Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

domingo, novembro 29, 2009

Rodrigo Rezende, do Paraná Clube
Preparador físico comenta sobre metodologia, interação com a base e uso dos scouts técnicos
Bruno Camarão

A carreira de Rodrigo Rezende está intimamente ligada ao Paraná Clube. Há sete anos na agremiação tricolor, transitou por várias categorias da base até alcançar um posto no departamento de futebol profissional – primeiro sendo assistente, depois consolidado como preparador físico principal.

Graduado em Educação Física pela Universidade Tuiuti do Paraná, em 2002, Rodrigo se especializou em Treinamento Desportivo pela Universidade de Londrina (UEL), sua cidade natal, um ano depois.

Um trabalho acadêmico de conclusão de curso, voltado às especificidades da concentração de uréia em atletas, conduziu-o ao ingresso no futebol. Caio Júnior foi o primeiro treinador com quem trabalhou. Isso quando ambos estavam iniciando suas funções, ainda no departamento amador, no qual Rodrigo pôde desenvolver uma metodologia específica. A realidade do futebol nacional, amparado por uma cultura de resultados, entretanto, já foi sentida.

“Hoje existe uma apostila maravilhosa de trabalho, e mesmo assim quem coordena a preparação física tem a liberdade para criar seus exercícios e treinos. Apenas controlamos a quantificação dos conteúdos para realmente haver uma evolução no processo de formação”, explicou, nesta entrevista à Universidade do Futebol.

“No profissional, ainda estou pensando como fazer isso. O problema é que só neste ano trabalhei com cinco treinadores distintos e o rodízio de atletas é constante...”, lamentou Rodrigo, ciente das dificuldades.

Rodrigo ainda possui atuação docente no Centro Universitário Campos Andrade (Uniandrade) e na própria universidade onde se formou, ambas no curso de Educação Física, e na pós-graduação do curso de Especialização em Futebol (Cepdap).

Dentre outros temas, fala sobre o monitoramento do volume individual de jogo sobre cada atleta que efetua, o desenvolvimento dos treinos “físicos-técnicos” e a intenção do Paraná Clube de contar com o auxílio de uma psicóloga durante toda a temporada de 2010.

Universidade do Futebol – Sua carreira é basicamente ligada apenas ao Paraná Clube. Em primeiro lugar, conte um pouco sobre sua formação e a trajetória no futebol.

Rodrigo Rezende - No último ano de faculdade resolvi fazer uma pesquisa (monografia) com atletas de futebol. O objetivo era verificar o desgaste físico, dia a dia, com coletas de sangue e análise da concentração de uréia*.

Consegui, então, abertura na equipe de juniores do Paraná Clube. Fui chamado para auxiliar de preparação física daquela categoria em 2002, devido à excelente pesquisa. O técnico do time de base era o Caio Júnior, hoje no Catar.

O Caio inclusive me chamou para fazer um estágio no Palmeiras, quando ele comandou o time paulista. E depois recebi um convite do Carlinhos Neves, preparador físico do São Paulo, para ficar uma semana no CCT do clube do Morumbi.

Em 2003 fui efetivado como preparador físico do juvenil (sub-17): conquistamos o vice-campeonato estadual daquele ano; em 2004 fomos campeões metropolitanos; em 2005 fui promovido ao júnior, pelo qual novamente faturamos o vice estadual; em 2006 fomos campeões da Copa Tribuna contra o Atlético-PR, na Arena da Baixada, diante de 12 mil torcedores (0 x 2); e em 2007, enfim, nos sagramos campeões do Estadual de júnior, após um jejum de 11 anos sem esse título pelo clube.

Ainda em 2007, fomos à Porto Alegre para o Campeonato Brasileiro sub-20 e terminamos na terceira colocação, batendo o Grêmio nesta disputa - a final foi entre Cruzeiro e Inter, com a vitória dos mineiros.

