Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

sábado, junho 13, 2009

ENTREVISTA

Toninho Cecílio, gerente de futebol do Palmeiras

Ex-jogador, que também atuou como treinador e sindicalista, aborda atuação dentro do clube

Bruno Camarão


A trajetória de Antônio Jorge Cecílio Sobrinho não pode ser totalmente desvinculada da Sociedade Esportiva Palmeiras. Muito pelo contrário. De um eficiente zagueiro que iniciou a carreira nos juvenis do clube no fim dos anos 1980, passando por um período-chave da história administrativa alviverde como capitão do time profissional, até a gerência do departamento de futebol, Toninho Cecílio transpira e se identifica com a tradicional agremiação paulista.

Ainda como atleta, quando atingiu seu melhor momento uma década depois, sendo até convocado por Paulo Roberto Falcão à seleção brasileira, Toninho planejou sua carreira em outra frente. Cursou publicidade e propaganda na Universidade Paulista (Unip) e obteve benefícios práticos desde então. Líder no grupo alviverde, viu in loco o ingresso da Parmalat no Palestra Itália e se firmou como presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais – destacou-se, ao lado de Raí, seu vice, no apoio ao projeto que acabou com a Lei do Passe e criou a Lei Pelé.

Em 2001, formou-se em um curso internacional para treinadores, promovido pelo sindicato da categoria, para no ano seguinte assumir a Paraguaçuense-SP. Teve também a experiência de ser o comandante-técnico do Guaratinguetá, antes de regressar ao Palmeiras. Destino de dirigente plantado desde a Portuguesa Santista, em 2004, quando foi gerente do clube praiano, e no ano seguinte, quando tornou-se coordenador do Fortaleza, recém-egresso à elite do futebol nacional.

“Isso tudo me deu uma capacidade de adaptação muito grande, são clubes de
vários níveis, de exigências diferentes. [No Palmeiras] o trabalho e o assédio são gigantescos, e também temos de saber o pensamento da diretoria atual, para que possamos realizar as coisas com naturalidade e numa linha comum”, revelou Toninho, nesta entrevista à Universidade do Futebol, concedida no centro de treinamento palmeirense, localizado na Barra Funda, distrito da região oeste de São Paulo.

Dentre outras abordagens, o dirigente comentou sobre um exemplo que virou referência
em termos de logística, enfrentado na edição deste ano da Libertadores da América, o desenvolvimento das categorias de base alviverdes, o relacionamento integrado entre comissão técnica e demais profissionais da agremiação, além da criação de um banco de dados com que tenta superar os rivais na observação e contratação de novos jogadores.

Universidade do Futebol – Quais as suas principais funções hoje no
Palmeiras? Como suas experiências enquanto jogador e capitão de muitas equipes, líder sindical e treinador, além de sua formação universitária estão o ajudando no exercício de seu trabalho?

Toninho Cecílio – Eu tenho desempenhado uma função no Palmeiras que envolve uma série de obrigações, basicamente voltada para o relacionamento entre comissão técnica e dia-a-dia do futebol, junto à diretoria. Tenho um olhar para a área técnica, desde a formação de elenco, até a gestão diária do departamento.

Também contribuo com as diretrizes adotadas nas categorias de base, participando das decisões
estratégicas, dos modelos a serem adotados, o relacionamento com a imprensa, o cuidado com a forma de se comunicar, minha e dos atletas, em meio a momentos de crise, especialmente.

Há ainda uma atuação forte no planejamento de viagens que exigem um grau de atenção maior, em especial a Libertadores. Participo da programação da logística, e, como ex-atleta, sei o que o jogador gosta, o que ele espera em uma véspera de decisão, quais hotéis atendem melhor uma delegação de futebol, a forma de transporte mais eficiente etc.

Acredito que a presença de um
ex-atleta no corpo diretivo de um clube é uma exigência extremamente importante. Não vejo uma diretoria de futebol ter sucesso em médio e longo prazo sem a presença desse profissional. Alguém que atuou dentro das quatro linhas, logicamente preparado para essa função, precisa também saber se adaptar ao perfil do treinador, com qual personalidade irá lidar, e ter um cuidado nessa interação.

