Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

domingo, agosto 02, 2009

Ana Tais Cortegoso, consultora de imagem
Trabalho com a imagem do atleta pode resultar em mais e melhores acordos, e influenciar as pessoas
Marcelo Iglesias

Cerca de 50 mil pessoas presenciaram a apresentação do brasileiro Kaká ao Real Madrid. No caso do português Cristiano Ronaldo, o número de espectadores passou para, aproximadamente, 80 mil torcedores. No Brasil, tomadas as devidas proporções, milhares de corintianos foram ao Parque São Jorge receber o atacante Ronaldo, em um dia de semana, no meio da manhã.

A influência que os profissionais do futebol possuem sobre a população é enorme. Por conta disso, muitas empresas estudam as opções e apostam em atletas para a divulgação de suas marcas e produtos. A imagem tornou-se uma das mais importantes moedas do mundo contemporâneo, vide os valores astronômicos que alguns jogadores recebem por acordos comerciais.

“Quando pesquisamos, percebemos que os atletas, em geral, são os maiores influenciadores da sociedade. Dentro dessa gama de profissionais do esporte, o jogador de futebol tem um poder absurdo. Basta falarmos no cabelo do Ronaldo que influencia desde uma criança pequena até um adulto”, comentou Ana Tais Cortegoso, formada em marketing de moda pela Anhembi-Morumbi, consultora de imagem e que participou da construção do trabalho “DNA Consultoria – construção de imagem”, em entrevista exclusiva à Universidade do Futebol.

No seu trabalho, Ana Tais trata da importância do cuidado com a imagem que um jogador de futebol deve ter para que consiga bons contratos com clubes e empresas e para que possa proporcionar mudanças sociais, principalmente em países como o Brasil, em que há forte ligação com a modalidade. O objetivo do projeto é usar essa relação para criar nos atletas e, consequentemente, na população, uma maior conscientização humanitária e cultural, uma vez que o futebol consegue dialogar com todas as gerações ao mesmo tempo.

Além de explicar as conclusões decorrentes do seu projeto, a consultora de imagem falou sobre como pretende levar adiante a ideia de lidar com jogadores de futebol, como isso será importante para a Copa do Mundo de 2014, no Brasil, e quais são os principais entraves sociais para o desenvolvimento de um trabalho como esse.

Universidade do Futebol – Como surgiu a ideia do projeto para trabalhar com a imagem dos atletas? Explique como ele funciona, por favor.

Ana Tais – O projeto surgiu pela importância da influência que a imagem de um atleta tem para o resto da população. Quando iniciamos os estudos, percebemos que essa influência poderia ser utilizada de maneira produtiva para a humanidade, e, principalmente para o brasileiro, que tem o futebol como algo da maior importância.

Devido ao relevante efeito da imagem do jogador de futebol sobre a população, nos perguntamos: O que esses atletas estão passando para as novas gerações? A resposta foi imediata: Que para se ganhar muito dinheiro basta saber jogar futebol. Porém, creio que esse não é o conceito que devemos ter.

Se o próprio jogador de futebol tiver o conhecimento do seu poder de persuasão, ele poderá, além de fazer da sua imagem algo mais duradouro, contribuir para um futuro melhor, para a formação de uma consciência mais humanitária e cultural em toda a população de um país ou do planeta.

Uma figura como um atleta de futebol pode influenciar várias gerações, e isso é um fator muito importante para que as pessoas entendam que é ótimo praticar esportes, mas que a formação de um indivíduo completo possui muitos outros aspectos, que isso não é algo isolado.

Eu já trabalhei com alguns garotos das categorias de base do Santos, e pretendo, em breve, lidar com atletas do São Paulo e do Corinthians, os quais mostraram-se interessados em desenvolver esse tipo de projeto. A ideia é dar o pontapé inicial por meio de palestras, para conhecer a situação do clube, saber quais são os seus objetivos e, a partir daí, trabalhar a imagem dos atletas direcionando o processo para o que foi estabelecido como meta.

