Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quinta-feira, junho 25, 2009

Claudinei Santos, coordenador do Núcleo de Estudo em Negócios do Esporte da ESPM
Coordenador do Núcleo de Estudo em Negócios do Esporte da ESPM fala sobre a Copa-2014
Marcelo Iglesias

Em 2014, a menos de cinco anos, o Brasil receberá, pela segunda vez na história, uma Copa do Mundo. O evento tem provocado frisson entre empresários, imprensa, clubes, agências de turismo, hotéis, prefeituras, e na população, de maneira geral.

Apesar de a data parecer distante, muito há que se fazer para melhorar e adequar os estádios, a infraestrutura do entorno das arenas, e a preparação das equipes de apoio para receber turistas das diferentes partes do mundo e garantir o cumprimento do caderno de exigências da Fifa.

“Se não houver um bom planejamento e controle sobre o que se está fazendo, pode acontecer como no Rio de Janeiro, no Pan de 2007. Na última hora até funcionou, mas poderia ser algo mais planejado e de menor custo, com melhores resultados econômicos, sociais e políticos para o país”, afirmou Claudinei Santos, graduado em Engenharia pela FEI, com pós-graduação em Administração de Empresas (EAESP / FGV) e cursos de especialização em Gestão de Negócios, Planejamento Estratégico e Marketing, em entrevista exclusiva à Universidade do Futebol.

Atualmente, o entrevistado atua como coordenador do curso de pós-graduação em Administração e Marketing do Esporte da ESPM e do Núcleo de Estudo em Negócios do Esporte da mesma instituição.

Durante a entrevista, o professor comentou sobre quais são as principais dificuldades que o Brasil enfrentará para a realização da Copa do Mundo de 2014 e como esse evento pode resultar em melhorias para o país, não apenas no que tange à modalidade. Além disso, Claudinei Santos falou sobre a maneira como os clubes brasileiros administram os seus departamentos de marketing, o que há de diferente em relação ao que se tem no exterior, como fazer para evoluirmos e sobre outros temas que, a poucos anos do principal evento entre seleções de futebol, começam a ficar mais em evidência.

Universidade do Futebol - Como surgiu o Núcleo de Estudos em Negócios do Esporte? Como ele funciona?

Claudinei Santos - O núcleo surgiu há quase seis anos, por conta de uma demanda do mercado por uma gestão mais profissional da indústria do esporte, não necessariamente de clubes de futebol. Então, a ideia foi criar um programa de pós-graduação que, na época, não era de pós-graduação, e sim algo somente avançado sobre o tema, para atender a essa demanda de mercado e formar gestores. Fizemos um acordo operacional com o São Paulo, porque o clube tem um campo para o estudo e para a prática dos alunos. Esse curso acabou dando origem ao núcleo.

A ideia é que se forme um centro de estudos para fazer pesquisas, estudos de mercado, desenvolvimento de artigos e publicações na área de gestão de negócios do esporte.

Universidade do Futebol - Qual foi o objetivo do Fórum ESPM Copa 2014*?

Claudinei Santos - A gente é uma referência para os membros do mercado relacionado à indústria do esporte. Se a Copa do Mundo de 2014 não for bem estruturada, ela pode acabar não sendo um grande sucesso. Porém, se bem aproveitada, vai gerar uma quantidade enorme de negócios para as cidades que vão sediar os jogos e mesmo para aquelas que vão beneficiar-se só do turismo, além da geração de serviços e produtos por causa do evento.

O Fórum ESPM Copa 2014 serviu para dar início às discussões sobre como organizar a Copa. Quais os impactos que ela tem sobre a economia? Quais negócios que ela pode gerar e como equacioná-los?

As cidades-sede e outras, que querem apenas receber turistas, podem entrar em contato com a ESPM para darmos as orientações de como fazer o marketing do local. Assim, elas poderão retirar o máximo possível do evento e não ficar somente com os encargos e com os gastos que serão exigidos para a concretização das melhorias na malha viária, no transporte, na construção e adaptação de arenas, por exemplo, que são investimentos meramente estruturais.

