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"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

segunda-feira, junho 04, 2012

A falha exclusiva do serviço público de segurança pública nos eventos esportivos

Toda responsabilidade jurídica tem como pressuposto lógico antecedente o desrespeito a uma norma ou obrigação preexistente
Edio Leitão* / Universidade do Futebol

Polícia é constitucionalmente responsável por dar segurança

Diante da importância que o torcedor representa dentro de um evento esportivo, o Estatuto do Torcedor veio a lume para concretizar sua efetiva proteção.

Com efeito, positivaram-se uma série de disposições visando regular os direitos e deveres do torcedor, com destaque ao Capítulo IV (Segurança do Torcedor Partícipe do Evento Esportivo).

Do conjunto normativo disposto nos artigos 13 a 19 que compõe referido capítulo, denota-se a preocupação do legislador com relação à segurança do torcedor nos locais onde serão realizados as partidas esportivas, sendo que esse direito à segurança deve ser observado tanto antes como após a realização das partidas.

O artigo 19 assevera que as entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de prática desportiva – clube – detentora do mando de jogo e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do disposto do Capítulo IV.

Assim, em caso de dano ao torcedor por falha exclusiva do serviço público de segurança pública realizada pelos agentes públicos de segurança, a responsabilidade poderá recair sobre as entidades responsáveis pela organização da competição e entidades de prática desportiva?

Entendemos que não, pois temos como premissa o fato de que toda responsabilidade jurídica tem como pressuposto lógico antecedente o desrespeito a uma norma ou obrigação preexistente, assim, responsabilização se materializará quando estivermos diante de uma conduta transgressora de um sistema jurídico que reflexamente tenha causado um dano.

Ademais, as disposições legais do Estatuto do Torcedor devem ser interpretadas e aplicadas em conformidade com a Constituição Federal, mesmo porque é no texto constitucional que toda legislação infraconstitucional tem que buscar seu fundamento de validade.

Nesse passo, as entidades responsáveis pela organização da competição, os clubes e respectivos dirigentes, serão responsabilizados quando agirem de forma contrária a um ordenamento jurídico preexistente que regule seus deveres e obrigações, que no caso é o Estatuto do Torcedor, especificamente no que se refere ao dever de segurança dos torcedores.

Agora, em nosso sentir, o serviço público de segurança pública está inserido num sistema jurídico próprio com deveres e responsabilidades sediados na Constituição Federal, não podendo lei infraconstitucional ou sua interpretação alterar a sistemática dessa responsabilização, principalmente quando a Carta Magna atribuiu o dever originário da segurança pública aos órgãos dispostos no artigo 144.

É o texto constitucional o sistema jurídico que imputa com exclusividade ao Poder Público a obrigação de prestar o serviço público de segurança pública e não o Estatuto do Torcedor, razão pela qual, entendemos que no caso de falha exclusiva do serviço público de segurança pública realizado pelo Poder Público em eventos esportivos, a responsabilidade será somente deste, não podendo se estender ao clube ou entidade responsável pela organização da competição e respectivos dirigentes.

Entrementes, o sistema jurídico constitucional quando o assunto é serviço público, nos mostra as seguintes situações: a) serviços que o estado tem a obrigação de promover, mas o Estado não pode ter o monopólio, obrigando-se a outorgar (rádio e TV); b) serviços que o Estado tem obrigação de prestar, mas o particular também pode fazê-lo (saúde e ensino); c) serviços que o Estado tem a obrigação de promover, mas sua prestação será de forma direta ou indireta (concessão de estradas) e, d) serviço que o Estado tem obrigação de prestar, mas vai fazer de forma exclusiva, onde não pode transferir (segurança pública e segurança nacional).

Ora, serviço público de segurança pública é indelegável e deve ser prestado pelo Estado de maneira eficiente, já que é princípio constitucional a ele direcionado, conforme caput do artigo 37 da CF, tanto que seu desrespeito e conseqüente prejuízo causado a terceiros é passível de responsabilização nos moldes do § 6º, artigo 37 da CF.

Logo, a interpretação de uma norma infraconstitucional – Estatuto do Torcedor – que culmine na responsabilização de pessoas físicas e jurídicas de direito privado por falha na prestação de um serviço público dessa natureza é de duvidosa constitucionalidade, pois em nosso sentir estaria por via transversa delegando a responsabilização de um serviço público indelegável.

Este artigo é uma síntese de trabalho publicado na Revista Direito Desportivo & Esportes (Temas Selecionados – Volume III). Organização IDDBA e IMDD. Ed. Omnira


*Edio Hentz Leitão. Pós-Graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Cursando Gestão e Direito Desportivo pela SATeducacional. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo. Advogado.


Fonte: IBDD - 
www.ibdd.com.br


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