por Lucas Borges, da redação do ESPN.com.br
No dia 10 de outubro deste ano nasceu no Rio de Janeiro a Associação Nacional dos Torcedores – ANT -, grupo disposto a defender os direitos dos apaixonados por futebol no Brasil. As ‘bandeiras’ do movimento são aquelas que todo brasileiro que frequenta estádios de futebol pelo país conhece: lutar contra o preço abusivo dos ingressos, a falta de transparência dos dirigentes, os horários de jogos prejudiciais aos espectadores, a falta de meios de transporte público para chegar às partidas etc.
Mas o discurso é mais profundo. “Vem uma porção de dinheiro para modernizar o futebol, mas na verdade não é isso. É um processo de destruição daquilo que o futebol brasileiro tem de mais importante, que é a alma. Estão tentando tirar esses torcedores dos estádios, tentando transformar o estádio em um shopping center”, diz Marcos Alvito, doutor em antropologia, professor de história da Universidade Federal Fluminense e líder da ANT.
Até a última quarta-feira – 20/10 – a ANT tinha 800 componentes por diferentes estados do Brasil
Alvito passou a questionar o atual modelo de modernização do futebol brasileiro depois de uma viagem à Inglaterra em 2007. Na terra onde os clubes deveriam ser um exemplo, ele se surpreendeu. Segundo o estudioso, os ingressos eram caros, a maioria não tinha condição de frequentar os jogos e a população estava perdendo a identificação com os seus times.
“Eles mesmos estavam criticando demais esse modelo. Não era sustentável. Ele tinha destruído as bases do futebol inglês, que eram os clubes locais, os clubes de bairro, de fábrica, de cidades pequenas. Era um modelo elitista, concentrador, tanto em termos da exclusão do torcedor, como concentrando poder e riqueza na mão dos grandes clubes. E hoje, dos 20 primeiros clubes da primeira divisão inglesa, 19 estão endividados.”
O especialista vê no Brasil, com os atuais programas de sócios-torcedores, o consequente aumento do preço dos ingressos e ainda por cima projetos de construção de estádios sofisticados, uma tendência parecida. Mas por aqui, ele analisa, a coisa caminha para um rumo ainda pior. “O que nós temos é muito mais perverso do que o modelo inglês. Lá você não tem construção de estádios com verba pública.”
“Em nome desse modelo inglês que não deu certo na Inglaterra, a gente tem a má utilização de verbas, superfaturamento, utilização de verba pública para a exclusão dos torcedores. O futebol está ruim, os estádios estão muito ruins. A gente também acha. Mas não estão modernizando. Estão embelezando e elitizando”, diz Alvito, que cita as constantes reformas no Maracanã como exemplo.
A insatisfação com o histórico de descaso dos responsáveis pelo futebol no Brasil se juntou ao temor de uma modernização que não lhe parecia ideal e Alvito decidiu criar a ANT. O movimento propõe que torcedores por todo o Brasil façam suas carteiras de associados de forma gratuita pela internet -www.torcedores.org -, formem diretórios locais em cada região do país e discutam a situação do esporte por aqui.
Até a última quarta-feira – 20/10 – a ANT tinha 800 componentes por diferentes estados do Brasil. Alvito acredita que seu projeto possa continuar crescendo ao número de 80 pessoas por dia. A meta é que até o final do ano, 25 mil torcedores tenham aderido à ideia. O sonho é que um dia 1 milhão de apaixonados possam estar engajados na mesma luta.
Uma das maneiras de atrair mais associados é promovendo manifestações nas portas dos estádios. A primeira já foi feita: foi no último domingo, durante o empate entre Fluminense e Botafogo, no Engenhão. Além de tentar passar a mensagem aos torcedores, os manifestantes procuram chamar a atenção com música, espetáculos teatrais e, claro, futebol. Neste domingo, novos eventos vão acontecer durante a disputa de Vasco e Flamengo, no Engenhão, e Corinthians e Palmeiras, no Pacaembu.
Alvito tem certeza de que em breve os torcedores vão ser ouvidos pelos clubes e pela CBF. “É impossível que você tenha um sistema que não considera o elemento mais importante para esse sistema funcionar. Na hora em que não tiver mais torcedor, não haverá futebol.”
“O modelo certo é aquele que ouve os torcedores. Um modelo democrático, em que todos vão participar da tomada de decisões relativa ao futebol e relativa às verbas milionárias. Não há um modelo pronto. Mas ele deve ser discutido. E não simplesmente aceitarmos algo em nome de uma pretensa modernização. Algum dia essas instituições vão ser obrigadas a conversarem com a gente sim. E não vai ser porque elas querem. Vai ser porque elas vão ser obrigadas."
Revisão: Benê Lima
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