Autor: Rodrigo Leitão
Universidade do Futebol
Quem você contrataria, caso quisesse construir um imóvel; um qualificado engenheiro formado por renomada universidade, ou um também engenheiro formado em desconhecida instituição de ensino com duvidosa qualificação?
Quem você contrataria, caso quisesse construir um imóvel; um qualificado engenheiro formado por renomada universidade, ou um também engenheiro formado em desconhecida instituição de ensino com duvidosa qualificação?
Quem você apontaria ser mais qualificado para assumir as terapias de um grupo de pacientes de uma conceituada clínica; um psicanalista com doutorado na área, ou um ex-paciente que por dez anos fez terapia e se sente suficientemente capacitado sobre o assunto?
A obviedade das respostas nem precisaria ser discutida se, ao pararmos para refletir, transferíssemos as perguntas para um contexto mais passional; o futebol.
A obviedade das respostas nem precisaria ser discutida se, ao pararmos para refletir, transferíssemos as perguntas para um contexto mais passional; o futebol.
Esqueçamos os engenheiros, esqueçamos os psicanalistas. Vejamos a pergunta na perspectiva de atuação profissional de um outro sujeito.
Então eu perguntaria: quem você contrataria para ser treinador de futebol de sua equipe, caso tivesse esse poder e atribuição; um profundo conhecedor sobre assuntos que envolvem as táticas, estratégias, sistemas de jogo, fisiologia, treinamento desportivo, nutrição, psicologia, filosofia, etc e tal, ou um ex-jogador de futebol, com grande experiência por ter jogado em grandes equipes, perfil carismático e com grande identificação com a história do clube?
Não é difícil nos convencermos que essa questão já não é tão simples e óbvia quanto aquelas do início do texto.
O futebol, sob a perspectiva técnico-tática evoluiu muito ao longo dos anos. O ritmo de jogo, as movimentações, as jogadas de bola parada, a compreensão do jogador sobre o jogo, os esquemas de jogo, os sistemas, as plataformas... Muitas coisas foram mudando. Funções e novas atribuições surgiram e as exigências a jogadores, equipes e comissões técnicas aumentaram exponencialmente.
E se as coisas mudaram para a preparação do jogo em si dentro de campo, também mudaram as necessidades e os níveis de conhecimentos exigidos do profissional que aparece na linha de frente das equipes (o treinador).
Tradicionalmente admite-se que ex-jogadores de futebol são os "profissionais" mais bem preparados para assumir a função porque têm "experiência no assunto" e portanto os conhecimentos necessários para o trabalho.
O maior equívoco nessa linha de pensamento é que ter experiência como jogador de futebol não garante experiência (nem conhecimento) como treinador de futebol (assim como um sujeito submetido a dez anos de psicoterapia [com grande experiência como paciente] não tem experiência [nem conhecimento] que lhe garanta a atuação como psicoterapeuta).
Então a melhor solução seria alguém com conhecimentos variados, capaz de aplicá-los na prática, no dia-a-dia de treinamentos e jogos?
Então a melhor solução seria alguém com conhecimentos variados, capaz de aplicá-los na prática, no dia-a-dia de treinamentos e jogos?
Ainda que a resposta pareça apontar nessa direção, antes de mais nada, o mais importante é compreender que ter sido jogador de futebol não é condição "sine qua non" para exercer bem a função de treinador.
Há no entanto de se destacar que ainda sim, algumas experiências relativas ao ambiente do futebol podem gerar conhecimentos interessantes para a atuação profissional de um treinador. Então eu diria que a condição obrigatória, para um treinador profissional de futebol, é a sua capacidade transdisciplinar para atuação em seu trabalho.
Isso significa que o treinador de futebol precisa não só ser capaz de dialogar com as várias áreas profissionais que o cercam (o que já é um grande avanço no perfil de um treinador). É necessário (e ousaria dizer, condição "sine qua non") para atuar no futebol moderno, que o treinador conheça bem, e muito, de diversas coisas que cercam a complexidade desse desporto e que, ao mesmo tempo, seja altamente especializado em questões inerentes a especificidade de sua função.
Em outras palavras, os treinadores precisam conhecer de psicologia do esporte, fisiologia, bioquímica, nutrição esportiva, filosofia, pedagogia, informática, sociologia, administração, gerenciamento de pessoas, treinamento desportivo, idiomas, (dentre outros), e especialistas em táticas, estratégias, princípios operacionais do jogo, sistemas de jogo, scout, plataformas de jogo, regras, etc.
E se historicamente no Brasil os números apontam para o contrário, e salientam que grande parte dos treinadores que obtiveram sucesso foram aqueles que também jogaram futebol eu diria que isso é fato óbvio e esperado, porque são eles, os ex-jogadores, aqueles que oportunamente tem maiores chances de exercer a função. Então, em um "universo" consumido pelos ex-jogadores é claro que teremos como vitoriosos os próprios (os ex-jogadores). Certamente aqueles que se dedicaram mais em buscar novos conhecimentos venceram mais. Certamente aqueles que intuitivamente tomaram as melhores decisões em dados momentos tiveram mais sucesso.
Mas por quê não, abrir as portas desse "universo" para a possibilidade de que aqueles que investiram na transdisciplinaridade (ou mesmo na multidisciplinaridade) possam mostrar serviço e colaborar para conquistas e evoluções mais aceleradas do nosso bom e "tradicional" futebol? (mesmo que não tenham sido jogadores profissionais).
E para aqueles que acreditam que esse tipo de discussão é dispensável (afinal sem pensar em todas essas coisas ganhamos tudo que ganhamos - somos pentacampeões) eu diria simples e pontualmente: se fomos campeões mesmo assim, imagine quanto mais teríamos ganhado se as coisas fossem diferentes. E se não queremos deixar isso no campo da imaginação eu desafio: abram as portas do universo e esperem para ver!...
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Benê Lima