*Nota da redação: nos dias 28 e 29 de abril de 2009, foi realizado o Fórum ESPM Copa 2014 – os impactos econômico-sociais e as oportunidades de negócios. No evento, foram debatidos temas como os encargos da Fifa para a Copa do Mundo no Brasil, a visão do governo em relação ao torneio no país, os impactos econômicos e sociais da Copa e a visão das empresas em relação às oportunidades de negócios que o evento trará. Além disso, foram apresentados painéis sobre a experiência das Copas anteriores, sobre marketing e comunicação na Copa de 2014, sobre o marketing das cidades que esperam beneficiar-se com o evento, e sobre como estruturar e administrar as arenas que serão construídas.

Universidade do Futebol - Qual é o potencial de crescimento em infraestrutura do Brasil até 2014, ano da Copa do Mundo?

Claudinei Santos - Tem que se aprimorar muito a infraestrutura de transporte, de malha viária e de serviços. Basicamente, são essas áreas as que crescem muito com um evento como uma Copa do Mundo.

No entanto, quanto isso vai melhorar, ninguém pode dar uma informação correta. Fala-se que haverá um investimento na faixa dos R$ 14 bilhões. Mas onde está o projeto? Em que cidades eles serão implementados?

O que acontece é que hoje não dá para dimensionar. Dependendo da cidade, ela já começou a se preparar ou não para a Copa. Se formos fazer um trem rápido para São Paulo, que atenda o aeroporto, são precisos cerca de R$ 17 bilhões, de acordo com a Secretaria de Transportes, o que inviabilizaria esse projeto. Então, talvez isso não saia do papel.

Outro aspecto importante é que, o Brasil, como é um país de dimensões continentais, não dá para ir de trem de uma cidade para outra. É preciso que se vá de avião, e os aeroportos não estão preparados para o fluxo. Portanto, há uma enorme necessidade de investimentos em aeroportos. Até agora, ninguém sabe como isso será feito. Tudo está muito na base das especulações.



Universidade do Futebol - Quais são os impactos sociais de um evento dessa grandeza em um país com tantas diferenças nesse sentido?

Claudinei Santos - Seguramente vai haver uma grande geração de empregos em negócios ligados diretamente, e mesmo indiretamente, à Copa do Mundo. Isso é um impacto positivo, desde que se saiba o que fazer com essa mão-de-obra após o evento. Se você treinar pessoas para funções receptivas, para logística e para as demais atividades relacionadas à Copa, essas pessoas podem continuar trabalhando nas mesmas tarefas depois. Caso se tenha um planejamento e uma organização, o impacto será positivo. Pequenas empresas também vão se estruturar, e grandes empresas irão ampliar os seus negócios durante a Copa do Mundo. Mas o que vai acontecer no “day after”? Elas vão continuar podendo vender serviços ou produtos no mesmo volume?

Vamos aprender sobre como melhorar nossa consciência de turismo, principalmente em pequenas cidades, a receber melhor os turistas de fora do Brasil. Por que um turista vai para Salvador? Não precisa ser por causa da Copa. Se nós melhorarmos como receber turistas, apesar de Salvador ser bastante competente, ela irá receber mais fluxo de turistas internos e externos.

Portanto, afirmo que o impacto, em princípio, é bastante positivo, uma vez que se criam empregos, alavanca-se a economia, desenvolve-se pessoal qualificado, gera-se um impacto permanente no PIB. Mas isso não pode ser apenas pontual, nos anos que antecedem e no ano da Copa.

Minha grande preocupação é o “day after”. Ou nós planejamos hoje o que vai acontecer no dia seguinte, quando acabar a Copa, ou nós vamos fazer uma grande bobagem, investir um monte de dinheiro para nada.

Ninguém fez ainda, embora seja economicamente viável, uma avaliação para saber se a Copa irá realmente dar lucros. No ano da Copa sim, claro. Mas se analisarmos um período mais longo, o que ela vai deixar de resultados? Se ela não for trabalhada de forma muito adequada, ela pode criar um grande buraco no dia seguinte.

