Sávio Assis de Oliveira é um dos grandes contribuintes para a reflexão sobre a Educação Física escolar no País. Graduado na área, com especialização em Pedagogia do Esporte e mestrado em Educação, todos pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ele é autor de “Reinventando o esporte: possibilidades da prática pedagógica”, obra que dialoga com a “desesportivização” da Educação Física e o não abandono do esporte pela escola.
A tematização básica são as discussões sobre a escola e suas relações com a sociedade capitalista, indicando que essa instituição possui importante papel na reprodução dos valores desse modo de produção. Por intermédio da Educação Física escolar, influenciada pela instituição esportiva, que a escola assume códigos, sentidos e valores da sociedade capitalista.
O livro tem como suporte o paradigma da cultura corporal e a metodologia crítico-superadora, colocando em xeque as “regras do jogo” do esporte moderno, apontando, com detalhes, as relações entre o fenômeno esportivo e a sociedade. Outro jogo seria possível? Sávio não tem dúvidas de que a resposta é positiva.
“O termo ‘reinvenção’ já procura trazer a ideia de que o esporte – e podemos contemplar o futebol – é invenção dos homens. Muitas vezes falamos em mudanças no esporte e parece ser impossível, como se ele não fosse uma produção humana. Como tal, podemos resgatar a dimensão humana das modalidades e tentar fazer diferente”, explicou o professor, que é membro do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE) desde 1991, tendo exercido os cargos de secretário estadual em Pernambuco (1997-1998) e diretor de divulgação da Direção Nacional (1999-2001).
Tricolor pernambucano de coração, Sávio coordena desde 2009 o Grupo de Trabalho Temático "Políticas Públicas" da CBCE, tendo integrado o Comitê Científico deste GTT no período 2005-2007. Para ele, a abordagem específica da modalidade esportiva coletiva mais popular do mundo deve ser feita no plural – os “futebóis”, como ele costuma se referir a alunos e demais docentes.
“Pluralizar, fazendo um movimento que já é levantado por profissionais da pedagogia do esporte, é necessário, assim como entender o que dá identidade ao jogo do futebol e o que é possível mexer, mantendo-se o que é fundamental do jogo. Não só no jogo em si, temos de abordar tudo o que envolve esse ambiente”, indicou Sávio.
O futebol, crê, é uma possibilidade de inserção no mercado de trabalho, mas não apenas como jogador profissional. Sávio defende a ideia de que as crianças, nas escolas, tenham acesso a mais informações, sem a falsa promessa de que o esporte garante mobilidade social, com a mostra clara do conjunto de suas possibilidades e das suas contradições.
“Sempre trabalho com a ideia de que o professor precisa provocar o aluno a refletir. Esse processo deve se realizar a partir da interação entre as duas partes, e não de uma forma pronta e acabada. Tanto os professores em relação às grandes políticas, e os alunos em relação ao planejamento dos professores, são os piores executores daquilo que não gostaram e de que não participaram”, completou.
Entre outros pontos abordados nesta entrevista à Universidade do Futebol, o ex-secretário adjunto de Educação da cidade do Recife (2001-2004) e atual professor da Faculdade Salesiana do Nordeste (FASNE) analisou o legado previsto com a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016 – em especial na área social –, conferiu um diagnóstico da Educação Física e das Ciências do Esporte atualmente no Brasil e falou sobre qual a possibilidade de instrumentalizar o futebol para integrar novos conhecimentos a partir das escolinhas.
Reinventando o esporte: possibilidades da prática pedagógica
Universidade do Futebol – Quem é o profissional – e o ser humano – Sávio Assis de Oliveira e como se construiu sua relação com o futebol?
Sávio Assis – Meu envolvimento com a educação física se dá desde a escola, ainda como aluno, com o voleibol. Em função desse prazer em relação à área, resolvi que profissionalmente queria trabalhar com isso. O percurso do curso acadêmico me fez olhar para outras possibilidades do esporte e da educação física que não apenas o treinamento da modalidade e, antes, o de ser atleta.
