Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

domingo, setembro 20, 2009

Entrevista em destaque

Luis Filipe Chateaubriand, autor de uma proposta de alteração do calendário do futebol brasileiro (Parte 2)
Na segunda parte da entrevista, abordam-se questões culturais, profissionalização e seleções
Marcelo Iglesias

Na primeira parte dessa entrevista, apresentamos a proposta de alteração e adequação do calendário brasileiro do pesquisador Luis Filipe Chateaubriand. Além disso, ele abordou o formato de organização de cada um dos campeonatos em que os clubes brasileiros participariam e quais seriam as consequências dessas mudanças para a gestão das agremiações.

Professor de Administração na Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, Chateaubriand se debruça sobre a possibilidade de alteração do calendário do futebol brasileiro desde 1999. Autor do livro “Futebol brasileiro: um projeto de calendário”, a proposta apresentada na obra baseia-se na adequação do calendário nacional ao europeu, na definição do Campeonato Brasileiro como competição principal (que seria disputado só aos fins de semana), e na adequação do calendário das seleções para que elas só atuem quando os clubes estiverem de folga.

“Um aspecto que eu enxergo como algo interessante a partir do calendário, se são criadas melhores possibilidades de receita nas diversas fontes possíveis, pode-se resistir mais à condição de vender o “pé-de-obra” para o exterior. Vendendo menos, por conta das maiores receitas provenientes de outros investimentos, pode-se até pensar em segurar os atletas por mais tempo e repatriar jogadores”, afirmou Chateaubriand, na segunda parte da entrevista exclusiva à Universidade do Futebol.

Na segunda parte da conversa, o entrevistado aborda como a mudança de calendário pode contribuir para a profissionalização da gestão dos clubes, de que forma as questões culturais do brasileiro são encaradas nessa proposta de alteração, os meios pelos quais a adequação do calendário nacional pode evitar a transferência precoce dos bons jogadores brasileiros para o exterior e qual é a sua proposta para o calendário de seleções.

Universidade do Futebol – A sua proposta de calendário pode ser um fator estimulante para a tão sonhada profissionalização dos clubes, gerando dividendos, tanto no âmbito nacional como internacional?

Luis Filipe Chateaubriand –
Em Administração, costuma-se dizer que administrar é planejar, organizar, dirigir e controlar, sendo que a função que dá o tom de todo o resto é o planejamento. Sendo assim, se está se organizando um calendário mais adequado em termos de planejamento, se está dando um passo gigantesco. Isso em termos daquilo que cabe à CBF.

Para os clubes também poderia haver um planejamento maior, na medida em que esse novo calendário os ocupa a temporada toda e permite que, durante a pré-temporada, eles joguem com clubes europeus, realizando amistosos e participando dos torneios de verão de lá. Há pouco tempo, o presidente do Flamengo comentou: “Eu não quero jogar contra o Real Potosi, mas sim contra o Real Madrid”.

Isso tudo demonstra que há uma possibilidade de receita que pode ser explorada dependendo da competência de cada um dos clubes. É importante dizer que precisa haver um esforço por parte das próprias agremiações para que as coisas evoluam favoravelmente. Eu gosto de citar o exemplo do Vasco da Gama, que foi deixado em péssima situação pelo seu último presidente. Portanto, não se pode exigir que o clube entre em um patamar empresarial de uma hora para a outra. Isso é um esforço que vai demorar anos.

Um aspecto que eu enxergo como algo interessante a partir do calendário, se são criadas melhores possibilidades de receita nas diversas fontes possíveis, pode-se resistir mais à condição de vender o “pé-de-obra” para o exterior. Vendendo menos, por conta das maiores receitas provenientes de outros investimentos, pode-se até pensar em segurar os atletas por mais tempo e repatriar jogadores.

Existem também alguns princípios da Administração que são importantes para os clubes, os quais, normalmente, não são adotados por essas instituições. Um desses aspectos é a questão da falta do setor de Recursos Humanos dentro dos clubes de futebol. Como vai se pensar em melhorar a estrutura de um clube se não se cuida dos colaboradores, não se pensa um plano de desenvolvimento, critérios de remuneração que gerem motivação atrelados à produtividade.