Na base, ajudei ainda na formação de atletas, como o Eltinho (Flamengo, Japão, Avaí), o Giuliano (hoje capitão da seleção brasileira sub-20 e atleta do Inter), o Everton (Flamengo), o Maicossuel (Botafogo, Cruzeiro, Palmeiras), o Rodrigo Pimpão (Vasco da Gama) e o Thiago Neves (Fluminense, Japão, futebol do Oriente Médio).

Em 2008, fui promovido ao departamento profissional. Como a equipe caiu para a Série B do Brasileiro em 2007, no ano seguinte apostaram nas pratas-da-casa, e fui ao profissional como auxiliar da preparação física.
Já nesta temporada de 2009, o Paraná Clube me efetivou como preparador físico principal. Trabalhei com o Paulo Comelli, o Velloso, o Zetti, o Sérgio Soares e agora o Roberto Cavalo.

*A uréia é um substrato da degradação de proteína e pode ser uma variável de análise individual. Sendo assim, aqueles atletas que estavam com a concentração acima do limite estipulado pela bibliografia, eram submetidos a um período de treinamento de recuperação.

Universidade do Futebol – No início da temporada, após a saída do Manoel Santos, você, então auxiliar da preparação física profissional, assumiu a função principal. Como você encontrou o grupo à ocasião e qual a avaliação do trabalho como um todo, já se aproximando do fim da Série B do Campeonato Brasileiro?

Rodrigo Rezende – Para o Campeonato Paranaense, o Manoel foi contratado a pedido do treinador Paulo Comelli. Ele havia participado da campanha de acesso do Atlético-MG com o Levir Culpi.

Foi difícil meu início de trabalho, pois o time estava mal na competição e, após a saída do Manoel, passamos algumas rodadas sem conquistar bons resultados. Então, o Comelli saiu do comando. Veio o Velloso só para terminar o Estadual, que terminamos em quinto lugar – até que a equipe evoluiu bastante, pois passamos boa parte da competição entre os três últimos colocados.

Infelizmente todos foram embora ao final do Paranaense. Na semana seguinte, foram contratados 14 atletas em diferentes condições, além do técnico Zetti. Sofremos no início da Série B.

A estreia foi contra o Bahia em Salvador com apenas cinco dias de treinos: uma loucura. No meio do primeiro turno, com uma nova mudança da comissão técnica, o Sérgio Soares foi contratado e com ele veio o preparador físico Stélio Metzker, e eu tive que voltar a ser auxiliar.

Por fim, houve a última troca: chegou o Roberto Cavalo e já são nove jogos sem derrotas, e em 13 jogos só perdemos duas vezes (para Portuguesa e Figueirense, ambos em casa)**.

**Dados referentes até a penúltima rodada da Série B do Campeonato Brasileiro – empate por 2 a 2 com o Vila Nova, em Goiânia. Na despedida do certame, o Paraná Clube recebe o já rebaixado Fortaleza.

Rodrigo orienta treinamento entre os profissionais: vida do preparador físico está ligada ao Paraná Clube

Universidade do Futebol - E como é que se pode traçar no início do Campeonato um plano de auge do desempenho fisiológico do grupo, se, no meio da competição, muda-se a comissão técnica e há variação em termos de contratação e venda de atletas?

Rodrigo Rezende - É complicado, mas existe, sim, uma estratégia. Eu uso sempre um “slogan” de trabalho: POP, no qual o 1º “P” é de Planejamento; o “O” é de Organização e o 2º “P” é de Profissionalismo.

Há vários "picos" durante sete meses de campeonato. Trabalho com a forma de dar primeiro uma boa base de resistência e força, e depois priorizo a resistência especial (situações de jogo), resistência de força e posteriormente potencia e velocidade.

O tempo de trabalho em cada capacidade depende muito do tempo hábil que você tenha para trabalhar, condição do elenco e necessidades individuais

Universidade do Futebol – O objetivo explícito do Paraná era alcançar o acesso à primeira divisão do futebol nacional, competição que não disputa desde 2007. Há diferenças em se realizar um projeto dentro da área de preparação física na elite e na divisão de acesso?

