Pressão. Desde cedo, os jogadores de futebol têm de aprender a conviver com essa palavra. Com o passar dos anos e as mudanças de categoria, até chegarem ao futebol profissional, essa influência coercitiva aumenta por parte de treinadores, patrocinadores, familiares, amigos, etc. Portanto, é importante, o quanto antes, que os atletas aprendam a lidar com isso e saibam administrar o seu lado emocional.
Além dos jogadores, é interessante que a comissão técnica também passe por um tratamento periódico junto a um psicólogo do esporte, uma vez que treinadores, preparadores físicos, fisiologistas, nutricionistas e os demais profissionais do corpo técnico também sofrem pressões no desenvolvimento das suas funções.
Atualmente, professora do Instituto River Plate, na cadeira de Recursos Humanos, disciplina voltada para a carreira de dirigente esportivo, Maria Luciana Vainstoc é pós-graduada em Psicologia do Esporte, com licenciatura em Sociologia. Ela, há anos no mercado futebolístico argentino, já atuou desde o trabalho motivacional com atletas até o desenvolvimento de palestras sobre doping e drogas no esporte.
“O futebol é uma área privilegiada para a formação integral de uma pessoa. Aspectos como solidariedade, auto-estima, confiança e outros valores podem ser desenvolvidos durante a aprendizagem de um esporte como o futebol”, comentou Maria Luciana sobre a maneira como enxerga a modalidade, em entrevista exclusiva à Universidade do Futebol.
Durante a conversa, realizada via email, a profissional do Instituto River Plate também contou sobre as diferenças do trabalho do psicólogo do esporte e do que é desenvolvido dentro dos consultórios, descreveu o seu trabalho motivacional junto ao C.A. Chacarita Juniors, a sua trajetória na Secretaria de Programação para a Prevenção de Drogas e Combate ao Narcotráfico, a importância da concentração para o bom desempenho do atleta, entre outros temas.
Universidade do Futebol – Quais são as principais diferenças entre o trabalho voltado para a Psicologia do Esporte em relação ao que se realiza com o paciente no consultório?
Maria Luciana Vainstoc – A diferença percebe-se em tudo. Com o esportista enfoca-se o trabalho relacionado ao comportamento e às condutas baseando-se na performance dentro de campo. A ideia é trabalhar não somente o plano tático, técnico e físico, mas também o plano mental. O enquadramento com o esportista muitas vezes é diferente da área clínica, já que se trabalha pré e pós-competência.
Universidade do Futebol – Descreva como foi aplicado e quais foram os resultados do treinamento mental e motivacional, técnico e de preparação para competições aplicado durante o período em que você esteve no C.A. Chacarita Juniors?
Maria Luciana Vainstoc – O que se trabalhou nesse momento foi o aspecto motivacional, a concentração, a dinâmica grupal e a reação frente à adversidade. No Chacarita Juniors se trabalhou não somente com os jogadores, mas também com a comissão técnica.
Reuniões periódicas com os treinadores e também com as equipes de futebol foram parte do trabalho de treinamento mental.
Trabalhar com a palavra é algo pouco habitual no ambiente do futebol.
Também é importante o modo que os treinadores aprender a se comunicar com seus jogadores. Colocar as emoções em função do jogo é outra das chaves com as quais se trabalhou.
Universidade do Futebol – Explique como foi o seu trabalho e quais foram os resultados efetivos dele na Secretaria de Programação para a Prevenção de Drogas e Combate ao Narcotráfico, em 2002.
Maria Luciana Vainstoc – A área de prevenção é fundamental e o futebol é uma área privilegiada para poder trabalhar na formação integral com o esportista.
No nosso país (Argentina), lamentavelmente, há muita droga em todos os ambientes sociais, e a falta de informação é o que prevalece. Daí, neste programa, formamos os jogadores para entenderem que o futebol é uma saída para a droga e que a dopagem não gera vantagens esportivas.
Fair Play e esforço eram os pilares do trabalho preventivo.
