Ao mesmo tempo em que a prática é vista como instrumento de educação, há também o reconhecimento dos “serviços prestados” pelos atletas
Helio D'Anna
Caro leitor,
após cinco anos escrevendo sobre o futebol nos Estados Unidos, me ocorre que muitos leitores novos talvez precisem de uma revisão sobre o futebol universitário desse país. Sempre recebo pedidos de informações e acho que vale a pena essa revisão.
O futebol praticado nos EUA está bastante enraizado no sistema educacional. Isso inclui desde o ensino básico até o universitário. Aliás, historicamente se falando, a presença do futebol na região começou com a prática nas universidades para depois ser adotado por outras faixas etárias.
Pouca gente sabe (mesmo por aqui nos EUA) que desde 1862 universidades americanas oferecem esse desporto. Essa influência veio naturalmente pela influência britânica. Em 1871, a “English Football Association” criou as regras gerais do desporto e devido à falta de acordo com diferentes interesses, a associação separou-se em dois grupos, um resultando nas regras clássicas do futebol, e outro nas regras que passaram a ser chamadas de rugby.
Nos Estados Unidos, em princípio, as regras do rugby foram adotadas. Isso eventualmente levou a criação do esporte “football”, que hoje em dia é o futebol americano (às vezes imagino o que teria acontecido se as universidades tivessem adotado as outras regras...). O fato interessante é que o primeiro jogo oficial de soccer nos EUA é tambem visto como o primeiro de American Football (Rutgers contra Princeton, em 1869).
De qualquer maneira, o desporto futebol continuou sendo praticado por universitários e em 1901 voltou a ser incorporado em competição (universidades da região de Nova York fizeram jogos nesse ano). De lá para cá muita coisa mudou e hoje o futebol é um dos esportes de maior sucesso dentre as universidades americanas. Já que esse é o meio em que trabalho, gostaria de mostrar sua organização geral.
Observo que os dados referidos são relativos ao futebol masculino e vou falar do futebol feminino numa outra oportunidade.
Uma das claras características da sociedade americana com relação ao desenvolvimento é o incrível número de universidades que esse país possui: mais de quatro mil (mais precisamente, 4.168). São ao todo quase 16 milhões de pessoas cursando universidades no momento. Em nível de ligas universitárias, há três principais no país: a NCAA (National Collegiate Athletic Association), que possui divisão 1, 2 e 3; a NAIA (National Association of Intercollegiate Athletics), e a NCCAA (National Christian College Athletic Association).
Há tambem uma liga específica para instituições que oferecem diplomas de nível pós-secundário/pré-universitário (chamadas de junior colleges): a NJCAA (National Junior College Athletic Association).
Cada instituição decide qual liga reflete melhor suas características e dessa maneira decide a qual liga se afiliar. Em geral, as diferentes ligas acabam por agrupar instituições “parecidas” no sentido de tamanho, número de alunos, afiliação religiosa, disponibilidade de oferta de bolsas, etc. E essas ligas não são necessariamente colocadas em progressão ou como qualificatórias umas às outras (por exemplo, não há “acesso” ou “descenso”). O ponto comum em todas essas ligas é a organização geral da competição desportiva (incluindo o futebol).
Como o país é grande, as escolas são divididas em regiões. Cada região possui duas ou três subdivisões chamadas de conferências. Eu trabalho numa universidade afiliada à NCAA divisão 2, e minha liga possui oito regiões com duas conferências cada e com 10 a 15 escolas em cada conferência (minha liga tem por volta de 250 universidades que oferecem futebol competitivo).
Dentro de cada conferência, os times jogam entre si em um turno (a cada ano inverte-se o mando de jogo). Há tambem jogos agendados que “cruzam” times da outra conferência em cada região (e também de outras regiões). Durante o decorrer do campeonato, os times são ranqueados dentro de suas conferências (baseados no confronto direto e na adição de pontos acumulados). Os times também são ranqueados dentro de sua região (esse ranking é estabelecido por votos de comitês, já que não há um confronto direto de todos os times da região por falta de tempo hábil). Os melhores times da região entram, então, no ranking nacional (também estabelecido por comitês).
Assim, ao fim da temporada regular (pontos corridos), começam os play-offs (mata-matas). Os campeões das conferências, mais os times ranqueados em suas regiões, começam essa disputa e cada região também estabelece por mata-mata seus campeões. Daí vem a fase nacional (campeões das regiões mais os melhores ranqueados no país) e o mata-mata segue até se estabelecer o campeão nacional.