Universidade do Futebol - Faça uma avaliação das Copas do Mundo recentes. Como podemos compará-las com aquilo que pode vir a acontecer no Brasil?

Claudinei Santos - As diferenças são brutais entre uma Copa da Alemanha e uma Copa da Coréia e do Japão. Na dos países asiáticos, construiu-se uma quantidade enorme de estádios, e ninguém sabe o que está acontecendo com eles agora. Essas construções foram feitas, em alguns casos, em cidades que não possuem 15 ou 20 mil habitantes, mas que atualmente, têm arenas. Além disso, criou-se um investimento grande em infraestrutura para levar as pessoas até essas arenas, mas o Japão é um país pequeno. Já na Copa da Alemanha, foi feito um reinvestimento em arenas já existentes e que continuam sendo lucrativas.

Portanto, o que se ganha da experiência com as Copas anteriores? Basicamente isso: tem que haver um planejamento muito adequado. Há, inclusive, dados de que a Copa da Alemanha também não foi tão vantajosa. Gerou bons negócios para a Fifa e para algumas empresas de turismo, mas para a grande maioria do país, não trouxe uma vantagem muito grande. Então, é uma falácia!

Já a Copa da Coréia e do Japão aconteceu muito mais para recolocar essas economias no cenário mundial. Mas o evento não trouxe uma grande contribuição para a economia do Japão, que não estava indo tão bem, ainda que um evento de caráter mundial mexa um pouco com a economia do país.

Eu diria que cada Copa é muito diferente das outras. Por exemplo, a Copa da África do Sul será um evento muito mais pobre. O volume de investimento é da ordem de cinco para 30, em comparação com a Copa dos EUA. A diferença é brutal entre os investimentos que foram feitos, principalmente em infraestrutura, em arenas, em transporte, etc.

A Alemanha, que possui um bom metrô, ótimas auto-estradas, é muito menos grave trazer e sediar uma Copa. Já na África do Sul, não há nada disso. Tanto que dizem que, se der certo no país africano, tem que dar certo uma Copa no Brasil, também.

No entanto, o Brasil possui uma dimensão continental. Então, a diferença de uma Copa no Brasil é a seguinte: quando se fala em um evento desse tipo na Alemanha, é uma Copa em um país pequeno, em que as pessoas andam duas horas de trem ou de carro e conseguem chegar de uma sede a outra. No Brasil, não; existem milhares de quilômetros entre as cidades que irão sediar o torneio.

A grande diferença é essa: nós somos um país continental, que não possui uma infraestrutura muito boa de meios de transporte e não tem arenas bem localizadas ou com uma estrutura local adequada.

Portanto, o aprendizado que tivemos com a Copa da Alemanha, por exemplo, é bom, mas aqui temos que conseguir outras soluções. Não adianta melhorarmos apenas as estradas e o metrô. Isso não vai dar conta, porque não tem como ir de metrô de São Paulo a Salvador.



Universidade do Futebol - O mercado de marketing do esporte no Brasil ainda é bastante deficiente. Quais são os seus principais problemas e como podemos melhorá-lo? Em comparação ao que acontece no exterior, qual é a sua posição?

Claudinei Santos - As nossas principais deficiências são, em primeiro lugar, a capacitação de pessoal para gerenciar de forma profissional os negócios do esporte; em segundo, a tecnologia aplicada, que usamos pouco ainda; por fim, o nosso modelo de gestão é ruim.

É muito diferente o que se faz aqui e o que se vê fora do Brasil. Um ou outro exemplo, como o São Paulo, o Palmeiras ou o Corinthians, têm um modelo de gestão um pouco melhor.

No entanto, no geral, aquilo que se observa por aqui é muito pobre, muito ruim, muito pouco profissional. Exceções para alguns eventos como a Fórmula 1, mas, nesse caso, é tudo trazido de fora, o modelo é totalmente importado.