Outra ideia que cresce na área da Administração é a de que a logística está crescendo bastante. Quando se comenta sobre esse setor, pensa-se muito em empresas industriais. Porém, ele também se faz presente no ramo da informação (documentação, fluxos, operações, reservas em hotéis, etc.) que me parece ser feito de forma muito amadora pelas agremiações, o que gera custos de operação muito maiores.

Além disso, no mundo da Administração versa-se que trabalhos de natureza temporária são cada vez mais importantes, as chamadas gestões de projetos. Eu não conheço nenhum clube de futebol que pense em gestões de projeto.

Portanto, dentro da seara administrativa ainda existe um longo caminho a ser percorrido. Particularmente, defendo a ideia de que clubes devem ser administrados como verdadeiras empresas. Se pudéssemos gerir os clubes não somente por meio de modelos empresariais, mas também, fazendo com que eles tivessem o seu capital aberto, com ações em bolsas de valores, seria bastante interessante. Contudo, isso, talvez, seja sonhar demais para a atual conjuntura do futebol brasileiro, a qual deve ser aperfeiçoada aos poucos. Parece-me que ajustar o calendário é uma questão decisiva para que isso ocorra.


Alguns times brasileiros apostaram na repatriação de jogadores para conseguirem novas fontes de receita

Universidade do Futebol – A volta de alguns jogadores para o Brasil, com destaque para o atacante Ronaldo, indicam que é mais vantajoso investir-se na permanência de atletas no país, ou ainda somos meros formadores de bons atletas para o futebol internacional?

Luis Filipe Chateaubriand – Em se falando de modo real, acredito que, no curto prazo, ainda somos dependentes da venda de atletas para o exterior. Não consigo enxergar nenhuma saída para que os clubes brasileiros se livrem disso.

O que se pode fazer é tentar segurar o atleta por mais tempo, principalmente ao longo da temporada, assim como fez o Belluzzo, presidente do Palmeiras. Foi uma iniciativa bastante interessante, uma vez que jogadores importantes para a manutenção do bom desempenho da equipe foram mantidos no elenco.

Especificamente em relação aos jogadores jovens, aqueles que estão saindo da base e têm talento, acredito que deva haver um esforço para, pelo menos fazer com que eles fiquem por mais tempo atuando no Brasil. Se ao invés de vendê-los com 19, 20 ou 21 anos, pudesse manter esses atletas até por volta dos seus 25 anos seria ótimo para o futebol nacional.

Sem contar que muitos deles são vendidos para mercados pouco expressivos, com quase nenhum destaque, e ficam esquecidos por lá, e acabam voltando para o Brasil rapidamente. Nesses casos, nota-se uma enorme falta de planejamento de carreira. Seria melhor ficar mais tempo em algum clube grande do Brasil, fazer história, criar identificação com a agremiação e, com o nome estabelecido e com algum amadurecimento, vai para um clube de maior porte do exterior.

Isso é uma análise do ponto de vista de quem sai do Brasil. Mas acredito que o desafio é criarem-se receitas cada vez maiores para evitar que os atletas saiam tão cedo.

Sobre a questão dos repatriados, enxergo a ação desses clubes como inteligente. São jogadores que têm qualidade inquestionável e para a indigência técnica do futebol brasileiro, esses atletas podem ser bem mais velhos e estarem acima do peso, que eles irão se destacar, assim como o que aconteceu com o Romário, há pouco tempo. São jogadores diferenciados.

Mais interessante ainda seria tentar trazer esses atletas com uma idade um pouco menor, ainda no auge das suas formas técnicas e físicas. Porém, acredito que isso não acontecerá no curto prazo.

No entanto, é importante atentar-se para a questão de que se deve fazer uma avaliação real daquilo que o jogador repatriado pode trazer para o clube, a fim de que isso não acarrete em prejuízos, já que o investimento para a vinda desses atletas é muito alto, como no caso da contratação do Fred pelo Fluminense.