Meu trabalho de conclusão de curso de graduação, passando pelo mestrado e pelo doutorado, sempre focou o esporte, ou como conteúdo de aula, ou como objeto de uma política pública específica. E paralelamente a isso tem um envolvimento enquanto torcedor apaixonado do Santa Cruz Futebol Clube, que por questões diversas – desde a estrutura geral do futebol profissional até questões específicas de suas administrações – amarga a quarta divisão do futebol nacional.
Dentro dessa preocupação, sempre tive um olhar voltado ao futebol, como objeto de estudo e como paixão pessoal.
Universidade do Futebol – Como você analisa o fato de que o Brasil sediará nos próximos anos uma Copa do Mundo? Será possível traduzir o evento esportivo em um legado positivo para o País?
Sávio Assis – Inicialmente eu participo de uma dúvida nacional: nas condições atuais do Brasil, deveria ser prioridade a realização desses grandes eventos, como Copa e Olimpíadas? É dúvida, mesmo, antes de uma posição, ou algo questionável. Sei que na administração pública temos de conviver muitas vezes com a combinação de atendimento de grandes eventos e de investimento de uma forma mais consistente e duradoura diante das carências.
É inimaginável, por exemplo, que cidades como Recife e Salvador deixem de aplicar verbas e realizar investimento em Carnaval, apesar de elas terem dificuldades em áreas como saúde e educação. Não se pode trabalhar com tal lógica. Mas quando se fala em legado, fala-se em aproveitar determinadas situações para que também se avance em outras.
Acredito que o legado que se trabalha em grandes eventos é o de abertura de postos de trabalho – geralmente temporários – e na melhoria de infraestrutura. Ou seja, a edificação do que ficará por conta do evento. Mas é importante fiscalizar e definir qual a melhor forma que cada cidade tem para participar de um evento deste tipo. E qual a participação do poder público em um negócio cada vez mais privado.
O que a Fifa arrecada de contrato com as Copas seguintes são números gigantescos e até de difícil compreensão. E mesmo com esse dinheiro que circula, há o apelo da participação governamental. População e sociedade organizada têm de ficar atentas e cobrar o investimento público vinculado ao legado social.
Mais especificamente na área da educação física, é importante discutir o que ficará para o futuro em relação à massificação do esporte, sua importância educacional, o objeto não só de entretenimento, etc.
Talvez o maior legado para a parte da escola que trata mais diretamente do esporte e do futebol seria que pudéssemos chegar a 2014 com todas as instituições de ensino públicas tendo aulas regulares de Educação Física e os professores com condições de trabalho para discutir a realização de uma Copa do Mundo.
Normalmente, quando há um grande evento, a escola se envolve em questões mais periféricas sobre os países participantes, que não o jogo em si, a atividade física em si, e não relacionada à profissão e ao futebol de alto nível como negócio.
Grande legado social ao Brasil pós-grandes eventos esportivos seriam realização regulamentar de aulas de Educação Física em escolas públicas e valorização salarial de professores, diz Sávio
Universidade do Futebol – E qual o diagnóstico que você faz hoje da Educação Física e das Ciências do Esporte no Brasil?
Sávio Assis – Antes até do diagnóstico, e ainda do ponto de vista que envolve a Copa, algumas cidades têm o problema de não enfrentar a estrutura já existente. Em Recife, onde moro, está se debatendo a construção de um novo estádio, por exemplo, sendo que temos três praças esportivas com capacidade para no mínimo 20 mil pessoas.
Seria necessária uma compreensão do poder público e dos órgãos responsáveis para se trabalhar a partir do existente e o que pode ser feito, gastando menos e tendo maior repercussão social. Uma relação direta de união em torno dos clubes, no caso de Pernambuco, para que o maior estádio fosse adaptado para o evento, com os outros dois rivais atuando de maneira integrada e recebendo outras opções de melhorias.
O diagnóstico que faço da Educação Física e das Ciências do Esporte é de um avanço de uns anos para cá, no sentido de ampliação das possibilidades de intervenção e do tratamento do esporte enquanto conteúdo. Mas um avanço geralmente conflituoso – o que é muito bom para se atingir objetivos.
Convivemos com uma polêmica em torno da formação. Cursos têm finalidades diferentes, aparentemente, como o de licenciatura e o de graduação; o primeiro habilitando para a docência na escola, e o segundo, para outras possibilidades de treinamento, atividade física e saúde, trabalho em academia e outros projetos. E há uma parte da área reivindicando a defesa de uma licenciatura ampliada, que desse conta tanto da escola, quanto dessas outras atividades de intervenção.
