Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quarta-feira, março 24, 2010

O retrato de um professor de futebol ainda jovem: ou o relato de uma experiência com iniciação no futebol
É possível pensar e desenvolver um projeto audacioso frente a um processo tão viciado, obsoleto, gerido muitas vezes por leigos, apaixonados pelo futebol

Alcides Scaglia

Ao parodiar o título de uma das obras do premiado escritor irlandês James Joyce (autor de "Ulisses"), procurarei mostrar principalmente aos ainda alunos do curso de Educação Física, que é possível pensar e desenvolver um projeto que seja audacioso e traga boas novas, novos ares a um processo tão viciado, obsoleto, gerido muitas vezes por leigos, apaixonados pelo futebol.

Em crônica anterior abordei os princípios e os pressupostos de um projeto de futebol que desenvolvia em 1995 (no meu último ano de faculdade). Este era desenvolvido pelo laboratório de Motricidade Humana da Unicamp e também em um clube de associados na cidade de Rio Claro, sendo originalmente publicado no livro Pedagogia do esporte, organizado pela professora Vilma Nista Picollo, e editado pela Papirus.

Hoje, neste texto abordarei o universo da aula, ou seja, como construir uma estrutura de aula, a qual permita o desenvolvimento e a assunção de outros diferenciados objetivos.

“Logo, para o desenvolvimento das aulas os professores devem ter à disposição, bolas de diferentes pesos e tamanhos, bolas de borracha, arcos, cones, cordas, e também alguns materiais que podem ser confeccionados pelos próprios alunos, como: bolas de meia de vários tamanhos, alvos de latas, cones com garrafas plásticas de refrigerantes descartáveis, entre outros que podem surgir da criatividade dos professores e alunos.

Adentrando-se no seu universo nota-se que este se dividi em cinco partes:

I. Conversa inicial;

II. Exploração do tema, por meio de pequenos jogos;

III. Exploração do tema utilizando um jogo-adaptado;

IV. Síntese do tema, com um grande jogo formal;

V. Conversa final.

A aula sempre começa e termina com uma conversa, onde, no começo, estimula-se o aluno a recordar o tema e as atividades da aula anterior, para depois explicar o tema da aula atual, possibilitando que o aluno perceba, buscando uma conscientização da seqüência de seu aprendizado. A conversa final gira em torno de acontecimentos da aula, desenvolvimento das brincadeiras e possíveis problemas que possam ter surgido no transcorrer da mesma, como, por exemplo, uma briga, uma falta, etc... Mas nada impede que no meio da aula, frente a um problema ou dúvida, o professor reúna os alunos para maiores explicações.

A exploração do tema por meio de pequenos jogos é o momento em que o aluno tem a oportunidade de descoberta, de criação, em cima da temática da aula, ou seja, através de uma brincadeira adaptada, a criança usa de seu repertório de possibilidades para aprender, desenvolver, criar, descobrir um novo possível que será utilizado na prática do futebol. Por exemplo, a brincadeira de “mãe da rua”, realizada com a bola nos pés, estará permitindo que o aluno desenvolva, dentre outras habilidades, uma específica e com ênfase, a condução de bola.

Já a exploração do tema através do jogo adaptado, nada mais é do que se criar condições dentro de um médio ou grande jogo, que possibilite a execução das habilidades do futebol, em especial a do tema da aula, de forma mais próxima à exigida numa situação real de jogo.

Para ilustrar, por exemplo, mantendo como tema de aula a condução. Para desenvolvê-lo trabalhamos com um jogo de marcação individual, onde é determinado que um aluno só poderá desarmar, tirar a bola de um único outro aluno; com isso, estamos criando possibilidades dentro do jogo para o aluno conduzir mais a bola numa situação real. Muitas vezes o marcador pode estar desatento, ou encontrar-se distante, o que permite que o aluno conduza a bola para mais perto do objetivo concreto do jogo, o gol.

Por meio desta ilustração, temos uma situação criada para estimular a utilização de um fundamento específico, sem descaracterizar o jogo e o próprio fundamento em jogo no jogo, ou seja, o tema da aula está sendo trabalhado numa visão de todo, e não fragmentando suas partes para o aprimoramento técnico, descontextualizado até da motivação dos praticantes.

Já o jogo formal é o momento onde o aluno se utiliza de tudo o que foi aprendido na aula, somado ao seu conhecimento já assimilado e o aplica numa situação formal de prática do jogo de futebol. Portanto, constitui-se numa situação de síntese do tema e por conseqüência avaliação da aula. É em mais esta situação de jogo que a criança extravasa as suas vontades, liberta suas fantasias, seus inocentes desejos..., e demonstra, por meio da solução dos problemas impostos pelo jogo, a assimilação do que foi proposto.

Como se pode notar, todo o desenvolvimento da aula gira em torno de temas, que são determinados segundo uma sistematização prévia dos conteúdos do futebol, adequada para os diferentes grupos etários”.

Na próxima semana quero apresentar mais detalhes desta experiência.

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Benê Lima