Rodrigo Rezende - O futebol é um só, porém na primeira divisão o estilo de jogo e a qualidade técnica dos atletas entre as equipes variam bastante. Na Série B, acredito que seja mais nivelado e é uma disputa em que a preparação física realmente decide muitos jogos

Tivemos viagens difíceis, como até Caxias do Sul, para enfrentar o Juventude, Ipatinga, quando pegamos avião até Belo Horizonte e depois mais quatro horas de estrada sinuosa. Sem contar a mudança de clima constante entre as regiões do nosso país.

Universidade do Futebol – Como se dá a interação entre a preparação física e comissão técnica, departamentos médico e de fisiologia, e com o próprio trabalho realizado nas categorias de base, local por onde você passou durante vários anos?

Rodrigo Rezende - Há uma interação maravilhosa entre os departamentos da preparação física, a fisiologia e o departamento médico. As avaliações da fisiologia são bem claras e divulgadas com médias e índices - o objetivo é dar o “norte da bussola” à preparação física.

Quando um atleta se lesiona, existe uma padronização do tratamento em relação a cada lesão, e criamos quatro ciclos de reabilitação na preparação fisica.

Dependendo da gravidade da lesão e/ou do tempo de inatividade, o atleta fica os quatro ciclos (referência a quatro semanas) treinando separadamente. Se for algo de baixa gravidade, este atleta fica em um ou dois ciclos de recuperação, por exemplo.

Há uma característica peculiar de cada:

1 - ênfase em resistência geral e localizada
2 - força e resistência de força
3 - velocidade e resistência de velocidade
4 - específico (ênfase nos trabalhos técnicos)

Universidade do Futebol – Pensando na evolução do departamento de futebol, qual é a importância da longevidade do preparador físico? Considera interessante o profissional responsável pelo condicionamento dos atletas acompanhar o treinador ou pensa que ele deveria ficar atrelado à agremiação?

Rodrigo Rezende - Eu acredito em um trabalho de médio e longo prazo. Quando o preparador físico se mantém no clube, tudo fica mais fácil. Pois a metodologia e a linha de trabalho se mantêm.

Quando chega um novo treinador, o trabalho pode ser conduzido de maneira muito mais facilitada. Por outro lado, para mim, uma equipe só obtém resultados satisfatórios quando há uma sintonia entre preparação técnica e preparação física.

Os treinadores devem sempre traçar objetivos em cada treino, como fazemos na preparação física.

Não adianta nada aplicar um coletivo só por aplicar. É necessário traçar objetivos defensivos, ofensivos, estratégia em relação ao adversário, etc.

O mesmo vale para trabalho de finalização sem monitoramento do número de chutes de cada atleta e seu respectivo aproveitamento.

Em qualquer trabalho há um metabolismo fisiológico envolvido e é necessário se ter um “efeito positivo de carga”, ou seja, se eu fizer um trabalho glícolítico*** nos dias que antecedem a partida, é sinal de um comprometimento para o jogo.

O coletivo, por exemplo, é um simulado de um jogo. Portanto, se há dois jogos na semana, um coletivo pode prejudicar a performance nos jogos. Nessas ponderações que se justifica a sintonia entre as preparações técnica e física.

Gosto muito de monitorar o volume individual de jogo - quantos minutos cada atleta jogou (jogo a jogo e ainda o somatório). Devemos estar sempre atentos ao acúmulo de partidas, o que compromete a performance do atleta.

Estou desenvolvendo treinos chamados de “físicos-técnicos”, nos quais em uma mesma sessão trabalhamos objetivos dessas duas vertentes. O atleta treina muito mais alegre quando há a presença da bola nas atividades físicas.

Há treinos com bola que, inclusive, podem ser muito mais intensos do que alguns chamados de treinos físicos.

***Para GODIK (1996), é fundamental a importância dos mecanismos anaeróbicos glicolíticos, de maneira que durante o tempo de jogo o jogador realiza em torno de 100 arranques com máxima velocidade em curtas distâncias, com o objetivo único de vencer o adversário no tempo e no espaço. "Se o nível da resistência de velocidade dos jogadores for alta, então a velocidade destes arranques no início, no meio e no fim dos períodos de jogo serão mais ou menos iguais. Se isso não ocorrer, então ele diminuirá" GODIK (1996, p.123).

