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"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quarta-feira, novembro 21, 2007

Escolas de educação física têm erro conceitual na programação

Treinadores esportivos devem ser mais ligados às ciências humanas do que biológicas

Autor: Guilherme Costa
Revisão e intertexto: Benê Lima

Antes de decidir qual é a formação tática mais adequada para uma partida ou qual vai ser a programação para um treino, um técnico precisa conhecer e saber interpretar seu elenco. Não adianta escolher os 11 jogadores com fundamentos mais apurados se eles não estiverem em boa fase emocional ou tiverem problemas de relacionamento. Diante de tantas possibilidades de conflitos internos ou interpessoais, os treinadores ainda carregam um problema oriundo de sua má formação: o conceito de educação física.

O filósofo francês René Descartes (1596 – 1650) foi responsável por uma separação conceitual entre alma e corpo. Para ele, o pensamento era essencialmente da alma e o corpo era um objeto no espaço (portanto, em movimento). Assim, a medicina e a educação física surgiram como ciências voltadas unicamente para os cuidados com o corpo.

Um dos responsáveis por uma mudança conceitual na educação física moderna foi o português Manuel Sergio, que esteve no Brasil na há bem pouco para conversar com treinadores e preparadores físicos de futebol. A principal meta dele, evidenciada desde o início da palestra, foi explicitar que a atividade de um técnico deve ser permeada por conhecimentos das ciências humanas e não apenas biológicas.

“O ser humano é mais do que a gente vê. Um conceito que eu defendo desde 1968 é a idéia de totalidade, de não separar corpo e mente. Hoje em dia essa palavra foi substituída por complexidade, que é uma característica fundamental a todo ser humano. Portanto, não adianta um treinador tentar trabalhar com seus atletas sem ser um especialista em ciências humanas. Se ele não for, nunca vai deixar de ser mediano”, determinou Manuel Sergio.

A explicação do português para essa idéia de dar ênfase ao caráter humano na formação de profissionais de educação física é a implicação que a função deve ter na equipe: “Nenhum técnico é médico e nem deve ser. O futebol é uma reunião de várias ciências, e não apenas as biológicas. E o treinador deve ser extremamente dotado em humanidades para ter liderança suficiente para comandar um grupo”.

A postura de Manuel Sergio foi corroborada pelas palavras do treinador Celso Roth, que esteve no evento. “Cabe ao treinador saber administrar e liderar uma equipe, e essa é uma tarefa que exige muito trabalho psicológico. Não estou falando de psicologia só motivacional, mas é preciso saber lidar com cada um dos atletas. O treinador precisa ter a sensibilidade de tentar entender o momento de cada um”, explicou.

“Trabalhar com um grupo de pessoas é sempre complicado, e por isso é que os treinadores precisam estar preparados para lidar com uma série de conflitos. Tentar entender os atletas é um ponto fundamental para tentar tirar o melhor da equipe”, completou Nelsinho Baptista, que também esteve no evento.

O ideal do pensamento de Manuel Sergio é que os treinadores esportivos tenham uma formação baseada nas ciências humanas e que sejam cercados por uma equipe multidisciplinar para ajudá-los nas questões biológicas. É por isso que o português ressaltou tanto a participação do restante da comissão técnica.

“Um saber não progride sozinho. Por isso, é fundamental que o treinador se cerce de profissionais que sejam especialistas em suas áreas e que possam contribuir para ele tomar as decisões. E cabe a ele, com o desprendimento necessário para um profissional da área de humanas, tomar as decisões que sejam melhores para a equipe a partir das características pessoais que ele dispõe”, completou o português.

O grande impasse para que o caráter interdisciplinar seja inserido nas comissões técnicas do futebol atual, portanto, ainda é a figura arcaica e despreparada que aparece na grande maioria dos treinadores. E esse problema conceitual reflete uma formação errônea, que não é privilégio de novos ou veteranos.

“Ter uma equipe multidisciplinar é muito fácil e até comum nas comissões técnicas atuais. O problema é que ninguém usa isso e ninguém permite uma interação entre as áreas. É fundamental que o técnico tenha segurança para fazer trabalhos assim e não se sentir ameaçado”, disse Celso Roth.

O preparador físico do São Paulo, Carlinhos Neves, também defendeu a importância da atuação dos profissionais da comissão técnica: “Tudo precisa ser feito em conjunto, com a evolução da equipe sendo o objetivo mais claro. E é importante tentar estabelecer um diálogo para ganhar a confiança do atleta e ajudar o trabalho. Não dá para trabalhar só com testes e resultados frios”.

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Benê Lima