Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

quinta-feira, setembro 03, 2009

O confronto de normas (Artigo 59 do Código Civil versus artigo 217, I, da Constituição Federal)
A autonomia dada pela CF/88 aos clubes condiz com a realidade e às peculiaridades destas formas associativas. Cabe a elas decidir sua forma de funcionamento
Carlos Eduardo Licks Flores
O Código Civil de 2002, em seu artigo 59, alargou aos associados a competência, para através de assembléia geral, decidir alguns aspectos como eleição dos administradores (inciso I), destituição dos administradores (inciso II), aprovação de contas (inciso III) e alteração do estatuto (inciso IV). Em seu parágrafo único exige-se, para os casos dos incisos II e IV, o voto de 2/3 dos presentes na assembléia específica, exigindo ainda a maioria absoluta dos associados na primeira convocação, ou nas convocações seguintes, não menos de 1/3.

O artigo 53 do CC conceitua as associações como a união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.

Como sabemos, de maneira geral, os clubes de futebol enquadram-se na categoria de associação, em que pese as alegações, que abrem outra discussão, de que os clubes buscam fins econômicos. Entretanto, o artigo 59 do CC não se aplica aos clubes de futebol, porquanto vai de encontro com o preceito constitucional do artigo 217, I que diz: “É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados: I –a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento”.

Não há incostitucionalidade no artigo 59 do CC, porém não há aplicabilidade para os clubes de futebol, alguns com mais de 20.000 associados, ou ainda, com mais de 100.000 associados, caso do S.C. Internacional.

Não há dúvida que o quorum exigido nas deliberações especificadas no parágrafo único do referido artigo civilista tornar-se-ia inviável. Cabe, sim, ao conselho deliberativo tais deliberações.

Na verdade, não existe exatamente um conflito de normas, porquanto hierarquicamente a Constituição Federal de 1988 é superior ao Código Cível, o que deve ocorrer não somente no caso ora tratado, é uma análise constitucionalizada das normas jurídicas. Não há porque ficarmos “pescando inconstitucionalidades”, se vermos a norma à luz de nossa lei maior.

A autonomia dada pela CF/88 aos clubes condiz com a realidade e às peculiaridades destas formas associativas. Cabe a elas decidir sua forma de funcionamento.

Sem adentrarmos a fundo em novo tema, mas para exemplificar mais um difícil enquadramento do novo Código Civil com a realidade associativa dos clubes de futebol, o mesmo ocorre com o seu artigo 990, referindo que todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais. Ora, no momento em que os clubes, que tiveram a faculdade de se transformar em empresas, assim não o fizeram, ficam sujeitos ao regime de sociedade em comum e, por conseguinte, ao disposto em mais um artigo do código civil.

Mais uma vez inviável e fora do contexto fático este enquadramento. Imaginar que os sócios de um clube de futebol poderão responder solidariamente pelas obrigações de seu time de coração beira o absurdo.

*Carlos Eduardo Licks Flores é especialista em Direito Desportivo e membro do Gedd

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