É uma esfera em expansão, do ponto de vista das possibilidades, e do ponto de vista de tratar os temas de modo mais científico. Sinto necessidade de construir alguns consensos, mesmo que provisórios, sem abrir mão da contradição, que pudessem ajudar desde o jovem em formação que vai atuar na área, com repercussão naqueles que são atingidos dentro e fora da escola.
No futebol, nas categorias de base, trata-se ainda a descoberta de talentos com a ideia de que o garoto nasce sabendo jogar e o clube apenas lapida esse “diamante bruto”. Temos de avançar neste sentido. O próprio esporte de alto rendimento de outras modalidades já trabalha com uma lógica mais avançada, de que todos são capazes de aprender tudo, só que não no mesmo tempo e no mesmo ritmo.
No vôlei, as equipes juvenis e infantis às vezes têm uma média de altura superior ao grupo adulto nacional do momento, porque o critério de seleção tem sido o biotipo necessário para aquela modalidade, o mínimo de coordenação motora. O alvo é tornar aquela pessoa um grande atleta. E no futebol muitas vezes se convive com a questão do inato, do “nascer para aquilo”. É preciso estimular em crianças que se interessam pelo futebol outro tipo de questionamento, um ensinamento que provoque soluções para aquele jogo.
Na minha avaliação, o futebol tem sido muito maltratado nas escolas. Ele seria uma das possibilidades de mobilizar os interesses do aluno, inclusive, para outras experiências esportivas e educacionais. Acredito que estamos avançando, poderia ser mais rápido, mas temos possibilidades para viver melhor, aproveitando janelas como a realização da Copa.
O futebol enquanto conhecimento e experiência cultural precisa ser tematizado e problematizado de outra maneira na escola. O aluno tem o direito de aprender futebol, mais além do que apenas aprender a chutar bola.
'Maltratado' nas escolas, futebol deve ser compreendido de maneira mais ampla e plural pelos alunos que sonham em ser atletas profissionais
Universidade do Futebol – Na esteira do seu comentário, você é um otimista em relação ao que será feito em termos sociais e na construção de ferramentas de emancipação?
Sávio Assis – Meu otimismo é sempre proporcional à nossa capacidade de se organizar e reivindicar questões e tomar frentes. Para além da área de educação física e do esporte, precisamos apostar em uma organização do uso dos recursos, de direcionar o levantamento dos legados estruturais e, principalmente sociais. Essa é uma expectativa cujo otimismo está relacionado à população.
Temos de aproveitar os episódios para problematizar questões e tentar elevar o nível de consciência da população por vistas a uma perspectiva mais emancipatória. Acho que inclusive do ponto de vista da gestão pública, este deve ser o maior critério de avaliação.
Muitas vezes se compara quem construiu mais prédios, postos de saúde e escolas, que são dados importantes. Mas ao instalar uma escola, um posto de saúde, uma quadra poliesportiva, ou uma praça, em uma determinada comunidade, acontece um processo que faz com que aquele grupo eleve seu nível de consciência. E a relação com o político é de promessa cumprida, de papel feito enquanto gestor.
Ficaremos na dependência sempre de quem está à frente desse processo, dessa iniciativa, com participação e execução populares, e da própria comunidade beneficiada, por outro lado, que tem de cobrar tais projetos. Manter funcionando a estrutura e esse serviço é uma dificuldade. A melhor maneira de fazer isso acontecer, atendendo aos anseios da maioria, é uma participação da sociedade.
Dei o exemplo do clube de futebol ao qual sou vinculado. Muitas vezes enquanto torcedor você fica alheio ao que acontece no cotidiano da agremiação, aos desmandos dos dirigentes, e não se organiza para tomar, como sócio, o clube pelas mãos. Fazendo uma analogia, é necessário um papel na arquibancada e outro no campo político, debatendo, cobrando, etc. Tenho este tipo de postura e de perspectiva: é pelas saídas coletivas que conquistaremos coisas mais duradouras, independentemente do lugar e da situação. E a Copa do Mundo está aí, para ser vista e tratada mais do que como um mero evento passageiro.