O que é marketing esportivo? O que é feito é patrocínio ou licenciamento. Então, você patrocina um clube ou um atleta, licencia a sua marca para fazer brinquedos, roupas de criança, óculos, etc. No Brasil, o marketing esportivo ainda engatinha, porque nós não sabemos o que fazer com isso.

Se compararmos com o que é feito na Europa, os clubes de lá são gerenciados profissionalmente. Por exemplo: o Real Madrid possui vários atletas de todas as partes do planeta. Esses jogadores são talentosos, mas será que eles estão lá somente porque são talentosos? Tem que ter um japonês que joga razoavelmente bem, porque o Japão quer ver isso, e o dinheiro de televisão dá um retorno muito bom para o clube. Portanto, se tiver atletas que podem ser vistos pelo mundo todo, com certeza, eu vou ter mais audiência.

No Brasil, falta essa mentalidade de negócio, copiar um pouco o modelo que existe lá fora. Por que nós não temos um espetáculo que seja vendável mundialmente, como a Espanha e a Itália? Porque nós não temos talentos, os nossos bons jogadores estão lá fora. E por que eu não posso reter o talento? Porque eu faço da venda do atleta a minha melhor fonte de receita.

Eu diria que, além dos três itens citados, há de se ter uma cultura de negócios com a indústria do esporte, o que, no Brasil, não existe.

Na ESPM, preparamos esse nível gerencial da direção executiva do negócio. O que nós não conseguimos mexer é com os cartolas, porque eles são indicados, ou porque são politicamente importantes, são amigos de um ou de outro, porque estão há muito tempo no clube, etc.

Universidade do Futebol - Você acredita que os clubes de futebol brasileiros têm noção do quanto valem em termos de imagem? Como mensurar - se é possível - o valor da marca de uma instituição esportiva?

Claudinei Santos - Não dá para dizer, atualmente, quanto vale uma marca. Existem algumas especulações, mas dizer precisamente é impossível.

A verba de patrocínio pode ser uma pista para essa mensuração. Os clubes brasileiros valem muito menos do que qualquer clube europeu. Mas aí, também há de se considerar a relação entre o euro e o real que influencia bastante nesse caso.

Os clubes brasileiros já são internacionalizados, de certa maneira. O esporte não é mais local. Quando se tem um jogo por aqui, as imagens vazam para o mundo, quando se participa de um torneio como a Libertadores, os demais países da América do Sul estão assistindo.

Não tem como não ser dessa maneira, porque o esporte é globalizado. Se analisarmos os principais clubes fora e dentro do Brasil, todos têm atletas de diferentes nacionalidades. O que acontece é que aqui nós contratamos atletas de países de menor expressão na modalidade. Lá fora, eles possuem critérios e possibilidades maiores para comprar atletas.

Portanto, os clubes brasileiros já começaram esse processo de internacionalização. Porém, ainda de maneira bastante tímida. Não tem como não pensar globalmente quando se fala de esporte.

Universidade do Futebol - De que forma o produto futebol poderia se tornar mais rentável, em termos de negociação da marca e licenciamento de artigos referentes à agremiação?

Claudinei Santos - Patrocínios hoje que giram em torno de R$ 16 milhões e R$ 18 milhões. O Corinthians conseguiu R$ 18 milhões, o São Paulo, R$ 16,5 milhões. Esse valor pode crescer muito, desde que o clube valha mais.

O que uma televisão está disposta a pagar para transmitir um jogo de futebol? Vai valer tanto mais quanto mais audiência ela obtém. Se eu consigo uma transmissão internacional, eu posso vender bem mais caro a partida, em termos de TV. Mas eu preciso que aquele espetáculo seja bom.

Por que vendemos mal? Porque o nosso espetáculo é ruim, o jogo é feio e tem briga entre as torcidas. Além disso, os técnicos, para preservarem a equipe, não colocam os melhores atletas em campo, o que resulta em um jogo de baixa qualidade.

Então, visa-se somente a vitória e esquece-se que aquilo é um espetáculo. O futebol, ou qualquer outro esporte, é um entretenimento.