Nós damos inicio ao nosso trabalho ouvindo as pessoas que convivem diretamente com os jogadores. Conversamos com o empresário para saber qual é o objetivo do atleta, o que está programado para a sua vida profissional. Além disso, deve conhecer-se o clube para saber qual é a imagem que ele tem e o que ele deseja que o atleta transmita. A consultoria começa exatamente por aí, juntando todos esses aspectos para determinar o que é necessário adequar para cada atleta. Estabelecida a meta, todos dentro do clube trabalham com mais clareza de aonde devem chegar.

Universidade do Futebol – Qual é a real importância da imagem visual de um atleta para o seu sucesso?

Ana Tais – Já é comprovado que o ser humano é um ser estritamente visual nas suas concepções, pois precisa de apenas alguns segundos para se formar um pré-conceito. Às vezes, nem se conversa com a pessoa, mas só de olhar para ela já formamos uma opinião. Isso é, nós somos seres visuais, capazes de imaginar muitas coisas quando olhamos para alguém.

Dizer que não importa a imagem visual é mentira. Faz diferença, sim. Criamos pré-conceitos o tempo todo, e eles podem ser bons ou ruins. O ser humano forma a sua opinião, primeiro visualmente, depois pelo tom de voz da pessoa e depois pelo o que a pessoa faz. Por isso, o ditado “a primeira impressão é a que fica” se aplica muito bem no mundo do futebol moderno.



Universidade do Futebol – Além da imagem visual dos jogadores de futebol, o comportamento deles influencia a sociedade. Como isso é trabalhado?

Ana Tais – Quando falamos em consultoria de imagem, não abordamos apenas a imagem física, porque ninguém é só aquilo que veste. Temos expressões particulares das quais não conseguimos nos desvencilhar. Além disso, nós transmitimos inúmeras mensagens por meio do corpo, há toda uma linguagem corporal, o jeito de falar, de sentar, de ficar em pé etc. Mais do que isso, para a formação da nossa imagem existe a concepção de uma série de valores.

Portanto, para uma imagem ser formada, ela precisa ter a união de tudo isso. Sendo assim, não abordamos apenas o visual. Para que esse visual aconteça de maneira coerente, é preciso que se trabalhe o atleta por dentro também.

É preciso passar cultura geral para o indivíduo, além de trabalhar a sua postura verbal e corporal e outros fatores, a fim de que a imagem consiga transmitir os valores que você deseja.

Por exemplo: existem pessoas que falam uma coisa e agem de outra maneira. Por isso a imagem, principalmente de quem tem poder tão grande de influência, como o jogador de futebol, deve ser coerente. Não basta só falar, é preciso mostrar. Para isso há de se seguir padrões, os quais não são pré-determinados de maneira a mudar o jeito de ser da pessoa, mas sim auxiliá-la a se adaptar.

Às vezes, quando se alerta alguém sobre a maneira como se porta, ele passa a perceber algumas falhas na sua forma de agir. Na maior parte das vezes, as pessoas não conseguem visualizar esses defeitos. Há indivíduos que falam de maneira muito agressiva e não sabem disso.

Portanto, trabalhamos o todo, desde a relação social até a relação empresarial. E com os atletas, especificamente, é preciso saber que a profissão lhes rende muito dinheiro. Por isso, o indivíduo deve preservar a questão financeira também. É necessário que se saiba o que o patrocinador pretende que jogador demonstre.

Sendo assim, são desenvolvidos processos relacionados ao visual do atleta, adequando-o àquilo que o clube espera e ao que os patrocinadores desejam. Mais ainda, ampliamos a cultura geral do jogador, damos apoio psicológico, além de realizarmos consultorias específicas para que ele possa frequentar determinados eventos.

Por fim, procuramos deixar claro para esses atletas que eles são exemplos de vida para a sociedade e que, portanto, é essencial que valorizem a cultura. Para que esse amplo projeto seja desenvolvido, nós possuímos uma vasta gama de parceiros.

Para se ter noção de quanto isso é importante, existem diversos exemplos no futebol de atletas que ganham muitas vezes mais com propaganda do que com a própria modalidade. Só que precisam transmitir a imagem que aquelas empresas querem. Fato semelhante acontece nos clubes.

