Este texto não vai discutir imparcialidade, bairrismo ou quem estava certo ou errado na “polêmica” entre Vagner Mancini e um jornalista. Sempre há dois lados de uma mesma moeda e melhorias profissionais, em todos os setores, são sempre fundamentais. Deixamos os julgamentos para depois. O foco será outro - algo que fala diretamente do jogo, da nossa visão de ver futebol e de algumas consequências dela.
O Vitória teve 35% de posse de bola e 5 finalizações contra 65% de posse e 14 finalizações do Corinthians.
O Vitória teve 35% de posse de bola e 5 finalizações contra 65% de posse e 14 finalizações do Corinthians. É natural, que na visão brasileira do jogo, pensemos que o Vitória jogou “por uma bola” e o Corinthians deu “azar” de não fazer os gols. Somos programados, desde pequenos, a enxergar o time que tem a bola como o corajoso e superior, o “time grande”. Jogar sem ela é vista como coisa de “time pequeno”, ou covardia praticada por uma grande equipe.
A relação entre superioridade e bola é natural, mas a posse é apenas um indicativo. Não diz sobre o que foi o jogo, a estratégia das duas equipes, o desenrolar de uma partida e seus movimentos coletivos. A fixação pela posse de bola como indicativo de superioridade começa nos intensos elogios na TV e nas comparações efusivas do Barcelona de Guardiola com o Brasil de 1982. Pronto: criou-se o mito de que aquele time era o espelho da superioridade e do futebol máximo de Telê naquela copa.
Pouco se fala sobre o jogo que a Itália fez, não permitindo que o jogo brasileiro fluísse. Ou as duas linhas de 4 e a pressão que o Vitória colocava no Corinthians, sempre protegendo a grande área. No país do futebol de rua e da técnica, não fomos ensinados que existe um outro tipo de jogo: o da inteligência na ocupação de espaços. Existem outros valores nessa escolha: a inteligência, os movimentos de pressão e recomposição, a sincronia...e também o jogo com a bola, afinal, um time só se faz vencedor marcando gols.
Não faz mais sentido expor a superioridade ou inferioridade de uma equipe por meio da posse de bola.
Não faz mais sentido expor a superioridade ou inferioridade de uma equipe por meio da posse de bola. Afinal, essa posse de bola se deu onde? Na defesa, entre os zagueiros, ou no terço final do campo, perto do gol? Houve quantas chances claras de gol? O que é mais proveitoso: uma equipe que sempre toca para trás ou aquela que sabe acelerar e cadenciar?
Já não faz mais sentido ver o jogo pela ótica da posse de bola, como passou da hora de atender o pedido de Mancini: é preciso reconhecer o outro lado, nem que esse seja o lado que não tem a posse ou que não jogou como o imaginário não concebe. Já percebeu que as derrotas da Seleção Copas do Mundo são sempre explicadas por algo que não envolve reconhecer o mérito adversário? “O time entrou pilhado”, “faltou coragem”, “o técnico escalou errado”...e por aí vai.
No fim, futebol é um jogo de escolhas: um time escolhe jogar de uma forma, outro time escolhe uma forma para neutralizar o adversário.
No fim, futebol é um jogo de escolhas: um time escolhe jogar de uma forma, outro time escolhe uma forma para neutralizar o adversário. A lógica da grandeza ou da qualidade técnica pode – e é superada pela organização, assim como a posse de bola é uma porcentagem que diz pouco sobre as nuances e complexidades de uma partida.
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Benê Lima