É importante ter um ambiente de lealdade, de respeito, de comando, mas um comando colocado de maneira profissional, amigável, o que é uma das principais dificuldades.

Nesse cargo, mesmo tendo consciência do trabalho que está sendo realizado,
ficamos entre as exigências da torcida, da imprensa, sem poder sucumbir às pressões. É uma função muito importante na estratégia de uma equipe.

Antes de ir para o Palmeiras, fui gerente de futebol da Portuguesa Santista, onde havia um orçamento menor,
diante de uma torcida menor, cuja cobertura também era reduzida, e do Fortaleza, assim que subiu à Série A do Brasileiro, em 2005, quando tivemos cotas de TV reduzida; também tive uma passagem como treinador do Guaratinguetá, e isso tudo me deu uma capacidade de adaptação muito grande.

Para realizar tudo com naturalidade e em uma linha comum no Palmeiras, onde o trabalho e o assédio são gigantescos, temos de saber o pensamento da diretoria atual. E acredito que estamos conseguindo fazer isso com sucesso.

Universidade do Futebol – Em se falando de
planejamento estratégico, o Palmeiras realizou uma viagem longa na fase pré-Libertadores, para encarar o Potosí, que foi considerada por você um case de sucesso. De que maneira se deu a preparação e por que o clube saiu vitorioso desse episódio em questão?


Toninho Cecílio – Ficou determinado na última rodada do Brasileiro do ano passado que teríamos de disputar a pré-Libertadores, em um duelo que ocorreria no fim de janeiro, início de fevereiro, e este jogo valeria o semestre. Porque classificado nessas condições, você não teria a oportunidade de disputar a Copa do Brasil, e seria de fato uma tragédia se caíssemos logo ali.

As quatro equipes mais bem colocadas no Nacional, mais a vencedora da Copa do Brasil, garantem a participação na edição seguinte da Libertadores. Como teve de disputar a fase prévia do torneio continental, antes de entrar na fase de grupos, o Palmeiras corria o risco de, caso perdesse o duelo para o Potosí, não ter outra competição para disputar no primeiro semestre, além do Campeonato Paulista

No dia 8 de dezembro [de 2008, data
seguinte à derrota por 1 a 0 para o Botafogo, dentro do estádio Parque Antarctica, que fez com que o Palmeiras terminasse o Nacional na quinta colocação e não entrasse diretamente na fase de grupos do torneio sul-americano] já começamos a nos planejar, inclusive antecipando a montagem de elenco.

Quando surgiu o nome do Potosí*, começamos a discutir com a comissão técnica qual seria o
melhor caminho, fora de campo, para minimizar todos os problemas. Junto ao Vanderlei [Luxemburgo, treinador do Palmeiras] e a todos os profissionais da parte de fisiologia e preparação física, realizamos uma suplementação na alimentação dos atletas, alguns controles nesses quesitos que foram realizados em um trabalho menor, e a própria pré-temporada passou a visar de início as duas partidas em questão – a primeira aqui, no Palestra, e a segunda fora, na altitude da Bolívia.

Dividimos o grupo em dois. Um, com os atletas que não vinham sendo titulares, viajou comigo, com o Antonio Mello, e mais alguns outros integrantes para Sucre, que fica mil metros abaixo de Potosí, e seria a única cidade que ofereceria o mínimo de estrutura para receber uma equipe. E o outro ficou com o Luxemburgo para cumprir um compromisso pelo Campeonato Paulista.

Aqueles que foram conosco, já iniciaram um período de adaptação, em termos técnicos, de velocidade e tempo de bola, o que causa muita dificuldade para zagueiros e goleiros, e fechamos praticamente um hotel apenas para o Palmeiras, para preservar a tranqüilidade, naqueles quatro, cinco dias.