Mas não há cuidado com quem vai para as arenas na questão do conforto, da segurança, da alimentação. Se você for a um estádio, mesmo sendo o do São Paulo, esses fatores são péssimos: o banheiro é sujo, o que se consegue de alimentação é uma “quentinha” do Habib’s. Então, que prazer que se tem? Tem que ser uma experiência gratificante você ir a um estádio.

Fora do Brasil é maravilhoso. Eu cito sempre uma experiência, na primeira vez em que eu fui ao Santiago Bernabeu, em Madri, e como todo bom brasileiro, cheguei à arena com uma hora e meia de antecedência. Fui com mais dois amigos e, no momento em que chegamos, não havia ninguém. Cheguei a pensar que não fosse mais ocorrer o jogo. Então, falei com os orientadores, e já havia sentado no lugar errado, porque lá os lugares são numerados. Perguntei se havia ocorrido algum problema, pois não tinha ninguém no estádio. Ele me respondeu: “Por que o senhor acha que o pessoal vai chegar mais cedo?”. Em 20 minutos, o estádio estava lotado. Atenção: portões, catracas, escadas rolantes, tudo aberto. Ninguém se machucou.

Na saída, pensei que seria um inferno para escoar todo o pessoal de lá. Em 20 minutos, cheguei das arquibancadas até a porta do metrô sem precisar fazer esforço algum.

Quando eu consigo oferecer um espetáculo como esse, ele vale dinheiro. Eu posso cobrar US$ 100,00 que as pessoas pagam. Agora, se cobrarem R$ 20,00 por um jogo entre São Paulo X Corinthians, no qual eu corro o risco de apanhar, fico temeroso de levar a minha mulher, isso não vale.

Portanto, atualmente, a diferença básica entre o que acontece lá fora e aqui é como tratar um espetáculo. A gente não faz espetáculo.

Universidade do Futebol - Durante o Fórum sobre a Copa de 2014, realizado pela ESPM, foi senso comum entre os debatedores, especialistas das mais diversas áreas: para vingar em termos de sustentabilidade e poder de concorrência, os clubes têm de ter seu estádio próprio. O que você pensa sobre isso e como viabilizar a concretização de um plano desses? Parcerias público-privadas são a melhor solução?

Claudinei Santos - No modelo brasileiro, da maneira como nós atuamos, acaba sendo inevitável precisar de um estádio próprio. O problema é esse: como esse estádio se rentabiliza, já que ele fica ocioso uma grande parte do tempo?

Quantos jogos há por ano em um estádio como o Morumbi. Se for um por semana, o que não acontece, são 52 partidas. E quantas pessoas são colocadas lá dentro? São poucos os jogos em que há 70 mil pessoas. Quanto que se consegue gerar de receita?

Portanto, as arenas não são rentáveis. São investimentos imobiliários de grande porte, que têm que ser rentabilizados. Eu duvido que um clube consiga construir uma arena nos padrões Fifa e, a partir daí, ele consiga começar a ganhar dinheiro. A não ser que ele realize um projeto muito grande, integrado com algum investidor ou com a prefeitura.

O que acontece com uma grande arena? Ela é um pólo que atrai pessoas. Se for bem construída, é fácil de se ter acesso. Então, uma grande quantidade de pessoas vai até lá se houver uma malha viária adequada e um bom transporte coletivo.

Se for dessa maneira, é interessante possuir um estabelecimento comercial ao lado desse estádio, pois as pessoas conseguem chegar até lá. Então, no domingo (dia de jogo), os torcedores passam na loja.

Sendo assim, o entorno do estádio é muito importante. É preciso pensar o que há de oferta de serviços, de alimentação ou de outros entretenimentos para durante os espetáculos e que também pode existir alheio a eles.

Há empresas que querem investir em arenas poliesportivas, ou multiuso, principalmente, nessas últimas, pois elas podem abarcar eventos, shows, casamentos, lojas, etc.



Universidade do Futebol - Qual a metodologia de ensino da ESPM para a formação de novos administradores e marketeiros voltados à esfera esportiva?

