O nível técnico do jogador brasileiro
Uma verdade sobre a formação dos nossos atletas
Wladimir Braga
Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão. (Paulo Freire)
O atleta brasileiro, mundialmente, é conhecido pelas jogadas “geniais”, com dribles magníficos e gols de placa. Mas considerando o futebol enquanto esporte tático, em que os aspectos técnicos e físicos têm importância decisiva, é preciso relacionar os outros fundamentos técnicos que são igualmente importantes para o bom desempenho do atleta profissional.
Além do drible, os fundamentos são: passe, domínio, cabeceio, condução, chute a gol ou finalização que se estendem em outros itens. O passe, por exemplo, possui as variantes, cruzamento, inversão de jogo, lançamento, passe curto de primeira. E ainda temos no cabeceio outra forma de passe.
O próprio cabeceio pode ser defensivo ou ofensivo, o domínio pode ser com os pés, coxas, peito, cabeça ou qualquer parte do corpo que não as mãos ou braços. O chute a gol é evidenciado com a parte interna ou externa dos pés, com o peito do pé, de voleio, bate-pronto, calcanhar, além de sabermos que podemos fazer gols com os joelhos e até mesmo com as coxas.
Continuando, podemos conduzir a bola com o dorso do pé quando queremos mais velocidade. Usamos a parte interna ou externa para mudar a direção, em determinadas situações, precisamos pisar na bola como no futsal; em outras, podemos conduzir a bola nas embaixadas e até de cabeça.
Com tudo isso, precisamos questionar até que ponto o jovem atleta brasileiro é bem preparado para o futebol profissional e se bom nível técnico é entendido como um real domínio dos fundamentos técnicos ou capacidade de realizar malabarismos de circo com a bola e saber driblar.
O drible, sem dúvida, também é um elemento importante e decisivo no jogo, mas futebol é muito mais do que isso. Atletas que estão há anos no mesmo clube não podem chegar no sub-20 com problemas básicos de elementos técnicos da modalidade.
O jogador brasileiro precisa, sim, de mais volume de treino técnico e de mais concentração para a execução de gestos motores específicos de sua modalidade. Não podemos nos esconder atrás do pentacampeonato mundial e achar que nossos atletas são superiores por causa disso.
Acompanhando os jogos da Liga dos Campeões, bem como das competições nacionais européias, é evidente o altíssimo nível técnico dos outras atletas em relação a muitos jogadores que consideramos craques de bola. Dessa forma, aos jovens treinadores e profissionais de clubes formadores, é preciso rever se os conteúdos estão realmente sendo ministrados de maneira eficiente ou se é preciso mais horas de treino técnico em detrimento de sistemas de jogo.
Reforçando essa preocupação com a preparação na base, é preciso definir bem o conceito da relação formação x rendimento.
É lamentável que ainda se acredite que quando se treina para o jogo não se treina para a formação; que quando se forma bem, não se treina para o jogo. Na verdade, formação e rendimento não são coisas dicotômicas ou contrárias. O conceito a ser definido é: quando se forma direito, o rendimento aparece a curto e longo prazo.
Ou seja, a definição dos conteúdos técnico, tático e físico, por categoria, assegura que os elementos importantes em cada etapa ajudem também no rendimento momentâneo, mas principalmente permitam, aliados a uma boa captação de talentos, a formação e revelação de jovens profissionais para o futebol.
Não podemos esquecer que apesar de ser um esporte coletivo e/ou tático, a preparação individual é ponto fundamental na formação de jovens atletas. Nessa fase, principalmente até os 15 anos, a técnica e a capacidade tática individuais são mais importantes que o sistema de jogo. Já a partir dos 16, o rendimento individual é igualmente importante em relação ao rendimento coletivo, no que se refere à formação. Nunca superior.
Aqueles questionamentos quando ligamos a televisão e observamos um lateral sem marcação errar um cruzamento pode estar associado a isso. É claro que a tomada de decisão também interfere, mas quantas finalizações na cara do gol o atacante chuta para fora? E um dado irrefutável: chutamos muito pouco de fora da área. O jogador brasileiro precisa entrar no gol com bola e tudo. Isso também pode ser porque tática e tecnicamente não são condicionados a fazê-lo.
Enfim, é um ponto a ser mais discutido. Acredito que tenha fundamentação independentemente de alguma discordância. É preciso investigar, cada um em seu ambiente de trabalho, se isso realmente está acontecendo, pois é grave e nossos adversários mundiais já no alcançaram há muito tempo. Nós é que não percebemos isso.
*Wladimir Braga é preparador físico do Clube Atlético Mineiro e coordenador do Geaf
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Benê Lima