores no estádio, mais patrocinadores, ou seja, maior sustentabilidade dos clubes. É importante que os clubes consigam manter os seus torcedores satisfeitos, daí a existência de departamentos de marketing, dentro dos próprios clubes. É necessário manter o adepto com o clube, e isso é conseguido por exemplo através do merchandising (cachecóis, bandeiras, camisas, etc.), das atividades organizadas (corrida do clube, dia da mulher, dia do sócio, etc.), dos protocolos com outras instituições (desconto em postos de gasolina, em cinemas, seguradoras, etc.), mas o principal motor de todo o envolvimento e fidelização são as vitórias.

Tudo isto é uma bola de neve, pois para se obterem vitórias é necessário também, para além, de uma boa organização, boas equipes. E boas equipes custam mais dinheiro, mais patrocinadores. Patrocinadores esses que mais investem quanto maior for o número de adeptos e espectadores.

Agora, obviamente que o adepto desportivo é um agente de extrema importância para um clube, pois além da vantagem financeira que pode trazer, consegue dinamizar a vida da instituição através de uma participação ativa na vida do clube: presença nas competições, nas assembleias gerais, nas votações, etc.

Podemos encontrar na nossa revista nº4 um artigo de Rui Biscaia que descreve a importância do referido agente.
 

Universidade do Futebol – Bruno Travassos assinou um artigo no qual, tendo por base a relevância que o passe parece assumir para o desempenho das equipes, apresenta um estudo feito no Laboratório de Perícia da FMH. Nele procurou-se perceber quais são as variáveis que influenciam o comportamento dos jogadores no surgimento de um passe. Poderia falar um pouco mais sobre isso e o conceito “tiki-taka”?

NF-FMH – O autor refere que para surgir o passe, é necessário que o portador da bola detecte uma “janela de oportunidade” espaço-temporal. Ora, esta abertura só se constrói através da constante movimentação dos jogadores, na procura de se mostrarem válidos para receberem a bola, ou seja, com uma distância do adversário que considerem segura para dar continuidade ao processo ofensivo. Tal como o prof. Bruno escreve, para que se “pratique” o ‘tike-taka’, “é fundamental um comportamento proativo na exploração desses espaços por parte do portador da bola, mas também dos companheiros de equipe que procuram deslocar-se para um espaço que permita o surgimento da “janela de oportunidade” para o passe.”

Todo o treino é construído com base nesse pressuposto básico: a garantia de linhas de passe válidas. O portador da bola deverá “estar afinado” para detectar essas linhas de passe, e “calibrado” para fazer a bola chegar em condições (força do passe, direção do passe, velocidade do passe, etc.). Obviamente que estamos perante um estilo de jogo que exige um grande nível técnico, mas acima de tudo, de leitura de jogo e movimentação.

Universidade do Futebol – Se o objetivo comum é elaborar treinos de qualidade e montar grandes equipes, não há um ponto da “linha” de desenvolvimento da Periodização em Futebol em que a Periodização Tática e Periodização Física possam se aproximar?

NF-FMH – Tudo se aproxima e tudo se distancia. Principalmente no futebol, onde hoje jogamos bem mas perdemos, ontem jogamos muito mal, mas ganhamos, amanhã vamos jogar muito bem e ganhar e depois de amanhã vamos jogar mal e perder. Em virtude de ser um dos desportos mais meditáticos, sofre também consequências disso: todas as pessoas opinam, todos acham que se fosse assim tinha corrido melhor que assado, decide-se muitas vezes com base nos resultados imediatos, e a leitura não é feita da melhor maneira, ou seja, de maneira profunda e contextualizada.

Existe uma frase muito conhecida, que diz que “se funciona, é pedagogia”. Concordando ou não, podemos passá-la para o futebol: “se ganhaste, treinaste bem”. E como o futebol é muito imprevisível, nem sempre se estabelece esta relação. Agora, o que é “treinar bem”? É adotar a periodização clássica? É adotar a Periodização Tática? É treinar integrado? Na minha ótica, treinar bem é simplesmente preparar a equipe coletivamente e individualmente para a competição. Dando maior ênfase às relações que se estabelecem entre os jogadores, e aqui não falo de relações afetivas, mas sim comportamentais: coordenação entre jogadores, afinação e calibração dos mesmos às informações que o jogo transmite. Essa é a maior especificidade do jogo.