Claudinei Santos - Nós não somos marketeiros. Somos profissionais de gestão do esporte, o que inclui marketing. Existem, também, grandes diferenças entre marketing esportivo e marketing do esporte.

O primeiro é você fazer ações de comunicação por meio do esporte, como uma empresa que está na camisa do São Paulo, a LG. Por outro lado, existe o marketing do esporte, que é como você faz para que a modalidade seja vendável, para que ela valha alguma coisa. As pessoas geralmente misturam esses dois conceitos, o que é indevido.

Como nós formamos os nossos alunos? Damos uma base conceitual importante, conceitos de operações de marketing, de finanças, de gestão de eventos, etc. Propiciamos para eles uma metodologia adequada de como gerenciar essas áreas.

Nós melhoramos a capacitação em termos de postura do aluno como administrador. Geralmente, em qualquer sistema de ensino, é preciso desenvolver conhecimentos, criar habilidades de lidar com o gerenciamento, com a negociação e com a administração, e criar uma atitude adequada.

Somos muito calcados em gerar uma nova atitude. Conhecimento você transmite, atitude você desenvolve. Pretendemos dar ao aluno uma nova visão do negócio, desde o planejamento até a sua operação, até o seu controle e avaliação de resultados.

Nossa metodologia passa por essas tarefas: criar conhecimentos, gerar habilidades e criar uma nova atitude.

Universidade do Futebol - A profissionalização do futebol brasileiro, em todas as instâncias, é viável em curto prazo, ou carece de um tempo de maturação e adaptabilidade?


Claudinei Santos - No curto prazo não vai acontecer nada. Temos que fazer algumas correções muito rápidas para tornar o negócio um pouco melhor e mais profissional. Mas é uma coisa mais de médio e longo prazo.

O papel das escolas que formam novos profissionais é esse: criar uma nova geração, que vai, aos poucos, assumindo cargos importantes, até que essa nova leva de especialistas em gestão do esporte comece a assumir posições de decisão estratégica.

A partir daí, começa-se a mudar como um todo a gestão do esporte, não só no futebol, mas em qualquer modalidade que se imagine, também.

Universidade do Futebol - O futuro para os clubes brasileiros está em parcerias ou aportes financeiros de um magnata, como acontece na Inglaterra?


Claudinei Santos - Embora se critique muito, eu gosto da ideia do clube-empresa. Muita gente critica, mas, na verdade, as agremiações têm que ser tratadas dessa maneira. Nesse negócio você pode ter investidores dos mais variados ramos, e não há nada de mal nisso.

Quando uma empresa está patrocinando um clube, ela está investindo nele, ela é um parceiro comercial da agremiação. Só que isso é feito de maneira pobre, pois apenas coloca-se o logo na camisa e nas placas e pronto. Cadê o marketing integrado?

Os clubes devem seguir sendo entidades que não tenham um dono? Sim e não. Qual é a importância disso ou se, de repente, ele for vendido para um grande industrial ou para uma empresa?

Eu não vejo nenhum problema sério nisso. O clube é um negócio e, como tal, pode assumir um parceiro que vá dividir custos, despesas e receitas. Depende muito de cada caso. Por exemplo: precisa-se de dinheiro, eu vou buscar no banco. Vou ter patrocinadores e parceiros, vou vender ações. Por que não?

Agora, no modelo atual, com a legislação que se tem no Brasil, para os clubes fica bastante complicado de se fazer isso.



Universidade do Futebol - Fala-se muito em investimentos de infraestrutura e transporte para a Copa do Mundo de 2014. No entanto, outro problema que é preocupante é em relação à mudança de cultura da própria população brasileira para receber pessoas vindas dos diferentes países do mundo. Existe algum tipo de trabalho que possa ser feito para que a Copa também seja um sucesso nesse sentido?

Claudinei Santos - Sem dúvida. Precisa-se ter pessoal qualificado para atender bem quem não fala português. E também há de se considerar que a pessoa que fala francês talvez não fale muito bem inglês.

