Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

terça-feira, junho 12, 2012

Decodificando o código do talento (o livro)

Acabo de reler “O Código do Talento”, livro que em minha opinião é indispensável para quem quer entender como desenvolvemos nossas habilidades especiais e talentos em praticamente qualquer área, tais como música, literatura, computação ou esporte.

É de certa forma surpreendente que uma obra tão instigante como esta, que aborda questões como genética, sistema nervoso, comportamento, educação e aprendizagem, não seja escrita por algum emérito neurocientista, psicólogo ou pedagogo ligado às grandes universidades produtoras de conhecimento, mas sim por Daniel Coyle, um escritor e jornalista esportivo que reside em uma cidadezinha com menos de 10 mil habitantes no isolado estado americano do Alasca, chamada Homer. Este fato talvez limite alguns aprofundamentos, mas nem por isso deixa de provocar reflexões críticas naqueles que se interessam sobre o assunto.

Para demonstrar que nossas antigas visões sobre talento – enquanto dom divino ou algo essencialmente herdado – devem ser superadas, Daniel Coyle coloca como personagem principal de seus argumentos, a mielina, substância que, com o treinamento adequado, forma camadas envolvendo as fibras nervosas, capaz de acelerar a transmissão dos impulsos nervosos, desenvolvendo e aperfeiçoando nossas habilidades, quaisquer que sejam elas. Procura descrever, assim, uma fisiologia da aprendizagem que dará base para se compreender os processos diferenciados que criam os talentos nos mais diferentes campos de atuação da atividade humana.

Para desvendar os mistérios da aprendizagem o autor estudou intensamente o assunto e, durante quase dois anos, visitou aquilo que ele denominou de fábricas de talento; locais muitas vezes sem muita infraestrutura, mas que produziam grandes jogadores de tênis (em uma pequena academia na Rússia), instrumentistas musicais (em uma escola nada sofisticada de música em Dallas, Estados Unidos), escritores (em um pequeno vilarejo no interior da Inglaterra) ou ainda jogadores de futebol (em quadras de futsal em São Paulo), entre outros modelos descritos ao longo do livro.

O “Código do Talento” alicerça-se em três pilares básicos para tentar decifrar como podemos nos tornar melhores ou bem sucedidos naquilo que fazemos: a) treinamento profundo (práticas especiais), b) ignição (motivação especial) e c) o grande treinador (mestre especial).

Veja abaixo um resumo destes três pilares:

TREINAMENTO PROFUNDO Recebe este nome as práticas que não se limitam apenas às repetições mecânicas de certas habilidades. Para que ocorra um treinamento profundo é preciso um envolvimento íntimo do aprendiz com a habilidade desejada, alimentada por um intenso desafio interno. Contrariando princípios pedagógicos e metodológicos ainda muito adotados, os erros e a forma com lidamos com eles, têm papel estratégico no ato de aprender de forma diferenciada. Neste sentido o autor comenta “para nos tornarmos bons em alguma coisa, ajuda muito estarmos dispostos a falhar e até ficarmos satisfeitos com os erros”. E nos oferece como exemplo clássico a aprendizagem do ato de andar dos bebês que através dos erros e acertos, chega-se a habilidade desejada.

IGNIÇÃOÉ o termo que Daniel Coyle escolheu para resumir a energia, a paixão, o compromisso que o aprendiz precisa ter para tornar o treinamento profundo eficaz, ou seja, para que o treinamento seja realmente profundo. Em outras palavras, ignição representa uma motivação e entusiasmo especiais pela aprendizagem de determinadas habilidades. Esta motivação e este entusiasmo costumam ser contagiantes e são inspirados por padrões, referências ou modelos que criam verdadeiros ambientes de aprendizagem, independentemente de existir ou não uma infraestrutura considerada mais adequada (instalações, equipamentos modernos etc.). O futebol de rua (“pedagogia da rua”), praticado em muitos lugares no Brasil, pode ser considerado um bom exemplo deste ambiente favorável de aprendizagem.

O GRANDE TREINADORÉ o terceiro elemento ou pilar que sedimenta o processo de aprendizagem diferenciada, voltado para o desenvolvimento do talento ou do “fora de série” na prática de determinadas habilidades. O perfil deste treinador, mestre ou professor, entretanto, não se resume – como muitas vezes entende o senso comum – a um profissional que seja um grande líder impositivo, conhecedor das técnicas que se propõe a ensinar ou alguém capaz de executar com precisão a habilidade que ensina. Defende a teoria que acredita que “o papel do professor é ser alguém que facilita a aprendizagem e guia os alunos individualmente ou em pequenos grupos, e não mais aquela figura que se posta diante da turma para comunicar-lhe seu conhecimento e ser o centro das atenções”. Para isso precisa, consciente ou mesmo intuitivamente, conhecer as características, particularidades e nuances do aprendiz e saber como ele pode realizar o treinamento profundo, com disciplina, compromisso, intensidade, entusiasmo e paixão. O autor chega a afirmar que para que estas coisas possam acontecer é necessário estabelecer-se uma relação de amor entre eles. Neste sentido, muitas vezes os considerados “professores medianos” são os que obtêm melhores resultados. E cita: “Estavam (os professores) motivando os alunos, levando-os a dedicar àquela atividade uma energia e uma atenção incomuns, típicas do processo que chamei de ignição, além de mantê-los motivados a esse ponto. Estavam ensinando amor”. Nesta direção dá a entender também que o ato de ensinar é mais arte do que ciência.

No epílogo deste fascinante livro, Daniel Coyle arrisca fazer uma representação esquemática do “código do talento”, como apresentado abaixo:

 

 

Enfim, “O Código do Talento” é um ensaio que recomendo tanto para professores, treinadores, executivos, como para pais que têm dúvidas sobre como conduzir e orientar seus filhos. Sua leitura, com certeza, é um investimento para a vida.

 

Por: João Paulo S. Medina

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