Já no caso do Ronaldo e do Corinthians foi um investimento que, seja pela qualidade técnica, que é muito maior daquilo que existe no Brasil, seja pelo nome que o jogador tinha no mundo, era uma aposta mais do que certa.

Eu acredito que essa questão da repatriação de atletas é algo que deve ser analisado caso a caso. A vinda do Vagner Love para o Palmeiras me parece uma boa também, pois ele estava “escondido” lá na Rússia.

Outro exemplo é o do Elano quando foi para a Turquia. Antes de ir, ele perguntou para o Dunga se a sua transferência para um país sem expressão no futebol não lhe causaria prejuízos na seleção. E o técnico garantiu que não. Apesar de eu defender que para um jogador ser convocado ele tem de estar atuando em uma liga competitiva.

Universidade do Futebol – A adaptação que você propõe leva em consideração o clima brasileiro e a questão de, em dezembro e janeiro, estarmos em pleno verão, quando o calor é muito intenso, além das festas e das férias de fim de ano? Isso acarretaria em uma mudança cultural?

Luis Filipe Chateaubriand – Acredito que essas variáveis não afetem muito o futebol, isso é superestimado. No modelo de calendário atual, as férias são em dezembro. Diz-se que se houvesse a mudança que eu proponho, os jogadores não poderiam passar as férias com os seus filhos. Isso é relativo, pois até o final da primeira metade de dezembro ainda há aulas nas escolas. Na segunda metade, ocorrem as festas de fim de ano.

Pelo calendário que eu proponho, no momento dessas festas, em dezembro, não haveria jogos – eles seriam paralisados, mantendo o que se tem atualmente.

Para a questão do verão e de se jogar no calor, os jogos poderiam acontecer às 18h, ao invés de às 16h. Isso não esbarraria nos interesses da Rede Globo, pois até para ela acredito que seja mais interessante, uma vez que não precisaria interromper o programa do Faustão para mostrar o jogo e, depois, retornar com a atração da programação. Em termos de ajuste da grade de programação, me parece que é bem mais interessante com o futebol nessa nova proposta.

Outro ponto que colocam é que se deixaria para tirar as férias em junho, no frio do inverno. Em primeiro lugar, a maior parte de junho ainda não é inverno, e sim outono. Além disso, ou o jogador é de um grande clube e tem possibilidades financeiras de viajar nas férias, ou ele é de uma pequena agremiação e ele não terá condições de viajar. Se é o último caso que vale, independe se as férias são em dezembro ou em junho. Se ele tiver dinheiro, existem várias praias e outros locais no mundo para onde ele pode ir aproveitar.

Há sempre que se pensar aquilo que é o melhor para a indústria. Por exemplo, no meu caso, eu vivo da minha carreira de professor universitário. Sendo assim, o perfil dos meus alunos de Administração é de pessoas que trabalham durante o dia e estudam na parte da noite. Portanto, o meu período de trabalho é das 18h30 às 23h, que é quando eu leciono. Isso me traz inconvenientes, mas é a lógica do ramo de atividade em que eu estou. Se quero atuar nessa área, tenho que me adaptar. O mesmo raciocínio vale para o futebol. Se é para gerar mais prosperidade, mais receitas, mais oportunidades que beneficiam os próprios jogadores, é necessário que se faça essa adequação, ainda que existam alguns inconvenientes. Os profissionais devem adaptarem-se àquilo que é melhor para o ramo do futebol como negócio.

Universidade do Futebol – Se tanto os países europeus quanto outros como México, Chile e Argentina adotam o “calendário mundial”, por que, no Brasil, essa adaptação possui tantos entraves?

Luis Filipe Chateaubriand – Um desses obstáculos é que, no Brasil, as pessoas não são nem conservadoras, elas são reacionárias. Se existe um pensamento com boas justificativas para a mudança, é interessante que se mude. Isso foi bom para a humanidade em vários momentos da sua história. Mas aqui não se pensa dessa maneira. Mudança nunca, nem que ela seja boa. Isso é um aspecto cultural, o “vamos deixar como sempre esteve”.

