Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

domingo, dezembro 25, 2011

O “quando” da especialização no futebol

Processo deve estar amparado por uma qualificação dos profissionais envolvidos com crianças a fim de evitar saturação precoce e experiências emocionais negativas
João Baldoino de Almeida Neto*

Resumo
Existe uma grande procura por escolinhas de futebol para crianças, cujas aulas são muito relevantes para o processo de desenvolvimento fisiológico e psicológico. Essa procura também acontece, pois os pais sustentam a ideia de que o esporte serve como fator educacional. Em todo o mundo, existe preocupação com alternativas para o trabalho de atividade desportiva para jovens. Na verdade, as crianças e os jovens merecem uma atividade desportiva a sério, fundamentada, orientada e dirigida corretamente nas suas práticas de aprendizagem de iniciação e de competição. Portanto, há uma elevada importância da prática desportiva, ao lado do acentuado aumento de competições num quadro desportivo altamente especializado. Por isso a ciência desportiva tem procurado determinar a faixa etária mais adequada para haver a especialização de uma modalidade especifica, para que não aconteça uma especialização precoce. Contudo, o presente estudo tem como objetivo verificar e analisar através de uma revisão bibliográfica a idade ideal para se especializar no futebol.
Introdução
O principal problema na prática esportiva é a cobrança de resultados, levando os praticantes ao adestramento, ou seja, melhorar as técnicas e buscar as vitórias de qualquer maneira. Já no jogo o que prevalece é o prazer, o caráter de riso e os jogadores tem espaço para a criatividade. (PAES, 1997)
Nos clubes, nas chamadas categorias de base o que mais acontece é a especialização precoce, ficando muito fácil de identificarmos. Devido a várias características que possuem do esporte de alto rendimento reproduzidas nesse contexto, onde há técnicos maltratando seus atletas por erros cometidos, pais xingando árbitros, frases agressivas entoadas pela torcida. Aprofundando um pouco o nosso olhar para além do momento da competição, encontramos crianças submetidas a peneiras (testes) para a seleção da equipe e a seções de treinamento exaustivas, muitas vezes incompatíveis com a continuação dos estudos (KORSAKAS, 2002, apud LEITE, 2006)
A especialização esportiva precoce vem sendo cada vez mais usada por professores em clubes e escolas. Isso reflete a busca de treinadores e de instituições por mais status na sociedade e uma melhor afirmação de seus nomes. Isso por sua vez reflete a necessidade de auto-afirmação do sistema capitalista vigente. Porém, há quem diga que essa metodologia é muito eficaz, pois descobre muitos talentos esportivos. Entretanto, os danos são maiores que os benefícios: se muitos se preocupassem em desenvolver atividades que contribuem para o desenvolvimento integral das crianças, com certeza teria um maior número de atletas e talentos.
O “quando” da especialização no futebol
É difícil precisar a idade ideal para começar um treinamento específico nos jogos coletivos, mas existem alguns estágios que o ser humano precisa ultrapassar para chegar à maturação biológica, neurológica e motora que permita a aprendizagem dos fundamentos específicos de uma modalidade esportiva, devendo obedecer as individualidades. (BIZZOCCHI, 2004)
Greco (2001) afirma que, acima de tudo, a especialização motora deve ser uma opção de vida que, além de exigir uma dedicação exclusiva, parece estar reservada apenas para uma minoria.
Para Gallahue ( 2005), os movimentos relacionados às habilidades esportivas devem iniciar dos 7 aos 10 sem especificação de determinada modalidade, propiciando total liberdade para o descobrimento e a vivência em geral. Entre os 11 e 13 anos já deve haver a especificação de algumas habilidades e a concretização de movimentos, sem a imposição de uma modalidade esportiva. A partir dos 14 anos, a criança estará apta a se dedicar a um esporte determinado , participando de qualquer esporte formal ou informal, recreativo e competitivo.
Segundo Paes (1997, p.39) :
 
“Para iniciação desportiva especializada é necessário que a criança, a nível de competições formais, atinja um desenvolvimento psicomotor e que tenha condições de desempenhar as funções necessárias para a situação proposta, tais como: um grau de intelectualidade para compreender, e também manutenção psicológica para o momento de glória e as frustrações que ocorrem na competições”.
 