Por isso, é preciso ter grupos que possam dar orientação e promover um entretenimento contínuo para as pessoas que vêm de fora, enquanto eles estiverem aqui, por conta da Copa, assistindo ou não a algum jogo.

Além disso, é necessário que a população das cidades-sede seja preparada para receber bem os turistas, para não considerá-los um estorvo, que atrapalha o trânsito, que ocupa os restaurantes, que bloqueia todas as vagas de hotel, etc.

Sendo assim, precisa ser feito um trabalho muito grande em cima disso, de conscientização da população, mesmo que as pessoas não atuem diretamente na Copa, mas para que elas saibam como acolher os visitantes.

Algumas cidades já têm essa mentalidade. Em Salvador, por exemplo, as pessoas são bem receptivas. Em São Paulo, isso também é verdadeiro. Mas, outras cidades-sedes, como Belo Horizonte, onde não há um fluxo grande de turistas, as pessoas não estão preparadas para ajudar.

Portanto, ou você prepara a população, principalmente aquelas pessoas que terão contato mais direto com os visitantes e com as seleções ou você tem chance de dar grandes gafes.

Quando o Brasil foi disputar a Copa da Alemanha, a população da cidade que recebeu a nossa seleção se mobilizou para aprender a falar português e receber os jogadores da melhor maneira possível. Por isso, as cidades que vão receber turistas ou equipes precisam estar preparadas em termos da população ter consciência de como receber bem os visitantes. Até mesmo para poder informar onde se localiza tal restaurante ou, no trânsito, não serem tão agressivos, e até mesmo, evitar brigas de torcidas com os turistas que virão para torcer pelo seu país.

Universidade do Futebol - Apesar de seus problemas e falhas, o São Paulo é tido como um exemplo de administração no departamento de futebol. Essa é a razão de a ESPM manter um vínculo com a instituição do Morumbi?

Claudinei Santos - Nós precisávamos de um time que já estivesse bem estruturado, que tivesse um padrão de excelência, dentro do possível, no que se refere à gestão de negócios. Outro fator que contribuiu foi que tínhamos contato com os dirigentes clube.

Além disso, o próprio clube queria fazer parte desse projeto. Ele tinha a intenção de se profissionalizar. Por isso, aproximou-se da ESPM, pois nós já éramos uma referência no campo de gestão da indústria relacionada ao esporte.

No entanto, não houve nenhuma escolha, não fizemos uma pesquisa para saber qual era o clube melhor organizado. Apesar que, na época, era notável a diferença entre o São Paulo e as demais equipes.

Além disso, dentro do clube do Morumbi já havia profissionais de grande impacto, como o [Júlio] Casares*, o João Paulo [de Jesus Lopes]**. Isso também fazia uma grande diferença, além da presença do Claudio Aidar, que foi a nossa ligação com o clube.

Porém, não estamos ligados exclusivamente a eles. Há uma relação com o São Paulo porque lá temos um campo de trabalho, eles nos abrem as portas para levarmos os alunos para verem o que realmente acontece, e os profissionais de lá também nos ajudam a mostrar um pouco da parte prática.

Notas da redação:

*Julio César Casares é diretor de marketing do São Paulo desde 2004. Antes, atuava indiretamente com o marketing são-paulino, como presidente do Grupo de Executivos São-Paulinos (Gesp) formado por torcedores que elaboram planos de marketing para o clube.

Fora do futebol, Casares tem atuação em duas emissoras de televisão. Até 2004, foi superintendente de rede do SBT. Atualmente é diretor de planejamento estratégico da TV Record.

A
lém de trabalhar no São Paulo e na Record, Casares é o presidente da Associação Brasileira de Marketing e Negócios (ABMN) desde 2005.

**João Paulo de Jesus Lopes é secretário Adjunto dos Transportes Metropolitanos e assessor especial da presidência do São Paulo. Ingressou no clube do Morumbi em 1979, trazido pelo ex-governador Laudo Natel.

Foi diretor adjunto de Futebol Profissional de 1980 a 1990 e conselheiro eleito entre 1986 e 1990. Retornou ao clube em 2002. Desde então foi diretor Financeiro, diretor de Planejamento e de Futebol Profissional.