Um segundo ponto é que existem alguns interesses envolvidos, abarcando federações estaduais, pois os campeonatos são no início da temporada e elas podem temer que, com a adequação, o calendário não dará espaço para esse tipo de torneio.

Dizem que, na Rede Globo, haveria pesquisas de mercado afirmando que, pela cultura do brasileiro, ocorreria queda de audiência. Sobre esse aspecto, eu já argumentei que não é real, pois se há perda de um lado, pode-se ganhar do outro, podendo até ser positivo. A emissora mesmo está tendo uma postura excessivamente conservadora.

Entendo que é necessário ousadia. Nós sempre somos os melhores dentro das quatro linhas, mas fora, na gestão e na organização, ainda há muito o que se aprender e progredir.

Nos últimos anos, houve algumas melhorias. Só que foram poucas e pontuais. Uma delas é que se vislumbrarmos o que acontecia no final dos anos 1980, início dos anos 1990, havia a possibilidade de um clube jogar até 100 partidas oficiais em uma temporada. Isso não acontece mais, mas se um time chegar até o fim de todas as competições que disputar, ele pode chegar a perto de 90 jogos, o que ainda é muito.

Outro avanço que se implementou foi o Campeonato Brasileiro por pontos corridos. Só que, mesmo dessa forma, acredito que existem intervenções. Uma são as rodadas às quartas-feiras. Outra é a tabela que permite que um clube tenha quatro mandos de campo seguidos ou jogue quatro vezes consecutivas como visitante.

Por fim, mais uma alteração que defendo e que é polêmica é o acesso e o descenso de cinco clubes ao invés de quatro. Entendo que, dessa maneira, cria-se para uma faixa maior de equipes tanto a possibilidade de rebaixamento quanto de ascensão. Além disso, defendo que os cinco primeiros do Campeonato Brasileiro classifiquem-se para a Libertadores, e não quatro.

Sendo assim, diminui-se a “zona da pasmaceira”, composta por aqueles clubes que, faltando algumas rodadas para o fim do campeonato não têm mais chances de alcançar os que se classificarão para a Libertadores, e nem correm o risco de entrarem na zona de rebaixamento. Aliado a isso, o Brasil é um país enorme, com diversos clubes de tradição, e com o acesso e descenso de cinco equipes por temporada, dá-se mais oportunidades para que todos joguem na elite do futebol nacional.


Jogadores brasileiros vão para o futebol árabe e asiático em busca de melhores salários

Universidade do Futebol – Além da janela de transferência européia, temos a janela para o mercado asiático e do mundo árabe também, que são potenciais compradores e que ficam abertas pós-fechamento da janela européia. Como evitar a saída de nossos jogadores para esses locais? A sua proposta de calendário contempla uma solução para minimizar esse “problema”?

Luis Filipe Chateaubriand – O controle dessas outras janelas de transferência é mais difícil. Mas é importante deixar claro que, quando se estrutura o calendário, não se está preocupado apenas com esses períodos de negociação internacional.

Existe a preocupação de tirar a concorrência das competições entre clubes com a Copa do Mundo, com as Olimpíadas, com a Copa América, com a Copa das Confederações, uma vez que todas essas competições acontecem em junho ou julho. Não havendo jogos de clubes durante esses dois meses, como propõe o calendário que eu descrevi, eliminam-se os conflitos dessa natureza.

Se isso não acontece, ou se jogam as competições entre clubes paralelamente aos torneios entre seleções, o que é ruim, porque um faz concorrência para o outro, ou não se joga quando as seleções atuarem; mas como não há adaptação do calendário, é preciso que se prolongue a temporada, o que pode gerar situações de um time atuar até três vezes na mesma semana, como aconteceu com o Palmeiras no início deste ano, o que é um absurdo.

Realmente, em relação aos árabes e asiáticos, não teria como conseguir uma solução a partir do calendário. Mas o que poderia ser feito é a imposição de maneira soberana dos clubes. Eles poderiam estabelecer que só venderiam seus atletas durante o período da janela de transferência europeia. Fora disso, não.

