Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

sábado, março 03, 2012

Márcio de Oliveira Guerra, doutor em Comunicação e coordenador do NUPESCEC

Jornalista esportivo e professor acadêmico fala de relação entre futebol real-virtual, música e rádio
Bruno Camarão / www.universidadedo futebol.com.br

A Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – é uma instituição sem fins lucrativos, destinada ao fomento e à troca de conhecimento entre pesquisadores e profissionais atuantes no mercado. A entidade “estimula o desenvolvimento de produção científica não apenas entre mestres e doutores, como também entre alunos e recém-graduados em Comunicação”, com o oferecimento de prêmios como forma de reconhecimento aos destaques dos eventos promovidos pela entidade.

Neste ano, o Congresso Nacional da Intercom irá se reunir em Fortaleza, capital do Ceará. E o tema central do debate serão os Esportes na Idade Mídia e a relação deles com a diversão, a informação e a educação. Algo que enche de entusiasmo Márcio de Oliveira Guerra.

Formado em Comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), doutor em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde também cursou seu mestrado em Comunicação e Cultura, Guerra é ainda especialista em Marketing pela Fundação Educacional Machado Sobrinho.

“A escolha do esporte como tema do congresso nacional é um avanço que talvez as pessoas não tenham a dimensão. Sempre discriminado pela intelectualidade, o fato de a academia se render ao tema representa muito para a pesquisa do esporte e suas interfaces, especialmente com a comunicação”, avalia Guerra.

Ao longo de sua carreira, ele trabalhou como repórter no Jornal dos Sports (RJ), TV Globo (Juiz de Fora) e foi editor de esportes no jornal Tribuna de Minas (Juiz de Fora). Chefiou por mais de 15 anos a equipe de esportes da Rádio Solar AM (Juiz de Fora) e a equipe de esportes da Rádio Nova Cidade (Juiz de Fora).

No ambiente acadêmico, mantém-se ativo como docente das disciplinas Técnica de Produção em Rádio: Cerimonial e Organização de Eventos e Jornalismo Esportivo. Além disso, é professor da especialização do curso Comunicação Empresarial e do curso de Televisão, Rádio e Mídias Digitais da Facom/UFJF.

Guerra também é colaborador da Universidade do Futebol, onde aparece como coordenador doNúcleo de Pesquisa em Comunicação, Esporte e Cultura (NUPESCEC), ligado à própria UFJF. O objetivo: estudos interdisciplinares que envolvem a comunicação e o esporte, nas mais diversas áreas do conhecimento.

Nesta entrevista, o jornalista discorre sobre a busca de analisar o esporte, especialmente o futebol, sob diversos tipos de abordagens mais profundas, o quão impressionado ficou com o Football Manager, jogo virtual disputado por seus alunos, e a importância do rádio no imaginário do torcedor do futebol, mote de um livro publicado.


Mapa da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde atua o NUPESCEC, coordenado por Guerra

 

Universidade do Futebol – De que forma os jornalistas que não foram atletas fazem para compensar a falta de conhecimento prático? Qual é a importância da teoria e da prática para a capacitação profissional do jornalista esportivo?

Márcio de Oliveira Guerra – A grande diferença não está na prática. Entendo que uma pessoa não precisa necessariamente ter praticado um esporte para compreendê-lo, divulgá-lo e analisá-lo. Acho que o ex-atleta seria uma boa fonte, uma pessoa que poderia, com sua experiência, esclarecer ao jornalista alguma nuance que acontece na prática que possa passar despercebida por quem não praticou o esporte.

A grande vantagem de quem tem a formação jornalística é a noção da ética, do respeito, da responsabilidade com a informação.

Universidade do Futebol – A presença de ex-atletas ancorando programas esportivos de rádio e TV, ou produzindo colunas em jornais e internet, mostra-se cada vez maior. Como você avalia essa situação? É importante uma regulamentação da profissão?

Márcio de Oliveira Guerra – Essa crescente participação veio motivada pelo equívoco da decisão daquela juíza maluca que tentou acabar com o diploma. Abriu um espaço para essas pessoas entrarem ou terem sua situação regulamentada. Mas acho que essas participações, com algumas boas exceções, como Tostão, acabam mostrando a falta de preparo dessa gente. Tem coisas lamentáveis, como Neto, Júnior, Edmundo, Tande e Cia.

 



 

Universidade do Futebol – Em sua avaliação, há espaço e necessidade de o Jornalismo Esportivo tornar-se uma disciplina obrigatória dentro do curso de graduação em Jornalismo?

