Paulo Vinícius Coelho / colunista Folha
Contudo, em meio às articulações, Edu Gaspar, ex-Corinthians, foi
o escolhido. Del Nero não chegou a telefonar para Leonardo.
Radicado na Itália, ex-técnico de equipes como Internazionale, de
Milão, e ex-diretor do Paris Saint-Germain, Leonardo Nascimento de Araújo, 46,
é o brasileiro com mais conhecimento de gestão do futebol europeu.
Em entrevista à Folha,
fala sobre os problemas do futebol brasileiro e aponta a salvação: os clubes.
Folha - Alguém da CBF conversou com você, fosse um convite ou
troca de experiências?
Leonardo - Nunca fui
procurado. Talvez porque minhas posições tenham sempre ficado bem claras e
sejam distantes do que existe hoje. Mas veja. Não quero falar que a CBF é isto,
aquilo. Temos de sair um pouco da fase de lamentação. Temos de ir para a fase
da ação.
Pessoas de outros segmentos têm conversado com você?
Talvez a CBF não tenha me procurado porque minha volta ao Brasil não é fácil.
Importante também dizer isso. Não sou candidato a nada. Estou muito enraizado
na Europa. Mas participar é bom. As pessoas me procuram muito hoje, sim. Os
clubes, o Bom Senso, pessoas que querem aprovar leis, jogadores, treinadores.
Você não é candidato a nada. Mas se fosse presidente da CBF, o que
faria?
Partiria de um projeto dos clubes. Não existe futebol forte sem clube forte e
campeonato forte. Hoje, a CBF teria essa missão. Mas seria importante se ela
ajudasse a criar uma liga. Mesmo os clubes não trabalham isso. Então o
presidente da CBF precisa ser o cara que mude o futebol brasileiro. A visão
hoje é política, não é esportiva nem econômica, o que freia nossa evolução. A
política nos impede de ser atuais.
A situação política atual permite esse avanço?
Independentemente da posição do presidente da CBF ser delicada, ele poderia ser
o piloto de uma nova estrutura do futebol. Já convivi com muitas esferas de
poder. Sei como é difícil ceder. Mas hoje nosso futebol está cada vez mais
deteriorado. É momento de ceder um pouco. De ser o criador de um projeto que
estimule os clubes a serem gerenciados de outra maneira. É um problema a
estrutura dos clubes também ser política. Seus dirigentes não são escolhidos
porque têm formação, porque estudaram, prepararam-se. São políticos também, o
que é muito ruim.
No Brasil, o "negócio" é visto muitas vezes só como
exportação de atletas. É possível criar torneio relevante que reduza a
obrigação de exportar?
É possível, porque somos o Brasil. Não quero ficar sentado nos
louros do passado. Pode ter um produto vendável, com qualidade. Sabemos
produzir, mas não conseguimos mais. Mas é necessário partir de um projeto dos
clubes. Só os clubes podem salvar o futebol brasileiro.
Qual o primeiro passo?
No início, tem de haver uma mudança da estrutura jurídica de todos os clubes. E
a criação de uma entidade que regule esse novo campeonato. Hoje, a notícia que
acontece no Brasil não sai nem na Argentina.
A China está investindo na Europa e não no Brasil, porque o Brasil
não tem estrutura nem credibilidade. Para investir, precisa mudar a estrutura
jurídica [refere-se à criação de clubes empresas ou outros mecanismos que
permitam a entrada de capital estrangeiro]. A China é só um exemplo. O
importante é ser sempre atual para captar os investidores do momento.
Isso tudo tem de passar pelos clubes, mas a CBF tem de ser a
aglutinadora de um mercado de clubes que hoje só brigam por política. Você acha
que um dirigente hoje investe mais na relação política ou nas divisões de base?
De quanto tempo o Brasil precisa para voltar ao topo?
Leva tempo, mas o maior problema é conseguir que todos pensem assim. Jogadores,
dirigentes, federações, imprensa, torcedores. Estamos todos divididos. Não
quero saber do passado. A Justiça pode querer saber disso. Mas daqui para a
frente, o objetivo precisa ser fazer outro futebol.
Você detalhou a crise do futebol brasileiro. A crise da seleção é
do mesmo tamanho?
A seleção é sempre consequência do futebol brasileiro, não o contrário. Hoje, o
jogador médio do Brasil é pior do que o médio das grandes potências. E isso
passa por formação. Oito de 11 jogadores são bem formados na Europa. Eles fazem
a diferença. Temos de aumentar a nossa média com nova metodologia de
treinamento.
O país dará vexame na Rússia?
Pode chegar com o mesmo time, acertar o ambiente, criar coisas positivas e
vencer. Mas se tiver dez competições, não vai ganhar cinco como acontecia no
passado. A formação aqui é muito apressada. O brasileiro vai para a Europa e
diz: "Aqui se treina melhor, aqui me recupero mais rápido". Não que o
Brasil não saiba. Mas precisa ter metodologia. O jogador na Europa conhece mais
o jogo. A gente não tem cultura do treinamento. Então, um menino na Europa, aos
15 anos, pode ter menos talento, mas tem mais competitividade.
O que representou o 7 a 1?
O 7 a 1 acabou colocando tudo isto em evidência. Nunca discutimos profundamente
nossos problemas, porque não tinha acontecido uma catástrofe. O 7 a 1 levou
nossa auto-estima. E a auto-estima nos fez ganhar muito. Convencia até os
adversários de que éramos melhores. Mas há outras coisas a pensar sobre a Copa
no Brasil. Que voz os clubes tiveram na organização da Copa do Mundo?
Nenhuma.
Nenhuma. Como você faz o maior evento, que pode trazer mil
benefícios e nenhum clube se senta na mesa. A Alemanha usou a Copa para fazer
da Bundesliga o segundo campeonato mais importante da Europa. Fez centros de
formação e aumentou a média de audiência em televisão e no estádio. São as
maiores da Europa. Tudo a partir de um evento. Estamos na idade da pedra de
gestão. Hoje se tiver um jogo da Champions League e outro do Brasileirão, as
pessoas assistem à Champions.
Você é pessimista?
Isto tudo não sonho. O Brasil pode fazer. Mas hoje não tem união de todos os
setores. A gente não sai do lugar por causa disso. Se eu fosse presidente da CBF,
eu faria tudo a partir dos clubes.
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Benê Lima