CBF falha na coordenação de retomada de um projeto nacional, a fim de criar e controlar a formação de jogadores e treinadores com as nossas características
Rodrigo Vicenzi Casarin
José Mourinho e Manuel Sérgio são dois portugueses que estão entre os grandes exemplos do humanismo a serviço do futebol
Mais uma temporada futebolística chegou ao fim e nela algumas constatações evidentes puderam ser ressaltadas. Se avaliarmos as partidas do campeonato nacional (Brasileirão) e a participação catastrófica da nossa seleção na Copa do Mundo, percebemos algumas regularidades e igualdades no comportamento de quase todas essas equipes, tais como: chutões para frente, excesso de faltas, cruzamentos sem objetivos a todo instante, brigas acirradas pelo alto, pelo chão, desorganização coletiva... e a bola ficando cada vez mais assustada com a falta de carinho com que os “fortões” a tratam. É o nosso futebol se tornando, se tornando, se tornando...
É só analisarmos uma situação bem evidente. Quais foram os melhores meias/médios do Campeonato Brasileiro? Quantos meias/médios ou atacantes tivemos concorrendo ao prêmio de melhor jogador do mundo?
Respondo. Na primeira questão sabemos que os melhores meias/médios que se apresentaram pelos nossos gramados não são brasileiros, mas sim argentinos. D’Alessandro, Conca e Montillo foram, sem sombra e sem dúvidas, os melhores jogadores que habitaram nessa posição. Cada qual com sua singularidade enxergaram o jogo com outro olhar e demonstraram a paixão em tratar bem a bola. Pareciam corpos estranhos em nossos gramados. Em seus pés a redondinha sorria e ficava extasiada com o tratamento dos hermanos.
Em relação à segunda questão, não podemos deixar de reconhecer os méritos de Julio César, Maicon e Dani Alves quanto às suas escolhas para concorrerem ao prêmio de melhor jogador do mundo. Evidentemente temos que reconhecer que esses jogadores possuem suas potencialidades, jogam em grande nível na Europa, são os melhores em suas posições, o que proporciona a condição para concorrerem ao prêmio.
A crítica refere-se ao estado que nosso futebol chegou. Não possuímos um meia/médio ou um atacante concorrendo ao prêmio de melhor jogador do mundo. Para outros países pode parecer algo comum, mas para nós isso é extremamente conflitante e alarmante. Será reflexo da defensividade da nossa seleção brasileira apresentada na Copa do Mundo? Do nosso campeonato nacional que está importando conceitos do futebol do segundo escalão da Europa? Ou será apenas reflexo do processo de formação de jogadores, que infelizmente já importou conceitos ultrapassados?
Acho que todas essas perguntas são pertinentes para buscarmos compreender o que está acontecendo com o nosso futebol.
Reconhecer a qualidade dos argentinos e dos nossos jogadores que concorrem ao prêmio de melhor jogador do mundo é o que menos nos incomoda e o que menos nos preocupa e inquieta. Agora, entender o que está acontecendo mesmo com o nosso futebol e, especialmente, com a essência do nosso futebol é uma questão de alta complexidade, já que os fatores não estão isolados.
Importar conceitos ultrapassados, jogar igual a essa, aquela seleção, captar jogadores por protocolos de halterofilismo e atletismo, definir um protótipo de jogador, são apenas algumas das questões que estão imbricadas e trouxeram uma nova realidade.
Chegamos ao cúmulo de ouvir dos meios de comunicação o interesse do Mano Menezes em convocar o Conca para a nossa seleção. Nada contra o hermano, que possui qualidades para jogar em qualquer seleção, mas será que não conseguimos mais formar meias/médios ou atacantes com inteligência, que temporiza o jogo, que sabe onde, quando e como colocar a bola, que seja imprevisível, criativo, que antecipe, entenda o jogo na sua dimensão coletiva e individual e que possua uma variabilidade de comportamentos?
Tenho certeza de que não precisamos naturalizar jogadores para essas posições. Temos tudo na mão. O grande problema é que os treinadores e dirigentes proferidos experts querem utilizar uma receita importada e comprada, querem fazer o mesmo bolo (protótipo de jogador), aplicar os mesmo ingredientes, com o mesmo tamanho, com as mesmas características; grande, forte, robusto....
Creio que, se voltarmos a fabricar bolos típicos brasileiros (cada jogador com sua singularidade e com a nossa identidade), com variabilidade de ingredientes, com vários recheios, várias coberturas e sem a exigência de uma receita única, revertemos essa situação alarmante.
Mas, para concluir esse pequeno texto, pergunto aos cavalheiros: cadê a coordenação da CBF, para criar e controlar projetos de formação de jogadores e treinadores com as características do nosso futebol? Há clubes nesse território que ainda se lembram da nossa história e procuram formar jogadores e treinadores com a cultura local (cultura do clube) e a cultura de arte e magia (cultura do nosso país)? Vocês respondam!
É o nosso futebol se tornando, se tornando, se tornando... e acelerando a morte de uma identidade. Será que temos consciência que estamos morrendo aos poucos? Será que temos consciência que o nosso processo de formação e a importação de modelos ultrapassados está for-MATANDO o nosso futebol? Bom, respondam vocês novamente!
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Benê Lima