E se treinarmos na procura de uma melhor coordenação entre os atletas, estamos também treinando as dimensões física e técnica de uma maneira específica, pois os jogadores irão realizar o que realmente se passa no jogo: o drible com oposição em determinada posição no campo e enquadrado com a meta, o passe com adversários pressionando e com os colegas nas posições onde habitualmente estão, etc. Obviamente que procurando melhor desenvolver o atleta, devemos nos preocupar mais no que fisicamente ou psicologicamente está pior e não o deixa ter sucesso.

Podemos também entrar aqui noutra discussão: como treinar durante a formação, e como treinar no alto rendimento. Na nossa opinião, a Periodização Tática adequa-se muito mais ao alto rendimento do que à formação, onde devemos ter como principal preocupação: preparar os jovens, de acordo com as suas etapas de desenvolvimento, para todo e qualquer tipo de jogo, de treinador, de clube, mas acima de tudo, para compreender o jogo e saber interpretá-lo de maneira a decidir bem mais vezes.

Mas será que a Periodização Tática também não procura o que acima referimos? Também procura. Portanto, achamos que acima de qualquer conceito ou metodologia está o conhecer o jogador como pessoa e relações que estabelece com os colegas (tanto na vida como no campo), fazê-lo saber ler o que o jogo lhe diz, mantê-lo focado no compromisso. E isso implica um pouco de tudo: de físico, de técnico, de psicológico, de tático.



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Universidade do Futebol –
 Há hoje em Portugal uma escola portuguesa de formação de treinadores? Em que os treinadores portugueses se diferenciam dos demais treinadores?

NF-FMH – É caricato, pois neste momento a formação de treinadores encontra-se estagnada, devido a divergências entre a Federação Portuguesa de Futebol e o Instituto do Desporto de Portugal. Agora, na nossa opinião, essa escola existe, sim, não de forma estruturada, mas baseada na vontade que caracteriza o povo português, na procura do conhecimento, na procura da superação.

Já há alguns anos que em Portugal se treina de maneira diferente. Há já alguns anos que se procura otimizar as relações que se estabelecem em campo, não separando as diferentes dimensões. Tudo isto resulta de um constante questionamento acerca das práticas diárias de um treinador e metodologias de treino.

Foi em Portugal que surgiu o conceito de Periodização Tática, que choca com tudo o que até aí se tinha constatado acerca do treino. Todo este constante questionamento resulta em novas abordagens, novos paradigmas, o que traz evolução. É também através da maneira de viver as relações pessoais, os sentimentos e as emoções que o treinador português consegue motivar uma equipe e comprometê-la a um objetivo.

Na nossa opinião, é cultural, é histórico, está nos genes. O povo português mantém na sua maneira de encarar a competição, a alma que tinha aquando da Era dos Descobrimentos. Somos competitivos, somos estratégicos, e quando gostamos de algo, entregamo-nos de coração.

Depois, há também outra característica portuguesa que se reflete nos treinadores: a adaptabilidade. Adaptamo-nos rapidamente a diferentes contextos. E somos assim na vida (grande taxa de emigração, sobrevivência às diversas crises que assolam o nosso país, etc.), tal como somos nas profissões que exercemos, nos adaptamos!




Especial: treinadores estrangeiros - semelhanças e peculiaridades no comando de uma equipe

 

Universidade do Futebol – Em que José Mourinho se diferencia dos demais treinadores? O que ele representa em termos simbólicos para o país?

NF-FMH – Dado o seu mediatismo, muito se fala acerca de José Mourinho, mas pouco se acerta. Quem com ele convive de perto, fala acima de tudo num homem muito atento à dimensão social do desporto, procurando conhecer profundamente os seus jogadores, de maneira a poder mexer com a sua motivação, compromisso e rendimento.

É normal vermos os seus plantéis com um nível de compromisso muito grande para com os objetivos definidos, “destruírem-se” após a sua saída. José Mourinho maximiza as relações interpessoais, mantendo toda a estrutura focada no projeto desportivo, dedicando-se de corpo e alma.

Além disso, é sobretudo conhecido o cuidado com o treino, o jogo e o seu lado estratégico. O treino é muito específico, procurando moldar comportamentos, e preparar a equipe para tudo o que possa acontecer (através também do grande conhecimento dos adversários). Os jogadores de Mourinho são jogadores mais focados, muito objetivos, e também mais libertos da pressão, pois ele trata de a captar toda para si através da imprensa.

Acima de tudo, Mourinho diferencia-se por dar tudo pelos seus, fazendo com que estes dêem tudo pelo compromisso.

E, tal como o próprio afirma, ele decide melhor sob pressão, e no futebol, são inúmeras as decisões que se tomam sob pressão.


José Mourinho: um treinador pós-moderno 

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