A alimentação, fornecida por
aquele hotel, foi monitorada pela nossa nutricionista, Patrícia Teixeira, que viajou conosco. Nosso staff também entendeu que não seria necessária a utilização de câmaras hiperbáricas** ou de qualquer outro meio artificial como forma de complemento à preparação.

Em relação ao trajeto, decidimos alugar em Sucre, mesmo, várias vans de luxo, alguns utilitários
maiores e mais confortáveis, os quais foram preparados para que realizássemos um comboio, diminuindo a viagem para Potosí em praticamente uma hora, pela agilidade desses carros. Um deles, por sinal, atrás de todos, foi ocupado apenas por mecânicos, caso houvesse algum problema que necessitasse ser reparado – mas deu tudo certo.

Chegamos a Potosí e fomos direto ao estádio, e durante o jogo não tivemos qualquer
problema grave com a altitude, a não ser dois jogadores que em outro momento tiveram um desconforto. Sequer no intervalo utilizamos balões de oxigênio, considerando todas as adversidades. Foi um sucesso: vencemos por 2 a 0, já tínhamos levado a vantagem daqui de São Paulo [O Palmeiras venceu em casa pelo elástico placar de 5 a 1 e poderia até ser derrotado por uma margem de três gols de diferença que ainda avançaria na competição. Mas novamente derrotou o rival boliviano], e o planejamento em todas as áreas foi considerado, no fim, muito positivo.

*Nota da redação: fundado em 20 de outubro de 1941 com o nome de Club Bamin, o Real Potosí teve em 1994 suas ações compradas por um empresário, apaixonado torcedor do Real Madrid. Em 1997, conquistou o torneio Regional Potosino, o que deu direito a disputar a segunda divisão boliviana no mesmo ano. A campanha na Copa Simon Bolívar, como é chamada a divisão de acesso, foi surpreendente.
Campeão invicto, ganhou o direito de integrar a elite do Nacional em 1998. Em seu quarto ano na divisão principal, o Potosí terminou o campeonato em terceiro lugar, o que resultou em uma vaga para a Libertadores de 2002.
Somente após nove anos na divisão principal da Bolívia, o Real Potosí conquistou seu primeiro título, o Apertura de 2007. Em 2009, disputou pela quarta vez a Copa Libertadores da América, sendo desclassificado justamente pelo Palmeiras.

Potosí é considerado o local mais alto do mundo onde se praticam atividades esportivas - são 3.967 metros acima do nível do mar.

**Nota da redação: são equipamentos de paredes sólidas, com janelas que permitem a visualização do que está acontecendo dentro e fora do mesmo, no qual o paciente entra para se tratar respirando oxigênio puro (a 100%), sob uma pressão correspondente a aproximadamente 10 a 20 metros de profundidade no mar.

Elas compõem a medicina hiperbárica, ramo da medicina
responsável pelo estudo e implementação das normas técnicas e de segurança em ambientes pressurizados, aplicados para o tratamento das patologias causadas pelas variações de pressão sobre o organismo humano.

É também responsável pelo estudo e estabelecimento de protocolos de tratamento para todas aquelas patologias para as quais o oxigênio sob pressão tem a função de potente ferramenta auxiliar de tratamento.


Organização dos carros utilitários que levaram os atletas palmeirenses do hotel para o estádio Mario Mercado Vaca Guzmán

Universidade do Futebol – Você acha que os clubes, de uma forma geral, têm que ajudar na formação escolar e educativa dos jogadores de futebol? As exigências profissionais de um jogador de futebol não são conflitantes com o tempo necessário para que eles estudem de verdade?

Toninho Cecílio –
Eu vivi isso. Existe conflito, sim. Comecei minha carreira de jogador de futebol nos juvenis do Palmeiras, entrei na faculdade, amparado pelo clube, que me deu muito apoio, e na época tinha de fazer muito sacrifício, por conta da distância em relação ao local de estudo e a dificuldade para transporte.

Tem de haver muita dedicação, dar ao devido significado àquilo, algo que vem muito da formação familiar. E ter permanecido por muito tempo no Palmeiras, morando em São Paulo por quase dez anos, com estabilidade, inegavelmente ajudou.

