Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quarta-feira, junho 17, 2009

QUE O FUTEBOL SE PROTEJA DELES

Colunista da Folha em apuros

Junho 17, 2009 by Paulinho

Por ALBERTO DINES

http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=542IMQ001

Não são poucos os jornalistas que se sentirão aliviados no dia em que a Folha de S.Paulo anunciar que José Sarney, seu colaborador das sextas-feiras, licenciou-se, aposentou-se ou ganhou o Nobel de Literatura e, por isso, deixará o jornal.

O vexame não atinge apenas os jornalistas que trabalham na Folha, familiarizados com a simbologia da Página 2, onde germinou a extraordinária ascensão do jornal em junho de 1975. A presença de Sarney nesta página é afronta gremial, corporativa, mexe com os brios dos profissionais brasileiros empenhados em fazer do jornalismo o ofício da decência e da consciência.

Apesar do maciço monolitismo que domina a grande imprensa, a Folha de S.Paulo conseguiu a façanha de ficar sozinha no incrível apego ao ex-presidente da República. Em apenas cinco meses, depois de uma controversa carreira de mais de meio século, o senador converteu-se em unanimidade nacional: o mar de lama que afoga nosso Legislativo é fruto da sua leniência e da sua complacência com a malfeitoria e a prevaricação.

A direção da Folha sabe disso, há tempos admite que a permanência de Sarney no seu quadro de colaboradores e amigos respinga na sua imagem nódoas indesejáveis, compromete a sua história, coloca suspeições onde só deveria existir transparência.

Os responsáveis pelos destinos da Folha, agarrados às birras juvenis, perderam uma magnífica oportunidade de dissociar-se da figura de Sarney em fevereiro, quando foi novamente alçado à presidência da Câmara Alta e à chefia do Legislativo. Outros colaboradores com currículos mais respeitáveis e em posições potencialmente menos conflituosas foram afastados sem dor, com naturalidade. Sobretudo sem ruído.

Atração fatal

No caso de Sarney, há uma estranha e perturbadora atração, verdadeira atração fatal: o jornal que se jacta de ter o rabo preso com o leitor tem o dito-cujo preso com o destino do parlamentar que no momento encarna a degradação do processo político.

Os estrategistas da Folha imaginaram que seria possível mantê-la distante das estripulias do senador. Quando os seus concorrentes Estado de S.Paulo e, logo em seguida, O Globo começaram a desvendar a incrível novela dos atos secretos, evidenciou-se que a Folha – como, aliás, era previsto – encalacrava-se junto com o seu dileto articulista.

O furo com a denúncia dos 300 atos clandestinos coube aos repórteres Rosa Costa e Leandro Colon, do Estadão, na quarta-feira (10/6). Surpreendidos, Folha e Globo entraram com naturalidade no assunto na edição seguinte (quinta, 11/6). Vocacionada para protagonismos, imaginava-se que a Folha logo trataria de ultrapassar o Estadão.

Quem se juntou ao Estadão foi O Globo, na sexta-feira (12/6), em reportagem de Gerson Camarotti: os atos secretos não eram 300, mas quase o dobro – 500. A Folha ficou visivelmente para trás. Neste dia, na discreta chamada na capa, o jornal explica que uma comissão examina desde 1995 os privilégios produzidos pelos atos secretos.

Sarney fora da pauta

Para disfarçar o desconforto, a Folha opinou no sábado, mas distanciou o escândalo da pessoa de Sarney: “Senado secreto” foi o título do principal editorial da Página 2. O nome do fiel colaborador não aparece uma única vez, embora aparecesse com destaque no noticiário dos dias anteriores.

O Estadão também opinou no sábado, mas ao contrario da delicadeza do concorrente entrou de sola com um editorial sob o título “Corrupção secreta”. O envolvimento de José Sarney é detalhado num extenso parágrafo.

Quem tocou na complicada relação de Sarney-Folha foi o colunista Clóvis Rossi, o mais antigo da Página 2, que na edição de domingo (14/6) desculpa-se pelo atraso em entrar no assunto:

“A demora não se deve, creia-me [dirigindo-se ao leitor], à preguiça, à desatenção ou ao desejo de preservar o colega do espaço ao lado nas sextas feiras, o senador José Sarney, ao contrário do que suspeitam alguns leitores.”

A demora deveu-se, segundo o jornalista, à incredulidade:

“…o que há mais para dizer sobre um caso destas proporções? Xingar a mãe?”

O libelo encerra-se com dinamite pura:

“O pior é que não tem saída, porque a saída depende dos próprios senadores, cúmplices, por ação ou omissão, do aparelho clandestino que era uma Casa de Leis”.

Sarney está ferrado: a Folha jamais admitiria desvencilhar-se de um incômodo parceiro apenas para satisfazer “alguns leitores” exigentes e inconformados. Agora, com o decisivo empurrão assinado e avalizado pelo mais antigo articulista da Dois, está armado e acionado o cronograma para a saída de José Sarney da Folha de S.Paulo. Aleluia!

Clóvis Rossi merece um prêmio pela façanha.

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