Analisar uma partida de futebol vai muito além do óbvio
Felipe D. Bressan* / Universidade do Futebol
1. INTRODUÇÃO
São inegáveis os inúmeros avanços que o futebol vem sofrendo nos últimos anos. E, ainda que lentamente, essa evolução já tem se apresentado em alguns setores do futebol brasileiro.
Apesar de ser uma das modalidades esportivas que mais resistiu à evolução pela ciência, já se faz presente o aparecimento de novas metodologias que vem rompendo com o pragmatismo habitual.
Com isso a forma de se observar e analisar uma partida de futebol também se modifica. Faz-se necessário entender e estudar o jogo de futebol em sua complexidade.
2. DISCUSSÃO
Pode-se definir o futebol como uma estrutura complexa composta por duas subestruturas (equipes) que interagem entre si continuamente, em uma relação de oposição, através de seus componentes (jogadores, linhas) e em relações dinâmicas de forças representadas pelas fases do jogo na qual se buscam organizações eficazes (DI PASQUALE, 2012).
As observações e análises vão muito além do sistema de jogo de uma equipe em campo (1-4-3-3, 1-4-2-3-1, 1-4-4-2, etc.), de quais são os referenciais de marcação os jogadores durante a partida, da porcentagem da posse de bola, do número de passes certos ou errados, entre outros dados.
Uma forma de se visualizar como essa análise de forma simplista seria observar duas equipes que partem de um mesmo sistema de jogo (-1-4-2 3-1), porém se comportam em campo de maneiras totalmente deferentes.
Essas equipes podem utilizar-se de princípios distintos para a resolução de um mesmo problema levando a um modelo de jogo que as diferem e as identificam em campo. Portanto, sabemos de fato o que estamos observando em um jogo de futebol?
Como associar esse tipo de informação a complexidade do jogo sem que se tornem apenas “dados de efeito sem efeito aparente”? Por ser uma estrutura complexa, o jogo de futebol possui elementos que constituem uma organização coletiva que não pode ser compreendida pela análise descontextualizada das diferentes partes que a compõem (PIVETTI, 2012).
Antes de qualquer análise deve-se entender com clareza a estrutura do jogo e as relações dinâmicas que ocorrem no durante uma partida.
Para tanto, e fundamentalmente, há a necessidade de se compreender a Dinâmica do Jogo e o que vem a ser um Modelo de Jogo. Em que se baseiam as ações de uma equipe de futebol nos diferentes momentos de uma partida, para a partir desse ponto poder-se compreender e avaliar o todo.
O fato é que esse artigo não intenciona apresentar os pormenores de um jogo de futebol e entrar em discussões muito complexas, mas de expor de forma resumida e objetiva a estrutura de uma partida de futebol e gerar uma reflexão ao leitor sobre determinado ponto de vista e sua real compreensão ao realizar uma analise do jogo. Contudo se necessita definir a Dinâmica do Jogo e o Modelo de Jogo.
A Dinâmica do Jogo consiste em sucessivas ações nas quais as equipes passam de uma fase ofensiva para uma fase defensiva ou o inverso, através da perda ou da recuperação da posse da bola. Entre uma fase defensiva e uma fase ofensiva encontram-se as fases de transição defensiva (ataque-defesa) e transição ofensiva (defesa-ataque).
Não menos importante, acrescenta-se às fases do jogo as ações bolas paradas ofensivas e defensivas, que atualmente possuem uma grande parcela para o resultado final de uma partida.
O que se visualiza no diagrama supracitado (figura 1) é cada uma das fases que podem ser observadas durante uma partida de futebol e as possíveis ações gerais subsequentes de uma equipe em caso da perda ou da recuperação da posse da bola.
Cada uma dessas ações gerais é marcada por determinados princípios e subprincípios, sejam eles individuais ou coletivos, que conferem identidade a uma equipe de futebol dentro do jogo.
Esses princípios e subprincípios são as ferramentas utilizadas pela equipe ou pelo jogador para a resolução dos problemas que se apresentam durante uma partida.
O princípio de jogo é o início de um comportamento que um treinador quer que sua equipe assuma em termos coletivos e os jogadores em termos individuais. Deste modo os princípios de jogo potencializam determinados comportamentos. (SILVA, 2008)
Essas ações pré-determinadas estão baseadas no Modelo de Jogo de uma equipe que pode ser definido como o sistema de relações das unidades de resoluções táticas que configuram uma equipe de futebol definida pelos princípios e ideais do jogo. De uma maneira mais informal, seria estabelecer a forma como o treinador deseja que sua equipe jogue em cada uma das fases do jogo.
É claro que esse modelo não é rígido, uma vez que pode sofrer algumas mudanças circunstanciais dependendo do adversário que se vai enfrentar. Porém existe sempre um padrão de ações que não se modificam e com a sequência dos treinamentos e jogos trarão consistência ao jogar dessa equipe e do atleta.
Ao analisar uma partida de futebol alguns problemas gerados pela oposição característica do jogo devem ser resolvidos, gerando questionamentos sobre quais princípios ou subprincípios do jogo seriam os mais adequados para determinada equipe em um momento específico.
Exemplos:
O que fazer ao perder a posse da bola? Tentar recuperá-la imediatamente ou temporizar e posicionar-se defensivamente? Depois de posicionado defensivamente qual o comportamento da equipe? Pressionar o adversário de forma organizada? Realizar uma defesa de contenção marcando atrás da linha da bola? Realizar uma defesa combinada?
Ao recuperar a posse da bola qual deve ser o comportamento da equipe? Ampliar o campo de jogo ou compactação? Realizar um contra-ataque ou um ataque organizado? Esse ataque organizado deve ser um ataque combinado ou direto?
3. CONCLUSÃO
Como havia mencionado no início deste artigo, não intenciono aprofundar ou entrar em discussões muito complexas, mas gerar reflexões sobre a análise do jogo.
O tema é extenso e seriam necessárias centenas de páginas para explorá-lo de forma minuciosa e ainda sim, talvez não se esgotassem todas as possibilidades, porém apenas com essa simples introdução se pode remeter a sua complexidade.
Se focarmos a análise do jogo simplesmente no posicionamento dos atletas em campo, nos referenciais de marcação, em dados numéricos aleatórios que não se associam ao modelo de jogo de determinada equipe, estaremos compreendendo de fato o que está acontecendo no jogo?
As respostas às perguntas estão presentes no modelo de jogo das equipes e na dinâmica do jogo.
Não existe resposta certa ou errada e sim o que melhor soluciona os problemas apresentados pela oposição gerada pelo adversário durante uma partida.
Por isso finalizo com um questionamento, o mesmo com a qual iniciei essa explanação: sabemos de fato analisar um jogo ao assistirmos uma partida de futebol?
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DI PASQUALE, R. La complessità del gioco del calcio e la metodologia operativa., 4o Convegno Sul Calcio Giovanile, 2012.
PIVETTI, B. M. F. Periodização Tática: o futebol arte alicerçado em critérios. São Paulo, Phorte Editora, 2012.
SILVA, M. O desenvolvimento do jogar segundo a periodização táctica. Tuy (Pontevedra), Espanha, MCsports, 2008.
*Bacharel em Esporte pela Universidade de São Paulo (USP), treinador de Futebol.
Contato: homebressan@terra.com.br
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Benê Lima