Não tenho dúvida de que o clube tem de atuar de maneira muito forte no incentivo e na exigência da educação. Porque um atleta educado e vivenciando experiências diferentes, saindo do dia-a-dia do futebol, vai ser um atleta muito mais bem formado, inclusive interpretando melhor sua profissão, seja conversando com a imprensa, relacionando-se com os companheiros, com o treinador, diretoria, ou mesmo analisando o jogo.

O Palmeiras hoje tem uma estrutura excelente e não fica devendo nada em termos de profissionais que trabalham junto a jogadores da base, psicólogas, assistentes sociais. Temos o nosso próprio restaurante, monitorado pela nutricionista, com alimentação prescrita visando melhor rendimento e formação do atleta.

Além disso, há um projeto integrado, em que o fisiologista do profissional coordena todas as categorias, junto ao fisiologista da base. Por exemplo: detectamos um talento com 15 anos. Esse jovem já começa a ser observado mais de perto nas questões físicas, se necessita de mais massa, força, um trabalho diferenciado. E todo esse cuidado é tomado.

Fico muito satisfeito, porque acompanho isso e tenho a experiência de ter sido formado aqui e muitas vezes compreender o que os aspirantes esperam e desejam.




Universidade do Futebol – Que comparação você faz, em termos técnicos e administrativos, entre o Palmeiras de hoje e o da época da Parmalat, quando havia uma proposta de gestão empresarial e que teve sucesso no curto prazo, mas que parece não ter deixado nenhum legado ou contribuição para a estrutura do clube?

Toninho Cecílio –
Eu era capitão do Palmeiras quando a Parmalat chegou, em 1992, com o Brunoro [José Carlos, diretor de esportes da Parmalat da América do Sul nesse período em questão] como diretor-técnico da diretoria administrativa da empresa, e vivi muito esse processo, especialmente no primeiro ano, enquanto eu ainda estava no clube*.

Foi uma parceria que deu muito certo, uma co-gestão, diferente do que é a Traffic hoje. A Parmalat deixou um legado muito importante no que tange a conquista de títulos. E nesse sentido foi um sucesso.

Havia muita sintonia entre as duas partes. A vaidade não predominava, apesar das discussões e contradições. Claro, problemas apareciam, mas eram contornados.

O que entendo que poderia ter sido melhor trabalhado é a condição estrutural das categorias de base. Não sei o que aconteceu, se efetivamente fazia parte do projeto, mas a agremiação tem de cuidar muito bem desse processo, dar oportunidade aos garotos do departamento amador, e aproveitar bem isso.

O clube voltou a ser muito respeitado e vencedor, culminando com a conquista da Libertadores de 1999.

A gestão diária se tornou mais ágil naquela época. Com um parceiro mais forte, você consegue tomar algumas decisões mais rapidamente, tem um suporte para arriscar mais, e isso faz com que a equipe possa ser montada de maneira mais rápida e efetiva, trazendo os principais atletas de destaque, vencendo a concorrência com os outros rivais, e se fortalecendo.

O Palmeiras sempre foi formado por dirigentes muito sérios, onde seu conselho funciona, é muito investigativo, e eu sempre elogiei esse ponto, mesmo quando estava fora.

Hoje, a Traffic não participa das decisões cotidianas do futebol e não tem ninguém aqui dentro do clube. Ela é um parceiro financiador, investidor, em uma relação extremamente bem sucedida. São profissionais que também respeitam muito a nossa cúpula, compreendem a realidade do futebol, e entendemos que está havendo sucesso.

A diferença em relação à Parmalat é que ela compra jogadores, desde que haja concordância, pela nossa comissão técnica e diretoria, do benefício deles ao time. Tanto que muitas vezes algumas contratações efetuadas pela Traffic não vingam no clube e vão parar em outros locais [clubes].

Diego Souza, Claiton Xavier, Keirrison, vieram por intermédio dessa união, assim como o último título paulista de 2008 e a classificação à Libertadores. Não tenho dúvidas de que o Palmeiras voltou a ser muito respeitado.