Universidade do Futebol – Qual a fronteira entre a participação do preparador físico no amparo psicológico aos atletas, e o trabalho propriamente dito de um profissional específico da área? Você aborda conceitos de auto-ajuda e neurolinguística no trabalho diário do Paraná?

Rodrigo Rezende – Esse é um tema que me agrada muito. Estamos contactando a psicóloga do esporte Beatriz Dorigo (formada em Piscologia e em Educação Física) para 2010. Mas quero fazer um curso de PNL (Programação Neurolinguística).

Com o Velloso, realizei esse trabalho nas concentrações, com dinâmicas de grupo, mas há uma barreira, sim.

Indiretamente eu abordo muito conceitos de auto-ajuda e neurolinguística. Por exemplo: busco particularidades dos atletas e, aos poucos, vou relembrando fatos positivos que cada um já viveu. Além disso, com o uso de expressões verbais particulares.

Devemos sempre dizer “coragem”, ao invés de “não tenha medo”; “vamos ganhar”, e não “não podemos perder”. Situações simples, mas que fazem adiferença.

Trabalhos psicológicos são fundamentais para o desempenho dos atletas

Existe um curso chamado coaching, parece ser interessante. Eu quero crescer nesta área, mas meu perfil como preparador físico é mais voltado à força e à velocidade.

Procuro focar a resistência aeróbia nos treinamentos com bola. Meu atleta não corre ao redor do campo, pois ele fica saturado com isso. É necessário ser criativo.

Procuro fazer disputas sadias entre eles, muitas vezes entre pequenos grupos. Treinos novos, com objetivos e metas.

Um exemplo: já levei um dado para o campo e, no fim de um treino físico, cada atleta jogou o objeto para o alto. Caindo número ímpar, ele faria mais repetições, se caísse número par, menos.

Ou quando estiver faltando seis repetições de determinado exercício ou seis tiros de velocidade, joga-se o dado: o número obtido passaria a ser o número repetições a serem realizadas. É muito divertido para os atletas, que passam a trabalhar com muito mais alegria.

Universidade do Futebol – A adaptação fisiológica que o atleta vai ter será específica da posição? Ou a própria característica do jogador para o modelo de jogo do treinador o levará a essas particularidades? E como as capacidades do atleta, de uma forma geral, serão relacionadas à forma coletiva, na aplicação do futebol “formal”?

Rodrigo Rezende - Em relação à musculação, faço toda semana entre uma e duas sessões semanais, trabalhando membros superiores e inferiores.

Utilizo a cada 15, 20 dias o core training, onde objetivamos prevenir lesões e equilibrar a musculatura. São exercícios de estabilização (isometria) e dinâmicos (concêntricos), com ênfase no abdome.

Essa parte do corpo, entre o tórax e a bacia, é pouco trabalhada nos treinamentos, porém exerce uma função importante no futebol. Um abdome fortalecido evita a sobrecarga à pelve (assoalho pélvico), evitando a pubalgia (inflamação do púbis). Além disso, auxilia na correção postural do atleta.

O adutor também deve ser fortalecido, com o mesmo objetivo de evitar sobrecarga local****.

Quando digo fortalecimento, quero dizer RML (resistência muscular localizada), em que trabalhamos com certo volume, porém com baixa intensidade (carga).

****Ao lado de Juvenilson de Souza e Márcio Henriques, dois outros preparadores físicos, Rodrigo Rezende está escrevendo um livro didático com mais de 70 treinos físicos. A supervisão é do consultor esportivo Antonio Carlos Gomes. A obra, da editora ArtMed, deverá ser lançada até o fim de junho do ano que vem.



Constante troca de treinadores na comissão técnica principal foi um dos entraves para o desenvolvimento do trabalho na temporada 2009


Universidade do Futebol – Durante o mês de maio, em meio à disputa da Série B, você explicou em uma entrevista que iria dosar as cargas de treinamento quando fosse possível e se utilizar da crioterapia, após as partidas, como forma de recuperar os atletas. Qual a avaliação que faz desse método?