Teve que deixar o cargo em virtude de ter assumido a função que ocupa atualmente no governo do Estado. Mas permaneceu como assessor especial da presidência para assuntos do futebol profissional.

Universidade do Futebol - No futebol brasileiro, são notáveis os problemas que existem em relação à infraestrutura das arenas, à violência e outros mais. Além disso, é comum que se façam obras, melhorias e se tomem medidas de segurança pouco tempo antes de um evento, por exemplo. Na sua opinião, o Brasil vai conseguir trabalhar com rapidez e eficiência para sediar um evento como a Copa do Mundo daqui a cinco anos?

Claudinei Santos - Acho que sim. Espero que sim. Rezo para que isso aconteça.

Na abertura do nosso fórum eu comentei que deveríamos pensar corretamente na Copa do Mundo e parar de fazer especulações e de dizer mentiras. Nós teremos US$ 14 bilhões de investimento ou R$ 14 bilhões? Se comparados, um é o dobro do outro.

Acredito que ainda não é tarde demais, mas temos que começar já. Faltam quatro anos e meio. Isso não é nada. Se me perguntarem se ainda há tempo, a minha resposta será positiva, mas é algo perigoso, receoso. Eu não tenho tanta certeza assim.

Estou percebendo um baixo nível de planejamento para essa Copa. Existem muitas discussões, algumas cidades já bem preparadas, como São Paulo, que possui um projeto. No entanto, o nosso fórum e a nossa ação, “ESPM 2014”, é para instigar as pessoas a começarem a planejar, para apontar os pontos que ainda não foram debatidos. Por exemplo: quanto tempo eu levo para formar pessoas para receber os estrangeiros?

Se não houver um bom planejamento e controle sobre o que se está fazendo, pode acontecer como no Rio de Janeiro, no Pan de 2007. Na última hora até funcionou, mas poderia ser algo mais planejado e de menor custo, com melhores resultados econômicos, sociais e políticos para o país.



Universidade do Futebol – Na sua opinião, quais foram os critérios que mais pesaram para a escolha das sedes da Copa do Mundo de 2014?

Claudinei Santos - A escolha aconteceu, na minha opinião, em função de cidades que ofereceram melhor infraestrutura para o evento, que tinham mais possibilidade de turismo, principalmente, como integração.

Se repararmos, no Nordeste, a cidade de Natal não tem futebol que justifique a decisão. Mas ela está integrada em um conjunto de cidades turísticas do Brasil.

Então, fica mais fácil para quem está em Salvador chegar a Natal do que vir para São Paulo. Por isso, algumas escolhas fazem sentido em um projeto integrado de turismo local. Aí, tem-se Salvador, depois Recife, Natal, Fortaleza, e, um pouco mais longe, Manaus. Cria-se uma região com distâncias não muito longas em que se consegue atender a essas questões do turismo.

Mesmo porque, não se pode sediar uma Copa em uma cidade que não possua atrativos turísticos. Florianópolis não foi escolhida por que não tem infraestrutura ou por que está muito perto de Curitiba e de Porto Alegre?

É claro que também foram utilizados critérios políticos. É impossível pensar-se em uma Copa do Mundo no Brasil em que não tenha uma variável política. Mas como nós não tivemos nenhuma explicação sobre os critérios, nos resta saber se as cidades escolhidas vão estar capacitadas para receber a Copa. Lembrando que tudo tem que estar pronto para a Copa das Confederações, que acontece um ano antes da Copa do Mundo. Portanto, se a Copa será em 2014, a Copa das Confederações será em 2013. Logo, as coisas deveriam estar prontas até o final de 2012. Então não temos tanto tempo como imaginamos.

Será que as cidades-sede estarão preparadas a tempo de acordo com as condições exigidas pela Fifa? Senão, elas serão excluídas da Copa de 2014. É perfeitamente possível realizar o evento em 10 cidades ao invés de em 12, por exemplo, supondo que algumas delas não cumpram com as determinações da entidade máxima do futebol.

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