Universidade do Futebol – Qual é a relevância do seu trabalho de consultoria para a vida social dos jogadores, para a sua correta aparição fora dos gramados?

Ana Tais – Com essa pesquisa que eu fiz, percebi que os dirigentes têm receio de levar um jogador a um evento social, pois não sabem como o atleta irá se portar, se ele vai se vestir adequadamente, se ele vai dizer alguma besteira ou não. A consultoria ajuda nesse sentido também.

Se o jogador vai a um evento social, é importante que ele saiba que evento é esse, quem são as pessoas que estarão por lá, o que ele precisa conhecer para conversar com essas pessoas, para não denegrir a sua imagem, como é comum de se ver.

Além disso, abordamos a questão do jogador que tem que ir para outro país. Ele precisa ir preparado, conhecer a cultura local. Como ele chegará lá? Como ele vai sobreviver ali? Para isso, é necessário que aprenda um pouco sobre o idioma, sobre os costumes, sobre a geografia do lugar. Tudo isso é importante.

Durante as pesquisas, conversando com jogadores, descobri que muitos, depois que acabaram o seu período de fama e de estrelato, não sabiam o que era um voucher ou um check-in.

Portanto, a consultoria cuida para que as pessoas estejam antenadas. Trabalhamos não só com a imagem, no sentido do que o jogador vai transmitir para as outras pessoas, como aquilo que ele pode trazer de bom para si próprio. Como eu disse, o estrelato é muito rápido.

Tive contato com algumas crianças de equipes sub-15 e sub-18 e, em alguns deles, percebi que o sonho é ser igual a um determinado jogador por conta do dinheiro e do carro que ele tem. Poucos jovens têm a consciência de que é preciso estudar, porque há a possibilidade de se chegar a um bom clube, mas que a fama dura pouco tempo.

É importante começar o trabalho quando os jogadores ainda são jovens. Se as crianças tiverem mais força e conhecimento, o estrelado não lhes subirá à cabeça depois.

Universidade do Futebol – É evidente a relevância da imagem do atleta para o seu sucesso. No entanto, há casos em que isso é exagerado (Beckham/ Cristiano Ronaldo). De que maneira deve-se ponderar para que não se extrapole nesse sentido?

Ana Tais – A consultoria visa exatamente isso. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Ela serve para os dois lados, para equilibrar, para se chegar a um meio termo, o qual seria o ideal. Nenhum extremo é bom.

Há de se saber que esse tipo de trabalho serve para adequar a imagem do jogador às suas necessidades, ou àquilo que pretende o seu clube ou o seu patrocinador. Isso porque, às vezes, para o atleta, aparecer demais não é bom. É preciso saber como estar na mídia para que isso seja produtivo.

A maioria das pessoas acredita que, quando se faz uma consultoria, o resultado será a maior aparição do atleta nos meios de comunicação. Isso não é verdade. O trabalho é desenvolvido para equilibrar esses momentos.

Por exemplo, um jogador de futebol pode ter a sua imagem vinculada exageradamente, ou se ela chama muito a atenção para aspectos ruins, é preciso que essa exposição seja moldada.



Universidade do Futebol – O jogador brasileiro, geralmente, vem de condições sociais pouco privilegiadas. Assim que ganha dinheiro, compra bens materiais (carros e casas luxuosas), e poucos investem na formação educacional. Como você enxerga essa situação? Quais são as consequências?

Ana Tais – Essa é uma realidade que me motivou ainda mais a criar a consultoria voltada para os atletas, pois sabemos que muitos meninos, às vezes, vêm de lugares muito pobres, sem instrução alguma. Como ele vai transmitir as coisas que ele não entende? Como ele vai passar algo que ele nem sabe que existe?

O Brasil precisa reaver valores que ficaram perdidos na história. Se não resgatarmos isso de alguma forma, as consequências sociais podem ser muito graves.

A única maneira de se resgatar esses valores é dando uma chance para que as pessoas possam fazer isso em conjunto. Portanto, é importante realizar essa consultoria com jovens jogadores de futebol, pois é a partir daí que será criada a consciência de que é importante ter valores e cultura.