Rodrigo Rezende - Confesso que nunca escrevi nada sobre o assunto. Mas na prática tem dado muito resultado. A crioterapia é realizada de forma bem funcional, podendo ser aplicada em pequenas piscinas ou em tambores individuais. A temperatura da água fica entre 10 e 12º C e o atleta permanece com os membros inferiores submersos durante sete a 10 minutos.

Alguns não gostam do procedimento em si, mas todos adoram a sensação nas 48 horas próximas. A recuperação é muito bacana de acordo com o relato dos próprios jogadores.

Eu acredito que a vasoconstrição favoreça a remoção do lactato e demais toxinas. Segundo Fox, em no máximo duas horas, 100% do lactato é removido, sendo 75% na primeira hora. Portanto, no dia seguinte ao jogo, eu prefiro a banheira de água quente (vasodilatação), com o relaxamento e o fluxo sanguíneo.

Universidade do Futebol – Em alguns de seus artigos, você expõe dados a partir de scouts técnicos. Qual a funcionalidade prática desse suporte tecnológico para o desenvolvimento do trabalho de campo com os atletas do Paraná Clube?

Rodrigo Rezende - O scout técnico é da área técnica. Mas como eu dava aula em faculdades em Curitiba, comecei a levar meus alunos aos jogos para coletar dados.

Formei, então, um grupo de acadêmicos que são remunerados por jogo – algo muito organizado, com um coordenador do grupo. Vinte e quatro horas após a partida, a comissão técnica recebe todos os dados em questão, com uma série de detalhes.

Colocamos em edital no vestiário dos atletas de forma muito direta. Posteriormente, são discutidos pontos relevantes nas reuniões entre todos. E é a melhor forma da cobrança, pois são estatísticas, e não opiniões. Os atletas, treinador e assistentes gostam muito. A diretoria, também.

Veja um exemplar de scout referente ao Campeonato Paranaense deste ano


Universidade do Futebol – O que diferencia hoje o trabalho entre preparadores físicos no Brasil, já que hoje o conhecimento está muito mais acessível? Existem modelos e métodos diferentes sendo aplicados por diferentes preparadores físicos no nosso país? Isso pode ser o diferencial para que algumas equipes vençam mais do que outras?

Rodrigo Rezende - O segredo é saber individualizar ao máximo a carga de trabalho do elenco (idade, volume de jogo, histórico de lesões, etc.). Além disso, muitos preparadores físicos se preocupam com os treinos e muitas vezes o diferencial é justamente a recuperação. A diferença está no planejamento, ou seja, quantos treinos haverá no mês, quantos serão físicos, quantos serão técnicos...

É muito importante saber escolher os meios e métodos de treinamentos para atingir determinado objetivo.

Eu acredito que o que diferencia mais é justamente o preparador físico fazer com que o elenco acredite no seu planejamento e na sua estratégia para a evolução física do grupo. Uma forma de conscientização, de treinar entendendo o porquê, fazendo o trabalho com prazer.

Universidade do Futebol – Você acompanha o que se vem fazendo na Europa em termos de preparação física? Quais inovações e caminhos ela (a preparação física) tem tomado por lá?

Rodrigo Rezende - Poderia acompanhar mais. Estou mais focado no Brasil, até pelo fato de o calendário competitivo ser bem peculiar. Para mim, o planejamento está extremamente ligado ao calendário competitivo.

Mas pensando nos treinamentos de forma isolada, acredito que podemos crescer muito como alguns países.

Já observei treinos pliométricos que me enriqueceram. O que sei é que na Europa eles treinam muito menos do que aqui.

Universidade do Futebol - Treina-se menos, ou se treina diferente?

Rodrigo Rezende - Em geral, treina-se menos. Mas se treina diferente, também. O Mourinho, por exemplo, foca todos os treinamentos de forma tática, ou seja, a forma como a equipe vai atuar.