Márcio de Oliveira Guerra – Não sei se obrigatória. Aqui na Faculdade de Comunicação da UFJF ela é opcional, entra em carga semestre sim, semestre não, e tem grande procura. Acho que deve continuar assim: faz quem tem interesse em aprofundar um pouco na área, porque, afinal, é jornalismo como qualquer outra editoria.

Universidade do Futebol – A cobertura jornalística esportiva tem um formato predefinido, seja no rádio, TV ou internet, e geralmente temas mais complexos não são abordados no dia a dia. É possível quebrar esse paradigma para que o grande público tenha acesso a uma informação mais analítica e qualificada, ampliando, dessa forma, a cobertura tradicional?

Márcio de Oliveira Guerra – Essa é minha principal crítica ao jornalismo esportivo no momento. Está muito superficial. Agora mesmo, aqui na minha cidade, o time de vôlei que disputa da Liga Nacional, afastou quatro jogadores por questões disciplinares. O principal jornal da cidade divulgou que o “torcedor foi surpreendido pela barração de quatro titulares por questões disciplinares”. Não disse o que aconteceu, com quem aconteceu e vida que segue.

No dia seguinte, a matéria continua fazendo menção ao fato de os quatro terem participado de uma discussão. Mas não conta com quem, por que, como e o grau de importância disso.

Na edição mais recente falou-se que o destino dos quatro seria definido pela comissão técnica. Mas, nós, leitores, continuamos sem saber o que aconteceu. E isso é um exemplo que se repete todos os dias.

O jornalismo esportivo passou a ser muito de incentivo, de “não me comprometa”. Isso é péssimo.


Guerra condena o jornalismo "descompromissado" e a falta de investigação; Copa-14 e Jogos-16 deverão criar novos tipos de interações midiáticas

 

Universidade do Futebol – Como você vê a produção cultural especializada sobre futebol, seja em relação à literatura de contos e romances, livros técnicos, filmes, documentários e peças de teatro?

Márcio de Oliveira Guerra – Acho que a produção cultural tem sido muito boa. Tem crescido muito a produção e a pesquisa, também. O nosso núcleo na Intercom tem se desenvolvido em quantidade e qualidade.

Além do terceiro livro que vamos lançar agora, o número de trabalhos aumentou nos últimos encontros nacionais, e a qualidade no último encontro, em Recife, foi considerada excelente.

A escolha do esporte como tema do Congresso Nacional é um avanço que talvez as pessoas não tenham a dimensão. Sempre discriminado pela intelectualidade, o fato de a academia se render ao tema representa muito para a pesquisa do esporte e suas interfaces, especialmente com a comunicação.

Universidade do Futebol – Na Universidade do Futebol, no grupo NUPESCEC, você assinou um artigo que discute o jogo Football Manager e como o virtual imita e se relaciona com o futebol real. Que observações sobre aquela plataforma mais chamaram a sua atenção?

Márcio de Oliveira Guerra – O que mais me chamou a atenção foi a mistura do real com o jogo. Uma loucura. Até hoje continuo assustado quando vejo discussões em que os meus alunos citam determinado jogador como futuro craque por conta do Football Manager.

E dizem que as versões mais atuais do jogo estão mais sofisticadas, inclusive na questão da relação do “treinador virtual” com a mídia.

Quanto ao jogo em questão, o que também despertou a minha curiosidade sobre o tema foram os comentários atravessados que ouvia de alguns alunos – eles falavam que o desempenho de alguns times e jogadores não conferia com o que eu tinha de informação. Foi aí que descobri que eles se referiam ao Football Manager como se fosse o ambiente real. E eram relatos com a mesma intensidade e com a mesma paixão.

Ao pedir que me apresentassem o jogo virtual, fiquei assustado com essa mistura do real com o virtual, especialmente no que se refere à entrevista coletiva [simulada na plataforma]. No campo da comunicação, ainda há inúmeras possibilidades de investigação.

Identifiquei a possibilidade de um media trainning para profissionais e jogadores; como podem ser manipuladas as informações sobre este ou aquele jogador; mas vi também boas perspectivas em termos de aplicação desta tecnologia para o futebol real, como a parte organizacional. Enfim, tem muita coisa.


Football Manager: quando o virtual imita e se relaciona com o futebol real

 

Universidade do Futebol – Você acredita que a utilização de dados reais no jogo virtual cria possibilidades de hipotéticas negociações que utilizem o virtual em favor de vários interesses pessoais no “mundo real”? Qual é o limiar ético deste jogo?