Um dos meninos com os quais conversei falou algo bastante interessante durante a época em que eu estava trabalhando na montagem desse projeto de consultoria. Ele verbalizou que até então não havia tido a oportunidade de aprender, mas que esse era um dos seus maiores desejos. Assim, no dia em que ele fosse um jogador famoso, poderia influenciar crianças a estudarem e a se tornarem pessoas melhores. Isso é algo muito interessante, mas extremamente raro.

A consultoria que pretendo realizar com os atletas é algo novo e de difícil compreensão por parte deles, porque os jogadores já têm uma situação fixa de objetivar só o dinheiro e os bens materiais. A única forma de mudar esse processo é trabalhar com o jogador desde sua iniciação na modalidade. Ele deve aprender e ter cultura para passar adiante e para o seu próprio bem.

Conversei com vários empresários, e todos falaram que precisa haver mais estudo e que os atletas precisam se esforçar mais, mas poucos fazem algo de maneira objetiva para que isso aconteça.

As pessoas costumam falar mal. O clube culpa os empresários e vice-versa, mas todos os envolvidos se prejudicam com isso. É interessante para todos que os atletas evoluam também fora de campo. Os jogadores não sabem que existem mil e um universos a serem explorados. Eles precisam de alguém que os guie.

É preciso que os clubes, empresários e os próprios patrocinadores tenham a consciência de cobrar esse tipo de atitude. Só assim vamos conseguir criar esse hábito dentro de um esporte que foi acostumado a pensar que não é preciso aprender para se ganhar dinheiro.

No entanto, o jogador de futebol tem um poder tão grande que pode ajudar um país inteiro a se construir de maneira mais sólida. Ele consegue falar para todas as gerações ao mesmo tempo, o que é raríssimo. Infelizmente, ele não sabe como exercer e nem que ele possui todo esse poder.



Universidade do Futebol – Atualmente, se apenas jogar bem não é garantia de bons contratos, como as empresas buscam os atletas nos quais investirão?

Ana Tais – Vamos exemplificar: o Romário sempre foi muito comentado por conta do seu bom futebol. Porém, nunca o vi ser manchete por ter sido chamado por uma grande empresa e ter se mantido nessa empresa por muito tempo.

Hoje, as marcas dão cada vez mais valor para as suas imagens. O mundo corporativo e social vive de imagem. O empresário já possui essa consciência e se preocupa muito em como a sua empresa será apresentada ao público.

Basta analisarmos o que aconteceu no escândalo do Ronaldo com os travestis. O episódio atingiu diretamente a empresa para qual ele trabalhava como garoto-propaganda. O jogador não perdeu o contrato, pois ele possuía uma garantia nesse acordo, mas a relação foi abalada. Quanto tempo ele ficou sem fazer propaganda para essa empresa?

Por isso, hoje, os cuidados são ainda maiores, as empresas se preocupam com a imagem e precisam que as pessoas que falam por elas tenham uma conduta positiva. Então, a tendência é o empresário ficar cada vez mais seletivo, por conta de todos os escândalos que aparecem, por conta da falta de profissionalismo que o mercado demonstra.

Portanto, as empresas vão ficando cada vez mais seletivas porque não podem se arriscar. E, com certeza, o atleta que não se adequar às exigências dessas empresas também terá o seu mercado diminuído, já que elas vão pensar duas vezes antes de fazer um contrato com ele.

Cada empresa tem o seu código de conduta, tanto que, quando os atletas assinam contratos de patrocínio, essas normas são anexadas ao acordo. Por isso, que as marcas buscam jogadores que possuam um perfil semelhante ao que é determinado por esse conjunto de preceitos. É importante deixar claro que cada empresa possui o seu código de conduta particular.

Universidade do Futebol – Qual é a importância da imagem que alguns jogadores brasileiros têm e da imagem da própria modalidade no Brasil para a Copa do Mundo de 2014?

Ana Tais – Eles têm uma importância fundamental. Infelizmente, o Brasil é conhecido por algumas coisas ruins e pelo futebol. Sendo assim, no exterior, o futebol e o Brasil são uma coisa só.