Universidade do Futebol – Comente sobre os seus trabalhos interdisciplinares para a criação de um modelo de aprendizagem no futebol infantil através do ensinamento de valores.
Maria Luciana Vainstoc – O futebol é uma área privilegiada para a formação integral de uma pessoa. Aspectos como solidariedade, auto-estima, confiança e outros valores podem ser desenvolvidos durante a aprendizagem de um esporte como o futebol. A ideia desse projeto foi trabalhar com um grupo de especialistas em ciências aplicadas ao esporte com a intenção de gerar um modelo que se possa aplicar não somente no ensino de uma modalidade esportiva, mas também na construção de uma pessoa como ser humano.
Universidade do Futebol – Explique as principais dificuldades de um jogador de futebol para que ele se mantenha focado durante grande parte da temporada e assim maximize os resultados dentro de campo.
Maria Luciana Vainstoc – É fundamental que o jogador de futebol possa colocar em palavras tudo aquilo que está acontecendo com ele. A pressão, as frustrações esportivas, a falta de concentração são situações que estão permanentemente presentes na vida de um jogador profissional.
Por meio da Psicologia Esportiva tentamos trabalhar outros aspectos para que a área emocional se fortaleça cada vez mais.
Técnicas de concentração e visualização são utilizadas no trabalho com o esportista, assim como testes psicológicos para avaliar perfis esportivos.
Universidade do Futebol – Qual é a relação que se pode fazer entre concentração, treinamento e sucesso na execução dos fundamentos do futebol?
Maria Luciana Vainstoc – Quanto maior a concentração, melhor será a qualidade durante o jogo. E, a partir disso, mais chances de êxito. A concentração é um dos pilares básicos de um bom rendimento. Assim como se treina a execução de um movimento, também, da mesma maneira, se deve treinar a concentração. É uma habilidade que, quanto mais for treinada maior será a sua eficácia.
Universidade do Futebol – Como a mentalização influencia positivamente no rendimento?
Maria Luciana Vainstoc – Outros dos pilares básicos de um esportista de alto rendimento é a fortaleza mental. Quanto mais se trabalham os pensamentos positivos, mais capacidade de inteligência emocional obtém um atleta.
O importante é aprender a trazer à mente pensamentos positivos e eliminar os negativos.
Os atletas atuam melhor quando pensam positivamente, e não quando creem que não conseguirão vencer ou que jogarão mal.
Universidade do Futebol – Qual a melhor forma de fazer um trabalho de motivação com os atletas?
Maria Luciana Vainstoc – Em primeiro lugar, conhecendo o perfil do atleta. Quais são suas fortalezas, suas debilidades e levando em conta que o jogador entenda que o seu trabalho é para potencializar seus aspectos mais saudáveis.
Dar-lhe estratégias mentais para que ele aumente o seu rendimento é essencial.
A medida que o atleta percebe que pode modificar seus comportamentos, tanto nos treinamentos quanto nas suas competências, ele entrará em um vínculo maior de empatia.
Universidade do Futebol – Em que ponto da carreira de um atleta é interessante se iniciar um trabalho de acompanhamento psicológico? Esse trabalho deve ser mantido ao longo da carreira?
Maria Luciana Vainstoc – Quanto maior for a contenção emocional posta ao atleta será sempre melhor. A assistência de um psicólogo esportivo reforçará aspectos como a motivação, confiança, reação frente à adversidade, etc.
Quanto mais cedo o jogador trabalha o aspecto mental, haverá menos margem para a frustração.
Universidade do Futebol – Os profissionais de psicologia ainda enfrentam algum preconceito no futebol?
Maria Luciana Vainstoc – Aos poucos, cada vez mais times de futebol trabalham com psicólogos esportivos. Na medida em que o treinador entende que o psicólogo funciona como uma ferramenta para blindar-lhe e assisti-lo, ele deixa de enxergá-lo como uma ameaça. Hoje, cada vez mais, o aspecto mental garante uma vantagem competitiva.
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Benê Lima