Para completar, existe o argumento de que a alteração do calendário não valeria de nada, pois há a janela de transferências para a Europa em janeiro também, o que, da mesma maneira como acontece atualmente, interferiria no futebol no meio da temporada. Porém, há algumas diferenças. A janela de janeiro é menor do que a do meio do ano, em termos de duração. Além disso, a janela de meio de ano é muito mais evasiva do que a de janeiro, pois os clubes europeus estão montando os seus elencos durante os meses de junho e julho. Em janeiro, contrata-se um ou outro atleta apenas para ajustar o time.

É importante deixar claro que os atletas continuariam a sair na janela de meio de ano. Mas, os clubes brasileiros não perderiam os seus jogadores no meio da temporada, e sim, antes dela começar, o que possibilitaria que eles realizassem uma reformulação ao longo de toda a temporada e evitaria desmanches no meio dela, o que gera queda do padrão e do interesse no jogo.

Universidade do Futebol – Você coloca a adaptação do calendário brasileiro ao “mundial” como uma “trade off”. Explique

Luis Filipe Chateaubriand – O conceito de trade off é a ideia de se abrir mão de um determinado benefício para se conseguir um benefício maior.

Como professor na área da Administração, eu vejo bastante esse tipo de situação em momentos práticos, particularmente, no que se refere ao setor de logística. Uma empresa industrial não pode produzir a sua capacidade máxima, mas sim trabalhar Just in time. À medida da demanda que ela estima para o mercado, irá encomendar matéria-prima para fazer o seu produto. Só que, se encomenda um pouco por vez, isso obriga o fornecedor a fazer mais entregas, o que faz com que ele tenha mais locomoção, mais gasto de combustível, mais gasto com manutenção de veículos, o que é ruim. Por outro lado, está gerando-se um benefício maior que é atender o cliente no momento em que ele precisa, evitando que se faça produto a mais e o custo disso antecipado. Portanto, tem-se um custo por um lado, só que o benefício é superior. Essa é a ideia de trade off.

Do meu ponto de vista, existem poucos estorvos com essa adequação ao calendário europeu. Só que o benefício é muito maior, na medida em que permite que os clubes planejem-se melhor, que eles alavanquem receitas a partir disso. As grandes agremiações podem fazer excursões à Europa, todos os 700 clubes do Brasil vão fazer, pelo menos, 43 jogos ao longo da temporada.

Perante esses benefícios, os inconvenientes e as dificuldades existem, mas são muito menores do que as possibilidades que se têm. Mesmo porque os estorvos que se pode imaginar são todos perfeitamente administráveis: no verão, ao invés de jogar às 16h, passa-se às 18h, as férias serão no meio do ano, mas compensa-se isso com a possibilidade de maior faturamento, além da questão da televisão, que teria que ser convencida a ajustar a sua grade. São questões culturais.

Do ponto de vista funcional, o único problema com a adaptação é que a temporada começaria em julho e iria até junho do ano seguinte, o que necessitaria de seis meses de adaptação – há um custo, mas que seria pontual e não permanente.


Pela proposta de Chateaubriand, as seleções campeãs do mundo estariam pré-classificadas para as Copas do Mundo

Universidade do Futebol – E em relação ao calendário de seleções, como ocorreriam as competições?

Luis Filipe Chateaubriand – Todo trabalho de seleções seria em junho e em julho. Um aspecto que é normalmente criticado é que quando acaba a temporada europeia, começa a Copa do Mundo, e os jogadores estão muito cansados. Para evitar isso, nas duas primeiras semanas de junho, os jogadores que forem para as seleções estariam de férias. Na segunda metade desse mês e início de julho, eles estariam preparando-se com treinamentos, físicos, técnicos e amistosos. Logo depois começaria a competição, sendo que haveria uma diferente a cada ano.

No primeiro ano após a realização de uma Copa do Mundo haveria as competições continentais, no nosso caso, a Copa América. Nesta, defendo uma fórmula que abarca 12 seleções (as 10 da América do Sul, o México e os EUA). Divide-se em quatro grupos de três, sendo que o melhor de cada grupo se classifica. Os quatro classificados jogam semifinal e final, em um só jogo. Ou seja, são cinco rodadas.