*Nota da redação: após defender o Palmeiras, Toninho foi negociado com o Botafogo, do Rio de Janeiro.Depois disso passou pelo Cruzeiro, antes de deixar o país. No Japão, pelo Cerezo Osaka, sagrou-se campeão e compôs a seleção de estrangeiros da J-League, a primeira divisão local.

Retornou ao Brasil para atuar no Coritiba. A partir de 1997, transitou por algumas equipes do interior de São Paulo (São José, União São João e Paulista, de Jundiaí), jogou pela própria Portuguesa Santista, e encerrando a carreira em 2001, atuando pelo Santo André.


Universidade do Futebol – E há na Traffic uma preocupação em relação à estrutura das categorias de base do clube?

Toninho Cecílio –
O departamento vem em um ritmo muito bom, mas comandado apenas pelo clube. É ponto de honra para essa atual diretoria, senhor Cipullo [Gilberto, vice-presidente de futebol] e professor Belluzo [Luis Gonzaga, presidente do Palmeiras], melhorar as condições das categorias de base. Desde 2007, quando voltamos ao clube, mesmo sem parceiro, iniciamos o investimento nessa área.

Vejo como um momento que vai ficar marcado como o grande salto na história do Palmeiras. Estamos desenvolvendoum projeto para que, junto com a possibilidade de alguns parceiros, e do governo em termos de incentivo fiscal, viabilizar a construção de um grande centro de treinamento para as categorias de base.

Antes disso, já fizemos um investimento no pessoal, contratando muitos dos profissionais mais qualificados do mercado para atuar diretamente com os jovens, e o Marcos Biasotto, como coordenador desse processo.

Montamos uma estrutura profissional para essa fase do jogador, a qual considero ser muito importante. O treinamento, o relacionamento dado, desde o sub-11, sub-13, em termos de fundamento, compreensão de jogo, são monitorados, e os resultados já vêm aparecendo. Em 2009, temos cinco atletas que foram aprovados pelo Luxemburgo e já atuam com o time principal.

Em Guarulhos, já temos um espaço muito bom para se treinar, com cinco campos em perfeito estado, mas necessitamos ainda da construção do alojamento e do refeitório no próprio local. Vejo um crescimento enorme [nesse setor do clube], e as oportunidades irão aparecer em breve a muitos desses jovens.




Universidade do Futebol – Durante sua palestra em um curso promovido pelo Sindicato dos Treinadores do Estado de São Paulo, você apresentou o Proam – Programa de observação e antecipação ao mercado –, uma espécie de banco de dados em que você filtra informações sobre diversos jogadores espalhados pelas divisões do futebol nacional e que atuam pelo mundo. Ele é o ponto-chave na sua administração, atuando no processo de transferência de atletas?

Toninho Cecílio –
É um planejamento de observação considerando todos os torneios disputados no Brasil e no exterior. É do meu conhecimento, em média, algo em torno de 800 atletas que saem do país e, por intermédio de um filtro, acompanhamos aqueles que têm qualidade técnica e acreditamos que possam voltar em alguma ocasião.

Como ele está jogando, se mudou de posição, qual o momento dele na equipe que defende, aspectos emocionais, as pretensões dele etc. Procuramos ter todas estas informações em nosso banco de dados o quanto antes e nos antecipar aos concorrentes.

Junto com os nossos observadores, aqui no Brasil, fazemos um trabalho direcionado. Há uma coordenação do que é feito, uma reunião quinzenal, de tudo o que se passa no futebol brasileiro, e isso alimenta um banco, com todos os dados do atleta – nível salarial, situação contratual, empresário, contato –, e quando possuímos alguma posição carente, fazemos a consulta.

Há várias subdivisões: atletas mais jovens, aqueles que venham “para resolver”, os de maior e menor risco, e tudo isso é debatido. Também não deixamos escapar os principais torneios – Estaduais, Séries A, B e C do Nacional, Sul-Americana, Libertadores.