Como desenvolver o projeto Copa do Mundo nas escolas
Universidade do Futebol – No seu trabalho, você propõe a reinvenção do esporte, tema que foi mote de um livro produzido, inclusive. No Brasil, como você “reinventaria” o futebol, em se considerando todas as características particulares?
Sávio Assis – O termo “reinvenção” já procura trazer a ideia de que o esporte – e podemos contemplar o futebol – é invenção dos homens. Muitas vezes falamos em mudanças no esporte e parece ser impossível, como se ele não fosse uma produção humana. Como tal, podemos resgatar a dimensão humana das modalidades e tentar fazer diferente.
No caso do futebol, quando tenho oportunidade de tratar do tema, procuro abordar a ideia no plural: “futebóis”. Às vezes, no curso de Educação Física, pedimos para uma pessoa definir o que é futebol, e o aluno, ou mesmo o professor, acaba restringindo a modalidade às regras ou ao espaço do jogo profissional, que ele vê na TV. E sempre faço o contraponto: se futebol for apenas este da mídia, das regras, dos negócios e da profissionalização, à imagem e semelhança, ele não cabe nas escolas, visto que são raras as que têm um campo com medidas oficiais.
Pluralizar, fazendo um movimento que já é levantado por profissionais da pedagogia do esporte, é necessário, assim como entender o que dá identidade ao jogo do futebol e o que é possível mexer, mantendo-se o que é fundamental do jogo.
Não só no jogo em si, temos de abordar tudo o que envolve esse ambiente. O futebol é uma possibilidade de inserção no mercado de trabalho, mas não apenas como jogador. As crianças nas escolas precisam ter acesso às informações, sem a falsa promessa de que o esporte garante mobilidade social, mostrando o conjunto de suas possibilidades e das suas contradições. E não ficando preso a uma ideia de que o esporte é essencialmente bom e que ele não tem problemas e contradições.
Talvez a maior contradição seja dizer que esporte é saúde. Eu já fiz uma cirurgia no ombro e convivo com uma lesão de menisco por conta dos meus muitos anos de treino e jogo no voleibol. O esporte é saúde – mas pode também não ser.
“O esporte afasta das drogas” é uma promessa comum, mas ele também pode colocar o jovem em contato com elas; “esporte é alegria e confraternização”, mas também promove dramas em quem perde, ou delimita a observação de um jogo de Copa do Mundo, por exemplo, a cidadãos com maior capacidade financeira. Todas essas questões e possibilidades nos permitem pensar na reinvenção do esporte.
Além da forma de tratar determinadas questões. Alguns professores trabalham fundamentos do futebol de maneira diferente – um deles é o João Batista Freire. Contraponho com alguns colegas que atuam em ambiente de alto rendimento as experiências coletadas das atividades propostas por ele. E penso que na escola é que se encontram muitas das soluções e formas de fazer as quais têm muito mais a ver com o jogo profissional do que os nossos preparadores físicos realizam.
Acompanho alguns treinos do meu time e vejo atletas dando dribles em cones, que estão parados, obviamente. No jogo isso não se repetirá. Na escola, usamos um arco, ou uma brincadeira, para que o garoto conduza as bolas com os pés, mas de cabeça elevada, se situando no espaço, em busca da melhor solução, promovendo dificuldade ao marcador. É nesse plano que se situa a reinvenção que coloco. Ela vai desde a pluralização do futebol até a compreensão de tudo que está no entorno dele (debate sobre regras oficiais, informações desejadas pelo aluno, etc.).
Sempre trabalho com a ideia de que o professor precisa provocar o aluno a refletir. Se eu tenho um jogo em que cabem poucos, a pergunta é como eu faço para mais gente jogar. Esse processo deve se realizar a partir da interação entre as duas partes, e não de uma forma pronta e acabada. Tanto os professores em relação às grandes políticas, e os alunos em relação ao planejamento dos professores, são os piores executores daquilo que não gostaram e de que não participaram.
No vôlei, passar a bola para o outro não é uma necessidade do indivíduo, mas uma exigência do funcionamento do jogo; diferentemente do futebol
Universidade do Futebol – Como você vê, dentro do âmbito escolar e das próprias escolinhas de futebol, a possibilidade de instrumentalizar o futebol para integrar novos conhecimentos?