Considero-o um treinador moderno, mas ainda acredito ser um pouco difícil aplicar alguns de seus conceitos no Brasil.

Universidade do Futebol - Por que?

Rodrigo Rezende - A cultura do atleta brasileiro ainda dificulta a aplicabilidade do processo. Não subestimando nossos jogadores, mas teremos dificuldade. Não sou contra, mas acredito que nossos técnicos necessitam de uma melhor formação também.

Acredito que todo técnico deveria colocar seu treinamento no papel antes de sua aplicabilidade com duração e objetivo. Muitos criam na hora, ou sempre são as mesmas coisas.

Utilizo muito os aquecimentos dos treinos para atingir determinado objetivo. Às vezes aprimoro coordenação, velocidade de reação, por intermédio de exercícios de aquecimentos, sem os atletas perceberem. Mas tem um objetivo. Não concordo em aquecer por aquecer.

Universidade do Futebol – Na Holanda, por exemplo, não há a figura do preparador físico, e sim a do assistente-técnico. Como é a sua relação de estruturação de trabalho com o treinador? Como o treino é estruturado?

Rodrigo Rezende - Na preparação física, utilizo o mesociclo. Tenho um planejamento mensal todo detalhado.

Na área técnica, normalmente eles [comissão técnica] realizam por semana. Então eu defino quais os dias e períodos da semana se trabalhará a preparação técnica e tática e fica a critério do treinador qual o tipo de treinamento a ser aplicado. Mas eu sempre oriento quanto à duração.

Por exemplo: não deixo a realização de finalização em gol após um treino cansativo; coletivo apenas quando há um jogo por semana e apenas 48 horas antes da partida.

Vou dando sugestões e justificando aquela opinião. Mas gostaria de criar uma padronização como criei na base.

No departamento amador, desenvolvi uma metodologia específica de trabalho para cada categoria que está em vigor até hoje.

Quantos treinos semanais cada categoria dever realizar (categorias pré-infantil, infantil, juvenil e júnior); quantas sessões na semana, no mês e no semestre de musculação, força, velocidade, resistência aeróbia, RML, potência, etc.; e ainda quantos coletivos, treinos táticos e de fundamento.

Hoje existe uma apostila maravilhosa de trabalho, e mesmo assim quem coordena a preparação física tem a liberdade para criar seus exercícios e treinos. Apenas controlamos a quantificação dos conteúdos para realmente haver uma evolução no processo de formação.

No profissional, ainda estou pensando como fazer isso. O problema é que só neste ano trabalhei com cinco treinadores distintos e o rodízio de atletas é constante...


Rodrigo Rezende utiliza-se do futevôlei como atividade no cotidiano paranista e vê falta de treino de fundamentos entre os profissionais

Universidade do Futebol - O Paraná possibilita aos seus profissionais das categorias de base intercâmbio de informações com membros outros clubes do país ou do exterior? O clube oferece cursos de aperfeiçoamento e capacitação à disposição dos profissionais ou isso é um processo individual?

Rodrigo Rezende - Infelizmente na base ainda não realizam intercâmbio ou cursos. Mas já há projetos para 2010 com esse objetivo.

Universidade do Futebol - Como jogos recreativos e/ou esportes relacionados ao futebol (como o futevôlei e o futsal, por exemplo) podem auxiliar na preparação física do futebol profissional?

Rodrigo Rezende - O futsal é uma modalidade em que não há irregularidade no piso, facilitando a execução dos fundamentos. As dimensões são menores e o atleta tem a participação muito maior na aprendizagem motora.

Já o futevôlei exige um maior domínio em relação à bola e à propriocepção, porém não há uma relação no comportamento de jogo do futebol.

Ambos auxiliam muito na prática da nossa modalidade profissional. Acredito ainda que elas se completam. Tanto que gosto muito de aplicar o futevôlei na categoria principal.

Os treinamentos de fundamentos devem ser realizados inclusive no profissional. Como em esportes coletivos de quadras, nos quais há esse procedimento.