Se esse futebol também tiver a sua imagem denegrida, o que vai sobrar? As pessoas têm muito medo de vir para o Brasil para assistirem à Copa do Mundo, pois a falta de segurança, a violência, os escândalos de corrupção, tudo vai se ligando à imagem do futebol, também.

Para a maioria dos estrangeiros, o Brasil é muito bom para se jogar futebol, mas somente para isso. É interessante que se passe para essas pessoas a certeza de que elas terão segurança aqui.

Assim como os fatores de entorno vão influenciar, o profissional da modalidade também. Por exemplo: o jogador que tem sucesso quer atuar fora do Brasil. Dessa maneira, passa-se que não é bom ficar no Brasil para quem joga futebol. E para os meninos daqui fica a imagem de que eles só vão ganhar dinheiro se forem para outros países.

É claro que essa imagem vai influenciar para quando alguém for pensar em vir para assistir aos jogos de uma Copa do Mundo, pois o que as pessoas esperam encontrar no Brasil, além do futebol, é uma série de escândalos.

Se analisarmos o exemplo do Kaká, ele é educado e tem cultura. Sendo assim, traz uma imagem muito boa sobre o Brasil. Basta perceber isso para notarmos como a imagem faz uma diferença enorme. No entanto, se nós tivermos dez Kakás e três problemas sérios com outros jogadores, infelizmente os problemas sérios vão pesar mais.

Esse tipo de situação será relevante não somente na Copa do Mundo que acontecerá em 2014, mas para a imagem brasileira como um todo. O atleta do país, principalmente o jogador de futebol, tem como meta sair. Isso não pode acontecer, pois mostra que aqui não é um lugar bom para eles ficarem, e que faltam consciência, estrutura e visão de planejamento.



Universidade do Futebol – Como você define o conceito da imagem ideal do atleta de futebol? Existe algum jogador que seja referência nesse aspecto?

Ana Tais – Trabalho com imagem e costumo dizer que não existe certo e errado. O que vale é adequar. Porque não se muda as pessoas, mas podemos ajudá-las a se tornarem pessoas melhores, dentro do que cada uma é.

Não existe um ideal, mas você consegue chegar, a partir dos objetivos da própria pessoa, à dimensão que ela quer tomar. Pode existir um atleta cuja meta é ser como o Kaká. A partir daí, consegue-se guiá-lo nessa direção. Da mesma maneira, outros jogadores possuem diferentes objetivos, e você pode auxiliar cada um deles a seguir na direção que lhes é conveniente.

Cada atleta é único, mas todos deveriam ter o seu objetivo com a consciência de que eles exercem enorme influência e que isso tem, por consequência, uma responsabilidade muito grande também. Um jogador pode ser responsável por várias gerações, ou pela construção de um país inteiro.

Isso seria o ideal, um atleta que tivesse a consciência sobre a qual comentei e que buscasse o caminho para usar essa influência de uma maneira que crie para ele uma condição melhor de sobrevivência e desenvolva a consciência cultural e humanitária de forma a passar isso para as crianças, que crescerão com esses valores.

Universidade do Futebol – Você acredita que, na Europa, a maneira de se trabalhar a imagem dos atletas é mais profissional? Quais são as diferenças do que é feito nesse sentido por lá e no Brasil?

Ana Tais – Na Europa, a cultura, por si só, já é responsável por uma imagem mais trabalhada, ou algo mais próximo da consciência sobre a qual conversamos, pois lá há uma cultura bastante diferente da nossa. Os valores são mais claros, existe um respeito muito grande pela cultura.

Aqui não acontece o mesmo, justamente por conta de uma questão cultural. Conversando com as pessoas na Europa, elas dão valor a tudo o que é antigo, têm conceitos básicos de higiene como não jogar papel no chão, entre outros aspectos. Esses conceitos são tratados com mais rigidez, o que já ajuda para que a imagem seja outra.