Dá credibilidade ao projeto falar de nomes e de resultados. Antes de ser conhecido nacionalmente, o Palmeiras contratou o Thiago Neves a partir do Proam. Houve um pré-contrato, dentro da legislação, mas isso acabou vazando, o Fluminense pressionou, e o atleta, que se tornou o craque do Campeonato Brasileiro de 2007 [conquistou a tradicional Bola de Ouro concedida pela Revista Placar], acabou não atuando pela nossa equipe.

Outros casos importantes são os dos jogadores do Coritiba, quando ainda atuavam na Série B de 2007: Henrique e Keirrison. Nos antecipamos no processo de observação e apresentação de proposta, e o Keirrison, com 19 anos, tornou-se o artilheiro do Brasileirão do ano passado, uma pérola, um jogador que tem um perfil físico muito interessante, rápido, frio, finalizador; e o Henrique, que nos ajudou na conquista do Campeonato Paulista de 2008, um dos melhores zagueiros com quem trabalhei. Mas aí veio a proposta do Barcelona, que é uma questão macroeconômica, com a valorização de dólar e euro frente ao real, e a necessidade de fazermos caixa para sustentar o clube, e ele acabou negociado.

Tudo isso ilustra o trabalho de observação que é feito pelo Palmeiras, algo muito profissional, com diretriz. Pagamos pessoas para realizar esse procedimento. E não existe trabalho em alto nível sem sintonia com o treinador, com quem sempre dialogamos e executamos as ações, com a concordância entre as partes.

Universidade do Futebol – Outro exemplo é o Souza, observado, mas contratado para o Palmeiras B. Qual a funcionalidade desse grupo que disputa algumas competições em paralelo com o time principal?

Toninho Cecílio – O Palmeiras B serve de transição das categorias de base para o profissional e eu defendo a existência dele por isso. Aqueles talentos que têm qualidade, mas ainda estão “verdes”, vão participar dessa equipe.

Dentro do nosso planejamento, começamos a disputar as Séries A-2 e A-3 do Campeonato Paulista com a base montada desses jogadores que saíram do sub-20 - não disputam mais a Copa São Paulo de Futebol Júnior, mas ainda geram dúvidas [quanto ao potencial e à utilização efetiva pela equipe principal]. Ali, conferimos maior rapidez no amadurecimento desses atletas.

Um ou outro destaque dos Estaduais, fora de São Paulo, ainda jovens, mas que atuam pelos times principais dessas localidades, vêm para o Palmeiras B. É o caso do Souza, contratado do Dom Bosco, do Distrito Federal: destacou-se, e chegou à nossa equipe de acesso.

Aqui, analisamos a conduta diária dele, o nível de profissionalismo, como ele veste a camisa do clube, as exigências de uma agremiação grande, e também o perfil físico e psicológico dele de mais perto – a gana nas derrotas e vitórias.

O caso dele é bem explicativo. O Souza ficou seis meses disputando o Campeonato Paulista sub-20, onde foi observado por mim após algumas indicações da equipe da base, que convive mais de perto com os atletas. Mostrou condições de estar no elenco principal, debatemos com o Luxemburgo, e o jogador acabou tendo uma oportunidade.

Se você colocar isso em números, e em uma projeção conservadora, avaliar que o atleta poderá ser vendido no futuro por no mínimo 2 milhões de euros, você já consegue pagar praticamente quatro ou cinco anos da existência do Palmeiras B. Custo, investimento e retorno se justificam.

Universidade do Futebol – Corinthians e Palmeiras traçaram uma espécie de “parceria” para os duelos entre os dois grandes rivais, com ações conjuntas de marketing e exposição da marca “Derby”. Os clubes não poderiam estender essa união no que tange a discussão de modelos de campeonato e direitos televisivos de transmissão, por exemplo?

Toninho Cecílio –
Não há limite para a força que têm Corinthians, Palmeiras, assim como Santos, São Paulo, e os outros grandes clubes do país. Tanto que já houve, digamos, uma revolução no futebol com a criação do Clube dos 13, que tem esse papel, de discutir com a televisão, com os outros envolvidos no negócio futebol e defender os clubes. Isso já foi feito e é um exemplo. Claro que pode ser melhorado, as relações são assim, mas queria dizer que vejo o futebol brasileiro muito organizado.