Para Greco (2001), a melhor fase para se iniciar a especialização e o aperfeiçoamento técnico de uma modalidade esportiva é dos 14 aos 16 anos, não devendo ultrapassar a freqüência de três vezes por semana. Entretanto, é importante que o jovem participe de duas ou três modalidades esportivas para que tenha um enriquecimento motor.
Entre 10 e 11 anos de idade, nesta fase já pode haver o aperfeiçoamento desportivo, pois as crianças já têm maturidade para participar de jogos que apresentam ações baseadas em cooperação e colaboração. O objetivo dessa etapa é introduzir elementos técnicos fundamentais, táticas gerais e atividades com regras e jogos educativos. Também nesta fase deve ampliar o repertório de movimentos básicos de diversos esportes, pois essa faixa é considerada como excelente para o aprendizado. (ALMEIDA, 2005, apud RAMOS e NEVES, 2007) Para o autor, dos 12 aos 13 anos, que é conhecida como fase de introdução ao treinamento.
O objetivo desta fase é o aperfeiçoamento das técnicas individuais, dos sistemas táticos, qualidades físicas necessárias para a prática do desporto, pois o jovem já tem significativo desenvolvimento intelectual e físico. Os professores devem oferecer atividades que atendam as necessidades individuais e coletivas, através de jogos dos diversos desportos. (ALMEIDA, 2005, apud RAMOS e NEVES, 2007)
Já Arena (2000) considera a faixa etária de 12-14 anos como a mais indicada para que a criança comece a participar do treinamento de uma modalidade específica, assim como, de eventos competitivos. Porém as crianças até os 12 anos não deve participar de atividades esportivas específicas e de competições formais, por não possuir maturidade suficiente para compreender e assimilar tudo o que está envolvido em um processo competitivo.
Paes (2004) postula que a especialização esportiva deve ocorrer após o pico de velocidade do crescimento da estatura, tomando por base a idade biológica da criança. O pico de velocidade da estatura tem, para os meninos, a idade aproximada de 14 a 15 anos e para as meninas, 13 a 14 anos. Deste modo, ao especializar os atletas, o professor/técnico tem uma tarefa difícil e delicada para identificar o momento ideal na aplicação dos métodos de treinamento.
Conclusão
A partir das abordagens acima pudemos ter noção de como muitos ou a maioria dos treinadores e professores estão despreparados. Não se importando com o desenvolvimento integral das crianças, apenas estão preocupados com o status que possa vir a adquirir nesta sociedade capitalista, caso torne sua equipe campeã de alguma modalidade ou se porventura descobrir algum talento esportivo. Para o bem da criança e do próprio esporte é melhor pararmos de investir nas crianças nossas aspirações pessoais, nossos interesses, nossos desejos. Porque muitas crianças param de praticá-lo no melhor momento, na hora em que estão amadurecendo quantitativa e qualitativamente. Porque, quem foi criança e parou de jogar por sentir-se pressionada, rotulada, insegura, lesionada, não esquece a terrível experiência. E, pior do que isso, passam anos no esporte e o abandonam. Saem do mesmo desgastadas emocionalmente, fragmentadas, inseguras, lesionadas, levando, vida afora, as possíveis conseqüências. Algumas param, pois sentem-se desgastadas, desmotivadas em conquistar mais aquele título, aquele campeonato (pois em alguns anos de prática intensiva já conquistaram títulos municipais, estaduais, prêmios individuais) e preferem freqüentar outros ares. É a tal da saturação esportiva. O garoto não quer mais continuar a prática esportiva porque começou muito cedo, foi várias vezes campeão, está saturado (PINI & CARAZZATTO, 1978).
 
Albert Einstein relata muito bem o que vem a ser uma especialização inadequada:

"Não basta ensinar ao homem uma especialidade. Porque se tornará assim uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. É necessário que se adquira um sentimento, um senso prático daquilo que vale a pena ser empreendido, daquilo que é belo, do que é moralmente correto. A não ser assim, ele se assemelhará, com seus conhecimentos profissionais, mais a um cão ensinado do que uma criatura harmoniosamente desenvolvida. Deve aprender a compreender as motivações dos homens, suas quimeras e suas angústias para determinar com exatidão seu lugar exato em relação a seus próximos e à comunidade. Os excessos do sistema de competição e de especialização prematura, sob o falacioso pretexto da eficácia, assassinam o espírito, impossibilitam qualquer vida cultural e chegam a suprimir os progressos nas ciências do futuro. É preciso, enfim, tendo em vista a realização de uma educação perfeita, desenvolver o espírito crítico na inteligência do jovem."

 
Com base nos autores acima é difícil precisar a idade ideal para a iniciação ao treinamento especializado, porém afirmam que é a partir dos 12 anos que a criança já tem maturidade para praticar o futebol. Entretanto, por experiência em treinamentos e com base nas novas tendências de ensino do futebol, poderá haver uma especialização desde os 8 anos, portanto a metodologia de ensino deverá ser pautada no “jogo”.
*Graduado em Educação Física pela FAEF/UNASP e Pós Graduando em Futebol e Futsal pela UGF.
Referências bibliográficas:
ARENA, S.S. Programas de iniciação e especialização esportiva na grande São Paulo. Revista Paulista de Educação Física. 14 (2), 184-95, 2000.
BIZZOCCHI, Carlos. O voleibol de alto nível : da iniciação à competição – Barueri, SP : Manole, 2004.
GALLAHUE, D. OZMUN. Compreendendo o desenvolvimento motor: bebês, crianças, adolescentes e adultos. 3a edição. São Paulo: Phorte, 2005.
GRECO, Pablo Juan, Rodolfo Novellino Benda., Organizadores. Iniciação Esportiva Universal. Belo Horizonte – MG: Ed. UFMG, 1998.
NETO, João Baldoino de Almeida. Jogos coletivos na educação física escolar. Hortolândia, FAEF-UNASP, 2008.
PAES, Roberto Rodrigues. Aprendizagem e competição precoce: o caso do Basquetebol, 3.ed. - Campinas, SP : editora da UNICAMP, 1997.
PAES, Roberto Rodrigues. A pedagogia da iniciação esportiva: um estudo sobre o ensino dos jogos desportivos coletivos. http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 10 - N° 71 - Abril de 2004
RAMOS, A.; NEVES, R.. A Iniciação esportiva e a especialização precoce à luz da teoria da complexidade – notas introdutórias. Pensar à prática. Goiânia,             11 20 03 2008      .
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