Conhecido por dar as aulas mais concorridas da Universidade Harvard, o israelense Tal Ben-Shahar conta como ajuda os alunos a ser mais realizados
Por Anna Carolina Rodrigues
O professor Tal Ben-Shahar: “A felicidade não é estática. É um processo que termina apenas com a morte” (Divulgação)
São Paulo – Os cursos mais
populares da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, não ensinam medicina nem direito, mas
felicidade. No ano passado, mais de 1 000 alunos se inscreveram para assistir às aulas do professor
Tal Ben-Shahar, que usa um ramo da psicologia para ajudar os estudantes de graduação na busca da realização pessoal.
Na primeira vez que
ministrou o curso, há dez anos, oito pessoas se inscreveram. A fama cresceu e,
embora os alunos façam trabalhos, não recebem notas, mas algo mais pessoal.
“Eles falam que a aula muda a vida deles”, diz Tal. Nesta entrevista, ele
mostra como encontrar satisfação profissional e pessoal.
VOCÊ
S/A – Aulas que têm como enfoque otimismo e felicidade não
são algo comum em uma universidade tradicional como Harvard. Por que
criou o curso?
Tal
Ben-Shahar – Comecei a estudar psicologia
positiva e a ciência da felicidade porque me sentia infeliz. No meu segundo ano
de estudante em Harvard, quando cursava ciência da computação, eu era
bem-sucedido, pois tinha boas notas e tempo para atividades que me davam
prazer, como jogar squash. Mesmo assim era infeliz.
Para entender por que, mudei de área e fui cursar
filosofia e psicologia. Meu objetivo era responder a duas perguntas: por que
estou triste e como posso ficar feliz? Estudar isso me ajudou, e decidi
compartilhar o que aprendi.
VOCÊ
S/A – Uma pesquisa de doutorado feita no Brasil revela visões
diferentes do que é ser bem-sucedido, que vão além de dinheiro e poder. As
pessoas buscam algo mais profundo?
Tal
Ben-Shahar – Sucesso não traz,
necessariamente, felicidade. Ter dinheiro ou ser famoso só nos faz ter faíscas
de alegria. A definição de sucesso para as gerações mais novas mudou. Não é que
as pessoas não busquem dinheiro e poder, mas há outros incentivos.
No passado, sucesso era definido de maneira
restrita, e as pessoas ficavam numa empresa até a aposentadoria. Agora, há uma
ânsia por ascender no trabalho, ter equilíbrio na vida pessoal e encontrar um
propósito.
VOCÊ
S/A – Qual a principal lição sobre a felicidade o senhor aprendeu?
O que realmente interfere na felicidade é o tempo
que passamos com pessoas que são importantes para nós, como amigos e familiares
— mas só se você estiver por inteiro: não adianta ficar no celular quando se
encontrar com quem você ama. Hoje, muita gente prioriza o trabalho em vez dos
relacionamentos, e isso aumenta a infelicidade.
VOCÊ
S/A – Descobrir para onde queremos ir seria a grande questão?
Muita gente não sabe o que pretende da vida
simplesmente porque nunca pensou sobre o assunto. As pessoas vivem no piloto
automático. Ouvem de alguém que deveriam ser advogado ou médico, e acreditam em
vez de se perguntar do que gostam. Essa é a questão fundamental.
VOCÊ
S/A – Como aplicar as diretrizes da psicologia positiva no dia a dia do
trabalho?
Uma maneira é pensar nos progressos diários que um
profissional alcança no fim de cada dia. Segundo uma pesquisa de Teresa
Amabile, professora de administração da Harvard Business School, quem faz isso
tem índices mais altos de satisfação e é mais produtivo.
Deve-se também valorizar os próprios pontos fortes
e, no caso dos chefes, os pontos fortes das pessoas da equipe, o que aumenta a
eficiência dos times. Isso não significa deixar de lado as fraquezas, que devem
ser gerenciadas. Apenas que a maior parte da energia precisa ser gasta
fortalecendo os pontos fortes ao máximo.
VOCÊ
S/A – Dá para fazer isso mesmo em momentos de crise ou de baixo desempenho?
Sim, desde que os profissionais sejam realistas.
Em 2000, quando Jack Welch (ex-presidente da GE e referência em gestão) foi
nomeado o gerente do século pela revista Fortune, perguntaram que conselho ele
daria a outros gerentes. A resposta foi: aprendam a encarar a realidade.
O mesmo se aplica nesse caso. A psicologia
positiva não defende que os erros e os pontos fracos sejam ignorados. Apenas
propõe uma mudança de foco: parar de enxergar só o que vai mal e ver o que dá
certo — mesmo nas crises. A proposta é observar o quadro completo da realidade.
VOCÊ
S/A – Qual sua opinião sobre o discurso de que basta fazer o que ama para
encontrar satisfação profissional?
Isso pode ser a solução para alguns. Na maioria
dos lugares e trabalhos, é possível identificar aspectos significativos para
cada pessoa. Uma pesquisa feita com profissionais que trabalham em hospitais
mostrou que tanto no caso de médicos quanto de enfermeiros e auxiliares havia
profissionais que enxergavam o trabalho como um chamado e outros que o viam
apenas como um emprego.
Em outras palavras, o foco que damos ao trabalho
acaba sendo mais importante do que a natureza dele. Alguém que é funcionário de
um banco pode pensar que trabalha com planilhas o dia todo ou que está ajudando
as pessoas a gerenciar sua vida.
VOCÊ
S/A – O jornalista britânico Oliver Burkeman defende que não se deve
buscar felicidade, mas o equilíbrio, pois ninguém pode ser feliz sempre. O que
acha disso?
Concordo. A primeira lição que dou na minha aula é
que nós precisamos nos conceder a permissão de sermos seres humanos. Isso
significa vivenciar emoções dolorosas, como raiva, tristeza e decepção. Temos
dificuldade de aceitar que todo mundo sente essas emoções às vezes. Não aceitar
isso leva à frustração e à infelicidade.
VOCÊ
S/A – O senhor é feliz?
Eu me considero mais feliz hoje do que há 20 anos
e creio que serei ainda mais feliz daqui a cinco anos. A felicidade não é
estática. É um processo que termina apenas com a morte. Encontrei significado
em meu trabalho e faço o que me dá prazer, mesmo tendo, como todo mundo, momentos
de estresse e sofrimento — esse é o equilíbrio que todo profissional deve
almejar.
Mas também procuro desfrutar de coisas fora do
mundo do trabalho: passar tempo com minha família, com meus amigos e encontrar
um espaço na agenda para a ioga. Tudo com moderação.
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Benê Lima