Passei praticamente por três momentos, digamos assim, e joguei em uma época em que não havia sequer patrocínio na camisa, era algo muito raro. Posteriormente, o esporte passou a ser mais televisionado, assim como o advento da Lei Pelé, que pôs fim ao passe, dando mais liberdade ao atleta. Mudou muita coisa nesses 25 anos.

Vejo uma evolução gigantesca, o Campeonato Brasileiro por pontos corridos, sem mudanças de uma temporada para a outra, que é algo fantástico, e também a tentativa de a TV atender às necessidades dos clubes, pagando um valor substancial, que pode ser melhorado, mas isso vem caminhando. Não acredito, sinceramente, que o processo esteja estagnado.

Esse exemplo de Palmeiras e Corinthians, criando um produto de um jogo tão tradicional, foi algo extraordinário, com os departamentos de marketing atuando de maneira conjunta.

De nossa parte, em outros projetos que visam à área comercial e técnica, fizemos ainda o Palmeiras Camp, que foi um sucesso, deu lucro, utilizando-se ainda de uma mídia apenas espontânea. Temos um produto que dá lucro e será feito mais vezes.

Participei das primeiras reuniões para estabelecer as escolas franqueadas do clube, com as quais, creio, daremos um salto muito grande, preparando-nos para fazer delas um modelo como o das principais franquias das maiores empresas brasileiras.

Sou da opinião de que ou se faz algo grande com o nome do Palmeiras, que é muito forte no Brasil todo, ou não se faz nada.

Nitidamente, de forma genérica, cada vez mais pessoas, mais preparadas, estão participando do processo de gestão dos clubes. Sempre defendi a participação de ex-jogadores atuando junto às diretorias dos clubes, e vejo com muita felicidade a passagem do Antônio Carlos pelo Corinthians, o Mauro Galvão, no Grêmio e o papel do Branco no Fluminense.

Além de renomados profissionais da área de economia, marketing, planejamento, atuando diretamente nos departamentos de futebol, com o Palmeiras muito inserido nesse processo. É um momento muito interessante, a exigência é muita grande, os valores altíssimos, algo que requer muita responsabilidade, e todos têm de se qualificar e se adequar a essa lógica cada vez mais.

Universidade do Futebol – Diante dessa evolução do futebol brasileiro em termos administrativos, com que olhos você vê a preparação do país para receber a Copa do Mundo de 2014, e como o Palmeiras poderia participar diretamente desse evento?

Toninho Cecílio – O Brasil está muito preparado em termos de condição financeira. É um momento em que nossa economia caminha bem, temos uma reserva cambial jamais vista na nossa história e somos um país sólido, algo que me dá muito orgulho.

Temos todas as condições de sediar uma Copa do Mundo, não tenho dúvidas, e vejo o dinheiro público com um retorno social gigantesco, algo difícil até de ser mensurado. É o maior evento esportivo do mundo, e haverá ganhos nessa área social, em relação à utilização dos estádios, preparação do público para receber o estrangeiro etc.

Para nós, do Palmeiras, além disso, o ano [2014] é especial por se tratar do centenário do clube. Há um direcionamento das ações internas, primeiro para sermos uma equipe vitoriosa, e estamos nos modernizando para nos estabelecermos como a grande força da América do Sul.
Junto a isso, o momento traz uma Copa, da qual o Palmeiras buscará saber se aproveitar, primeiro fazendo sua arena, com o objetivo próprio, não para o evento, em principio, mas que pode receber jogos preparativos de uma seleção.
Será a única arena construída sob os novos encargos da Fifa, totalmente moderna, localizada em uma área privilegiada da cidade, em termos de localização. Além disso, pretendemos construir no nosso CT da Barra Funda uma estrutura para receber uma seleção durante o Mundial. E acho que isso irá acontecer.
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Benê Lima