No futebol é muito difícil você encontrar um treino apenas de fundamentos. Isso tem que mudar.

Universidade do Futebol - Fale um pouco sobre a importância de o jogador ser capaz de realizar diversas funções. Qual é a relevância desse tipo de atleta e da sua multifuncionalidade no futebol atual e qual a importância da preparação física para esse quesito?

Rodrigo Rezende - Esse tipo de atleta tem se tornado fundamental para o futebol moderno. Temos como exemplo o Leonardo, que hoje é técnico do Milan, o Julio Baptista, da Roma e, no meu time, o Toscano.

O treinador pode mudar completamente a forma de atuar sem precisar realizar uma substituição.

Em relação à preparação física, há uma necessidade de esse atleta estar sempre nas suas melhores condições físicas, pois além dele ser importante em várias posições, dificilmente deverá ser substituído.

Em termos fisiológicos, não tem problema um atleta acumular muito ou rapidamente o lactato - o importante é este tolerar o acúmulo da substância durante a atividade por um maior período de tempo.

Isso varia de caso a caso, mas podemos dizer que acima de 4 mmol, o atleta está no limiar anaeróbio (transferência do metabolismo aeróbio para o metabolismo anaeróbio).

Alguns atletas não conseguem ficar muito tempo com esse acúmulo. Outros ficam muito tempo em atividade no metabolismo anaeróbio. Com a lembrança de que o futebol apresenta o metabolismo misto.

Universidade do Futebol – Em se considerando a integração dos trabalhos físicos e táticos aplicados, nessa perspectiva, como você vê a inserção do preparador físico na comissão técnica daqui a alguns anos? Você acredita que existe chance de essa função perder sua aplicação?

Rodrigo Rezende - Acho difícil [deixar de existir a função]. Os técnicos devem passar por um processo de evolução científica muito grande. No Brasil, os ex-atletas sempre serão prioridade no mercado de trabalho. Mas seria interessante estes passarem por uma faculdade de Educação Física.

Acredito que nós ensinamos muito aos treinadores, mas tenho a convicção de que os ex-atletas ensinam muitos preparadores físicos em situações práticas, nas quais haja necessidade de uma tomada de decisão rápida.

Universidade do Futebol - Qual é a relevância da universidade para o diálogo e para a melhoria da atuação do profissional de preparação física?

Rodrigo Rezende - Acredito que a universidade é de altíssima relevância para o profissional de preparação física. Desde comportamento, linguagem, disposição, postura, até organização do trabalho, embasamento teórico e prática de estágio. Acredito na parte teórica antes da prática, e vejo a necessidade de todo preparador físico ter seu plano de cada treinamento.

Entre os anos de 2005 e 2008 estive dando aulas na Uniandrade e na Universidade Tuiuti do Paraná, além de ter ministrado aulas de pós-graduação na Especialização em Futebol (Cepdap). Foram experiências gratificantes.

Universidade do Futebol - Qual é a contribuição que um evento como a Copa do Mundo de 2014 pode trazer para o Brasil, mudando a maneira de se enxergar o futebol e de atuar dentro da modalidade?

Rodrigo Rezende - Acredito que a Copa do Mundo no Brasil vai valorizar muito os profissionais do nosso país. O profissional que souber falar mais de um idioma terá oportunidade de auxiliar muito as delegações que estão por vir.

Torço para que estimulem a melhoria de nossa estrutura, como estádios com mais segurança, melhor conforto, áreas de acesso para portadores de necessidades especiais, áreas médicas, áreas de aquecimentos, estacionamentos, etc.

Além de centros com condições de atender os treinamentos das delegações. Atualmente, acredito que temos apenas cinco ou seis clubes com CTs em condições ideais para o evento.

Bibliografia

FOX, Edward L.; BOWERS, Richard W.; FOSS, Merle L. Bases fisiológicas da educação física e dos desportos. 4 ed, Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991.

GODIK, M. Alexandrovic. Futebol: preparação dos futebolistas de alto nível. Londrina: Grupo Palestra Sport, 1996.

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