A Copa das Confederações seria no ano seguinte às competições continentais, já no país sede da próxima Copa do Mundo. Ao invés de oito seleções, seriam 16, para aumentar o nível técnico dessa disputa. Participariam os atuais campeão e vice-campeão do mundo, o país sede da próxima Copa, o país sede da Copa anterior, e mais dois por cada continente. Seriam formados quatro grupo com quatro seleções, classificando-se somente os vencedores de cada grupo. Então, realizam-se as semifinais e a final, formando cinco rodadas.

No ano anterior à Copa do Mundo, proponho um calendário que gera bastante polêmica. As Eliminatórias seriam realizadas, mas oito seleções já estariam pré-classificadas para o torneio - esses países seriam o que abrigará a Copa e os sete atuais campeões do mundo.

Por exemplo, se isso fosse ocorrer para a Copa de 2010, na África do Sul, em 2009, seria disputada uma competição denominada “Campeonato da Fifa”, equivalente ao que aconteceu no Uruguai, em 1980, que era o Mundialito de Seleções. Nesse caso, disputado pela África do Sul (sede), Brasil, Argentina, Uruguai, Alemanha, Itália, Inglaterra e França. Os oito países disputariam entre si um campeonato por pontos corridos e o que fizesse mais pontos seria o vencedor. Enquanto isso todas as demais seleções estariam disputando as Eliminatórias tradicionais.

O Mundial da Fifa seria um campeonato extremamente interessante com muito potencial arrecadador, no país em que ocorreria a Copa do Mundo no ano seguinte. Portanto, o país sede abrigaria três competições consecutivas de seleções (Copa das Confederações, Mundial da Fifa e Copa do Mundo).

Apesar de alguns serem contra essa garantia de que algumas seleções já estariam pré-classificadas para a Copa do Mundo, acredito que o Mundial da Fifa seria um torneio muito interessante, sem contar que, para aqueles que pretendem disputar uma Copa do Mundo é bom saber que todos os campeões do mundo estarão presentes.

Por fim, a Copa do Mundo. A única discordância que eu tenho com o que é feito atualmente é que um mês inteiro de competição é exagerado. Seriam 32 seleções em grupos de quatro, só que ao invés de classificar o campeão e o vice de cada grupo, classifica-se só o vencedor. Isso elimina a fase de oitavas-de-final.

No meu projeto, o calendário de seleções é secundário. Não é necessário que se siga exatamente o que eu proponho. Se fosse possível, a cada quatro anos, distribuir-se as competições de seleções para não atrapalhar o calendário dos clubes, já seria um grande serviço para o futebol. Na minha proposta, esses torneios aconteceriam sempre de junho a julho, na folga da temporada regular das agremiações.

Universidade do Futebol – Sendo realista, você acredita que suas ideias serão implementadas no futebol brasileiro em um dado momento? Caso não, esse fato gera uma certa ponta de frustração? Qual o seu sentimento a respeito?

Luis Filipe Chateaubriand – Meu sentimento é muito claro. Eu já fiz livros anteriores a esse e estou fazendo propostas há quase 10 anos. O meu primeiro livro é de 2000. Isso já me gerou muita frustração pelo fato de não ser ouvido. Apesar de que, à época, algumas propostas, ainda residuais, foram aproveitadas. Mas o principal, não.

Eu estou fazendo o meu trabalho da melhor maneira que eu entendo que possa realizá-lo, e se as minhas ideias não forem consideradas, vou continuar levando a minha vida. Eu tenho a minha profissão.

Confesso que eu não escrevi esse livro sobre as alterações no calendário brasileiro meramente por idealismo. Eu também pensei que esse produto seria interessante para que pessoas relacionadas com o futebol tomassem consciência sobre o meu trabalho e me darem oportunidades de divulgá-lo.

Obviamente, se nada daquilo que eu proponho for posto em prática ficará um pouco de frustração. Mas será muito menos uma frustração pessoal do que uma tristeza de ver que o futebol brasileiro tem a possibilidade de trilhar um caminho muito melhor do que está e que se nega a isso.

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Benê Lima