As pessoas, no Brasil, em geral, não dão valor para a história do país e não se ligam ao estudo. A própria pobreza no Brasil nos leva a essa realidade. Temos jovens atletas que vêm de lugares sem nenhum recurso, que mal têm o que comer. Isso dificulta e colabora para que eles não tenham noção da imagem correta, do quanto podem influenciar e transmitir ou até onde podem chegar.

Com certeza, essas questões fazem muita diferença, mas podem ser modificadas. Aliás, dá para alterarmos qualquer situação. Basta um trabalho bem feito, que não pense somente na parte financeira, mas nos ganhos que o país pode ter. Se nós não resgatarmos certos valores e mostrarmos para as novas gerações a importância de aspectos como conhecimento e cultural, elas não vão ter algumas noções fundamentais.

Então, se me perguntarem se tem como melhorarmos, a resposta é afirmativa. É um trabalho que terá sucesso se aqueles que se envolverem o fizerem com boa vontade. Se os clubes movimentarem-se para isso fica muito mais fácil estabelecer uma consultoria que trabalhe com a imagem dos seus atletas. Os empresários também podem convidar uma consultoria que os ajude.

É importante deixar claro que ninguém realiza um trabalho dessa relevância sozinho. Existem profissionais em cada área, cada um na sua função, com o mesmo objetivo: ajudar na construção dessa imagem.

Universidade do Futebol – Qual é a diferença da influência que jogadores como Pelé, Garrincha, entre outros, exerciam sobre a população para a influência que atletas como Ronaldo, Cristiano Ronaldo e outros profissionais atuais têm?

Ana Tais – Acredito que a única distinção é que hoje a exposição é muito maior. Sempre os jogadores de futebol exerceram enorme influência. Mas com um espaço maior na mídia, eles conseguem influenciar pessoas de forma muito mais direta atualmente, em diferentes meios.

Décadas atrás, existia a televisão. Hoje existem a televisão, os canais a cabo, a internet e muitos outros meios de influência, os quais veiculam a imagem do jogador de futebol com frequência.

Essa é a diferença básica. Mas em relação à influência, isso sempre existiu.



Universidade do Futebol – Nós conversamos bastante sobre a maneira que um atleta deve fazer para melhorar a sua imagem. No entanto, da mesma forma que ele pode realizar mudanças para o bem, o mesmo pode acontecer no sentido contrário. Por exemplo, o Ronaldo, em comparação com a época em que ele jogava pelo Cruzeiro, melhorou a dentição. Porém, na final da Copa do Mundo de 2002, ele apareceu com um cabelo apelidado de “Cascão”. Nos dois casos houve influência em relação à população brasileira. Como você enxerga situações como essas?

Ana Tais – É a partir de fatos como esses que percebemos o poder de influência que um jogador de futebol possui. Para conseguir fazer com que aquela coisa horrorosa fosse imitada por um número absurdo de brasileiros, nota-se a influência descomunal de uma figura como o Ronaldo.

Esse é o melhor exemplo que nós temos. Não houve ninguém que dissesse que aquele cabelo era algo legal, bonito. Todo mundo achava aquilo feio, mas fazia igual. Tinha gente que fazia aquele cabelo até nos filhos.

Por isso que se tem que direcionar a influência que o jogador vai ter sobre a população. Esse é um exemplo ótimo, pois ele conseguiu fazer com que todo mundo achasse aquilo feio, mas seguisse a “tendência”.

Imagina se o Ronaldo usa isso para mostrar para o país a importância de uma criança ir para a escola, a relevância de se ter vontade de saber, de se ter vontade de conhecer.

O esporte faz parte da cultura. Ele tem que agregar, e não dividir ou diminuir. Não é porque você é um atleta que você também não pode ser uma pessoa culta, que você não vai ter conhecimento geral e saber falar. Pelo contrário, os atletas representam o país, o que é uma responsabilidade enorme.

O jogador de futebol brasileiro deveria perceber a responsabilidade que ele tem sobre o mundo inteiro, pois todos olham para atleta brasileiro com enorme ansiedade, respeito e paixão. Imagina quanta coisa ele poderia transmitir para o mundo! Mas ele não tem essa noção. É isso que falta: ter consciência, saber que se é capaz disso.

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Benê Lima