Márcio de Oliveira Guerra – Essa é uma questão que já sinalizo no meu artigo. Acredito que já esteja consolidado um jogo muito forte de interesses econômicos por trás deste “jogo virtual”. Afinal, se ele tem a repercussão e o impacto que percebi, imagino que empresários, dirigentes e atletas já estejam bem atentos a isso.

O limite ético é o da verdade e da responsabilidade de quem lida com os dois mundos. É muito difícil delimitar, mas acho que conduta ética não tem muito que variar. É uma só.



 

Universidade do Futebol – A televisão muitas vezes tenta criar um espetáculo que não existe, com o fechamento de câmeras num bloco mais cheio de torcedores, e com microfones direcionais que captam o áudio nesses locais, dando-se a impressão de que o estádio está cheio. O Sócrates costumava dizer que o futebol iria acabar se as pessoas achassem que o jogo era aquele da TV. Corre-se o risco de, daqui um tempo, as próximas gerações perceberem o futebol apenas como aquilo que se passa nas mídias comunicacionais?

Márcio de Oliveira Guerra – Acho que é um risco, sim, mas não por conta da televisão apenas. Veja bem, quando o clube instituiu a questão do sócio-torcedor, foi muito legal. Uma forma de assegurar uma receita. Só que, você, que não é sócio-torcedor ou que gostaria de ver um jogo de outro time, que não o seu, está afastado. Não consegue comprar ingressos. Sem falar em cambistas, torcidas organizadas e outras coisas.

O torcedor está sendo convidado, por outro lado, a não ir mais ao estádio. A partir do momento em que se habitua a ficar em casa, fica acomodado.

Universidade do Futebol – Em outro de seus textos publicados na Universidade do Futebol, é traçada uma análise da relação entre o futebol e a música, princípio de uma pesquisa cuja ideia era a de percorrer estes caminhos em suas origens e fixar o olhar nos hinos dos clubes nacionais. Trata-se de um campo muito vasto a ser explorado? Quais são os próximos passos?

Márcio de Oliveira Guerra – Estamos finalizando a pesquisa dos hinos dos clubes. O pessoal que está junto comigo na pesquisa começou já a análise dos hinos e a produção dos textos que servirão como primeira edição do que encontramos na pesquisa. Depois, partiremos para as músicas feitas para a seleção brasileira.

Sobre a obra, ainda não definimos os capítulos. Posso te dizer que serão quatro angulações e possíveis quatro obras: a primeira sobre os hinos dos clubes, suas curiosidades, aspectos históricos, etc. A segunda, de músicas feitas para a seleção brasileira. Depois, músicas inspiradas em jogadores e, finalmente, com o futebol e o esporte em geral como tema musical. Acho que vai ser legal.


Grupo do NUPESCEC em visita ao Museu do Futebol: integração, sociabilização e novas reflexões e produções

 

Universidade do Futebol – Você também é autor do livro “Você ouvinte é a nossa meta - A importância do rádio no imaginário do torcedor de futebol”. Como surgiu essa ideia e o desenvolvimento da obra?

Márcio de Oliveira Guerra – Sempre me interessei muito pelo rádio, especialmente a cobertura das transmissões. A partir do momento em que passei a estudar a comunicação, me chamou a atenção que, mesmo depois da TV e toda a sua sofisticação tecnológica, o hábito de ouvir o jogo pelo rádio permanecia e permanece.

Qual a razão disso foi objeto da minha dissertação de mestrado, que gerou o livro. Mais tarde, no doutorado, estudei a narrativa do rádio versus a da TV e comprovei tudo aquilo que queria.

Acho que o rádio é emoção e que a TV, com raras exceções, continua sem ter uma linguagem narrativa própria para descrever o futebol.


"Mesmo depois da TV e toda a sua sofisticação tecnológica, o hábito de ouvir o jogo pelo rádio permanecia e permanece"

 

Universidade do Futebol – Qual a sua avaliação sobre o papel da imprensa esportiva na cobertura dos temas relacionados à Copa-2014 no que se refere a uma análise mais crítica e investigativa?

Márcio de Oliveira Guerra – Acho que os dois megaeventos esportivos que teremos precisam deixar um legado para o jornalismo esportivo. Esse é o tema do meu próximo artigo. Precisamos buscar novas possibilidades, novas alternativas de interatividade e de especificidades dentro dos diversos meios. É esse o principal ganho que espero para a mídia.

Mas a realização dos dois eventos já nos enche de motivação. Sem falar a Intercom deste ano, em Fortaleza, que terá como tema o esporte. O que mostra que a academia se abriu para esta área.

Tags: comunicação, jornalismo esportivo, rádio, Locução, narração, cultura, Tecnologia,sociabilização, história

 

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