O povo americano adora o formato de play-off. O interessante da cultura americana é que há obviamente um reconhecimento grande do campeão nacional, mas também se “celebram” todos os outros campeões (das conferências e das regiões) e também dos times que terminam no ranking nacional final (os times top 25). Assim, várias universidades veem seus nomes reconhecidos no país inteiro, e sentem seu esforço “pago” mesmo sem terem sido campeãs nacionais.
As universidades investem (e muito) dinheiro em seus programas. A começar pela estrutura física – as universidades normalmente têm excelentes campos, vestiários, etc. Boas condições de trabalho é dada aos técnicos em nível de material, apoio, etc. E muito importante: dinheiro é investido “indiretamente” em relação a bolsas de estudos a serem oferecidas aos atletas.
Ao mesmo tempo em que a prática de futebol universitário é vista como instrumento de educação, há também o reconhecimento dos “serviços prestados” pelos atletas. Em troca de representarem as universidades nas competições, os atletas recebem bolsas de estudo (parcial ou total). Cada liga estabelece o número máximo de bolsas que pode ser oferecido (ao fim do dia, não é todo mundo que estuda de graça). O preço médio para se estudar em universidades nos EUA é de 10 mil dólares por ano (algumas chegam a custar 50 mil por ano).
Não há ensino universitário gratuito por aqui. E cada liga tem regras diferentes quanto ao número de bolsas a serem oferecidas, mas uma coisa é certa: a quantia total é alta e representa milhares de dólares (minha universidade permite distribuição de 180 mil pelos 22 jogadores).
Na verdade, o técnico universitário tem que ser um bom negociante e convencer muitas vezes familiares a pagarem parte do custo da escola e perceberem as vantagens em se fazer isso (qualidade da universidade, qualidade do time, etc). O processo de se recrutar jogadores é uma arte em si própria. Em outro momento eu contarei como se faz para se dar “um jeitinho” aqui nos Estados Unidos, e se obter fontes de ajuda para aumentar o número de bolsas que podem ser oferecidas pelas universidades.
Com relação à duração do campeonato universitário, a temporada de futebol ocorre no primeiro semestre do ano letivo americano (que começa em agosto por aqui). O segundo semestre letivo (que começa em janeiro) tem um calendário de jogos amistosos e torneios isolados (aliás, essa é uma das críticas que amantes do futebol fazem: por que não fazer a temporada mais longa...).
Jogadores que demonstram aptidão e interesse em seguirem carreira profissional dentro do futebol têm a chance de jogar uma liga de férias de verão que possui times semi-profissionais. A liga é chamada PDL (Professional Develpomental League) e em parte ajuda a saciar a vontade de “mais jogos” que os jogadores universitários muitas vezes sentem.
Aliás, o futebol universitário é uma das principais fontes de jogadores para os times profissionais nos EUA. Apesar de não ser a única fonte (há jogadores que não jogam em nenhuma liga universitária, mas se profissionalizam), essa liga realmente proporciona a esmagadora maioria. Quando alunos se formam nas universidades, eles são colocados no que se chama de “draft”, que é o sistema pelo qual os jogadores são ranqueados (que surpresa) e são alocados aos clubes profissionais por sorteio. Daí os clubes escolhem jogadores ou repassam seu direito de escolha a outros clubes em troca de dinheiro ou futuras escolhas. A descrição mais detalhada do futebol profissional americano virá num futuro próximo.
Em conclusão, a liga universitária americana é uma tremenda fonte de talentos e de desenvolvimento de jogadores, assim como uma provedora de chances de se conciliar estudos com a prática desportiva de alto nível. Como resultado, a maioria esmagadora de jogadores profissionais de futebol nos EUA engloba pessoas com diploma universitário. Isso dá a esses atletas a chance de ter um futuro garantido quando a carreira de atleta profissional termina. Isso tambem dá ao técnico de futebol profissional o privilégio de interagir com atletas supostamente mais preparados intelectualmente para lidar com as pressões e situações comuns a atletas profissionais.
Esse sistema não é perfeito, mas é sem dúvida nenhuma interessante. Como técnico universitário, me sinto abençoado em poder ter impacto na formação de meus jogadores, dando a eles a chance de crescerem dentro e fora dos campos.
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Oi meu nome é Bernardo,tenho 21 anos(faço 22 em março) sempre quis jogar nas ligas universitaria americanas mais por condiçoes financeiras nunca tive condiçao,meu ingles e intermediario,gostaria de saber se nessa idade ainda tneho alguma chance e se tenho como devo proceder.aguardo resposta,grato
ResponderExcluirmeu email: belara_b@hotmail.com