Sávio Assis – Acredito que isso seja não só possível, mas necessário. Também não podemos concordar que o aluno aprenda tudo sobre futebol, mas não aprenda a jogar. Fazemos essa inflexão, que vai de uma restrição a outra, quando se avalia muitas vezes os aprendizados motores do jovem, esquecendo regras, táticas, etc.
Agora, para alcançarmos este ponto, o professor ou a pessoa que estiver à frente do projeto tem de se envolver com as outras áreas e com as outras questões do espaço no qual ele estará atuando. Professor de Educação Física não pode mais ficar no quintal da escola: ele precisa estar envolvido com o conjunto da mesma, fazendo com que a escola olhe para as possibilidades da sua atividade de maneira diferente, além do senso comum.
Professor de Educação Física não é um mero organizador de eventos e festas. A identidade dele, antes de qualquer outra, é a de professor, assim como os professores de Matemática e o de Português têm as suas. O papel da escola na perspectiva de ampliar o repertório deve estar presente no ideal desse profissional. Ele aprende mais coisas e de maneira mais aprofundada.
Em um clube, a discussão é: o que o futebol, em particular, vai permitir de reflexão diferenciada em relação às outras situações? Muitas vezes elaboramos projetos de intervenção em uma comunidade através desse esporte e falamos de muitas promessas – tirar das ruas, afastar das drogas, etc. – como se fossem questões específicas do futebol ou de outra modalidade esportiva. E se você trocar o futebol por profissionalização, os argumentos vão ser os mesmos.
Muitas vezes se fazem muitas promessas em nome do esporte e do futebol como se fossem inerentes a eles essas condições, e não é. Sempre insisto também sobre o que é particular e próprio de cada modalidade que permite ajudar em uma reflexão mais ampliada além do aprendizado técnico e tático.
Por exemplo, no voleibol, passar a bola para o outro não é uma necessidade do indivíduo, mas uma exigência do funcionamento do jogo. Talvez este esporte não sirva tanto para trabalhar a ideia de compartilhar. Ele pode servir, sim, mais para aprendermos a compreender o erro – alguns autores já trabalharam essa ideia. A partir do saque, caso ninguém erre, o jogo pode se tornar monótono. A expectativa do rally em um jogo de vôlei é a iminência do ponto se confirmar.
Agora, futebol, basquete, handebol, eu não tenho a obrigação de passar a bola para o outro, com uma ou outra limitação da regra. Compartilhar, neste caso, tem de ser trabalhado sob a ótica da tática para ganhar o jogo, além da exploração do sentido de solidariedade e participação coletiva. O futebol tem elementos particulares que podem ser arrancados para uma reflexão mais específica, a partir do funcionamento das suas ações.
O conhecimento é isto: acesso e valores, além do uso social. Aprendo a ler e a escrever para me comunicar, por formas diversas. Aprender a jogar futebol tem de ultrapassar a fronteira dos aprendizados técnico e tático, mas eles também têm de ser compreendidos, para não irmos ao outro extremo.
A cada dia estou mais convencido de que todos podem aprender, ao seu tempo e ao seu ritmo específicos. Os alunos não são burros ou inteligentes, limitados ou superdotados – eles são diferentes. E temos de aprender a conviver com essas diferenças, preferencialmente fazendo com que os diferentes atuem no mesmo tempo e no mesmo espaço.
Algumas escolas, ainda hoje, fazem isso. Segmentando alunos melhores em classes A, B e C. Mas na hora de avaliar, a direção cobra todo mundo da mesma maneira, sem levar em conta os processos de aprendizado diferente, algo incoerente.
Há muito que se fazer, dentro e fora desse ambiente, aproveitando esse interesse que as crianças têm sobre o futebol. Não desmontando os sonhos delas, mas dando mais elementos para sonhar, sem ilusões, com algumas metas, partindo de uma realidade. E que no jogo de futebol a criança aprenda que o melhor para ela tem de ser o melhor também para os que estão ao lado.
É preciso também respeitar o outro, que não é um inimigo, mas um adversário temporário daquilo que eles elegeram como atividade para se reunir, aprender e viver uma das possibilidades da cidadania.
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Benê Lima