JUCA KFOURI
Leitores FC
Sua excelência, o leitor, deve ser o único patrão do jornalista. Patrão, não poltrão
APRENDI, AOS 20 ANOS, quando comecei minha carreira na editora Abril, que nem os governos nem os anunciantes podem mandar no jornalismo. Que os únicos patrões dos jornalistas são os leitores. Os únicos e quantos mais, melhor.
Aprendi, também na editora Abril, aos 45 anos, que não era bem assim e, grato por tudo que aprendi, de lá sai. E estou por aqui. E por aí.
Procurando exercer o ofício sem agredir a verdade factual, embora muita vezes com a indignação de quem não se conforma com a mentira deliberada e com a covardia.
Daí ficar feliz, apesar de com gosto amargo, quando apanho de corintianos, como eu, de palmeirenses, são-paulinos e santistas, para me limitar aos torcedores de São Paulo.
É como diz aquela jornalista israelense que sua maior gratificação está em ser criticada por árabes e judeus.
Esta semana, neste aspecto, foi novamente rica.
Apesar de aqui já ter escrito inúmeras vezes que Lula foi o melhor presidente da história do... Corinthians e que discordo, para irritação dos fiéis que acham ser mera busca de parecer imparcial, do emprego de dinheiro público no estádio alvinegro, qualquer observação crítica que faça aos outros clubes desperta a cobrança exatamente sobre tais temas -porque a paixão clubística de leitores tão emocionais anda junto com a leitura seletiva, que obnubila a memória.
Então, critico o Palmeiras porque meu time é freguês, o Santos por causa do trauma que Pelé deixou e o São Paulo, aqui tratado sempre como clube mais vitorioso do país, por mera inveja.
Torcedores de outros Estados imputam críticas sempre ao bairrismo e qualquer referência aos portugueses é vista como preconceito, mesmo que seja filho de mãe carioca, considere o Rio a única cidade especial do Brasil, para contrariedade dos paulistanos como eu, e seja neto de avó lusitana, de Trás-os-Montes.
Se escrevo que José Serra ajudou no patrocínio da Fiat ao Palmeiras é porque sou petista de carteirinha. Se denuncio os malfeitos de Aécio Neves é porque sou serrista e se acho que Lula ultrapassou os limites republicanos em seu corintianismo é porque sou um tucano de bico grande, mesmo que não seja nem uma coisa, nem outra e nem outra.
Ao contrário do que se dá nas redes sociais, no leitorado do jornal o fenômeno não parece ter a ver com a praga do analfabetismo funcional, fruto de nosso pobre sistema educacional. Trata-se, sim, desta triste moda de tratar a política como um Fla-Flu e o futebol como um jogo entre inimigos, não só entre rivais.
Tudo isso para finalizar pedindo que não se veja aqui um desabafo, mas uma constatação.
Que não atrapalha a convicção de ter escolhido a profissão certa e de, 43 anos depois, seguir exercendo-a com imensa satisfação.
Doa a quem doer.
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Benê Lima