Poder da proxêmica é extraordinário e poderia ser uma forma de implantar num estádio uma metodologia de prevenir esses comportamentos inadequados
Lilian de Oliveira
Não só no Brasil, mas em muitos países, a segurança nos estádios é uma questão que está sendo encarada como a prioridade na organização de campeonatos de futebol. A Uefa Champions League é a vanguarda nesta questão e realizou já alguns workshops de segurança envolvendo várias federações europeias e se disponibilizam a informar sobre design e técnicas de segurança na criação de novos estádios. Diversas formas de abrangência já foram estudadas, e destaques como a Espanha, Inglaterra e Itália já conseguiram reduzir drasticamente as manifestações violentas e de hooliganismo em seus estádios.
A Universidade de Leicester, por exemplo, tem um departamento que estuda somente questões relacionadas ao futebol, inclusive à segurança nos estádios. Conforme estudos feitos com primatas, foram aplicadas na Inglaterra novas técnicas para conter qualquer sinal de violência antes que as pessoas percebam.
O comportamento em massa é muito diferente do comportamento de qualquer manifestação individual. As atitudes e movimentações de multidões funcionam como bolas de neve e ganham proporções muito maiores com desgastes muito superiores. Para isso, o estudo em Leicester adotou a inserção de policiais a paisana no meio das torcidas, que estão treinados a identificar qualquer indivíduo-problema. Essa abordagem diminuiu drasticamente o número de pequenas manifestações que poderiam gerar grandes “guerras” dentro de estádios britânicos.
Na Itália, por exemplo, um prazo foi dado para que a “Tessera dei Tifosi” (os cartões de sócio-torcedor) fosse aderida por todos os times. Ainda há alguns que não estão usando, mas serão penalizados caso não adotem esse método dentro do prazo estabelecido. Alguns italianos torcedores do Milan, um dos primeiros times a tomarem o procedimento, já disseram sentir uma grande diferença na segurança, já que esse tipo de cartão de crédito registra a entrada de todos que entram no estádio e bane os torcedores que causam tumultos por cinco anos.
Além do registro que o cartão proporciona à segurança, ele também oferece benefícios aos que o possuem. Parcerias dos clubes com comércios dão descontos, há a prioridade da compra dos bilhetes para as partidas do time do qual a pessoa é torcedora, brindes, a possibilidade de reservar bilhetes, e também de comprar bilhetes para outras pessoas (claro que declarando esta pessoa antes do jogo). Para isso, no caso do AC Milan, é necessário para somente no momento da aquisição o valor de dez euros.
De outra forma, medidas de adequação e atualização de estádios e de seu entorno viabilizam uma limitação comportamental, por meio de barreiras ou até mesmo de organização dos horários de entradas e saídas das torcidas. Uma outra sugestão é que poderia ser feito um estudo de proxêmica, um ramo da arquitetura que influencia no comportamento por meio de estímulos que não são percebidos pela maioria das pessoas. Um exemplo básico desse estudo é a forma como livrarias se organizam para que as pessoas observem e percorram todas as estantes da loja. Mesas redondas são escolhidas de forma a alimentar um percurso. Sem que o cliente perceba, ele é induzido a percorrer a loja, atraído por cores, placas, formas e organização das estantes, altura dos produtos, preços, etc. O poder da proxêmica é extraordinário e poderia ser uma forma de implantar num estádio uma metodologia de prevenir esses comportamentos inadequados, mas acredito que este nunca foi um ponto estudado no setor de eventos de grandes massas.
Além de ser uma metodologia menos agressiva como o policiamento atual, ainda é mais econômico por ser algo que é feito uma vez e depois não são necessários manutenção ou gastos com funcionários.
A conscientização dos torcedores durante esses eventos e por meio de mídias como a televisão e a internet seriam de grande eficiência em longo prazo. Portanto, para uma Copa do Mundo no Brasil em 2014, essa ferramenta deveria ser utilizada desde já – não se conscientiza toda uma torcida de imediato. Essa fórmula, junto à imagem de ícones do futebol, também pode ser utilizada. Se não fosse eficaz, grandes marcas não adotariam esses ícones como imagem de seus produtos. Trata-se também de um comportamento mais ligado ao futebol, pois não estamos acostumados a ver esse mesmo tipo de comportamento em outros esportes de grande valor no Brasil, como vôlei, natação, etc. Portanto, é uma questão de hábito, que, por meio desse método, pode ser revertido.
As medidas preventivas já demonstraram ser as mais eficazes e mais baratas. No Brasil, o cartão do sócio-torcedor está em fase de implantação. No entanto, o que deveria ser feito é um conselho de segurança com profissionais de diversas áreas a fim de abranger todos os conhecimentos possíveis para prevenir atitudes violentas, dentro e fora dos estádios, sejam eles de urbanismo, arquitetura, marketing, técnicas de policiamento e de organização dos campeonatos, financeiros, de psicologia, sociologia, ou qualquer outro segmento que possa trazer, em conjunto, uma metodologia de ação e de política de tolerância zero para um sistema seguro ao torcedor. O segredo está na união de diversas atividades.
Bibliografia
Departamento de Sociologia da Universidade de Leicester: www.le.ac.uk/snccfr
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Benê Lima