FATOS, DESAFIOS, LEMBRANÇAS E DECEPÇÕES
Paulo Medeiros*
FATOS. No último dia 1º de dezembro o Santos FC tornou-se bicampeão da Copa do Brasil de Futebol Feminino. Foi uma campanha arrasadora da equipe feminina de Vila Belmiro: 7 jogos, 7 vitórias, 49 gols pró, 1 gol contra, e ainda teve as duas artilheiras da competição (Marta e Cristiane), que também foram escolhidas, respectivamente, a melhor e a segunda melhor jogadora da Copa. Parabéns á equipe do litoral paulista.
DESAFIOS. Agora é tentar manter o nível de qualidade da equipe para a disputa do mundial interclube de futebol feminino, que provavelmente será antecipado de abril para março/2010. É uma tarefa difícil, já que a equipe brasileira terá que competir financeiramente com o Los Angeles Sol, equipe norte-americana que detém os direitos federativos de Marta, e com o Chicago Red Stars, outra equipe norte-americana que mantém um pré-contrato com a atleta Cristiane, e que são, sem nenhuma dúvida, as principais responsáveis pelo espetacular desempenho da equipe feminina de futebol do Santos FC no segundo semestre do ano que se encerra.
LEMBRANÇAS. Muito se fala sobre a infame “memória curta” do brasileiro quando se trata, por exemplo, de reeleger políticos corruptos ou crucificar técnicos de futebol, vencedores de campeonatos recentes, após duas ou três derrotas de seus times. Em minha opinião, esta afirmação de “memória curta do brasileiro” é outra denominação casuísta para “manipulação de massa”. É através desta prática que os políticos corruptos conseguem convencer seus incautos e ingênuos eleitores de que a “suposta corrupção” não passa de uma campanha sórdida de adversários políticos. E é também através desta prática que, em determinadas situações, alguns ditos “formadores de opinião” contagiam torcedores e diretores de clubes com comentários direcionados exclusivamente a derrubar técnicos que não contam com a sua simpatia.
Quando lembrados, todos os torcedores brasileiros se orgulham da fantástica campanha da seleção de futebol feminino no último campeonato mundial e nas Olimpíadas de Pequim, quando foi vice-campeã em ambas, e do excepcional desempenho vitorioso nos Jogos Pan Americanos do Rio de Janeiro. Inegável a alegria e o prazer contagiante que sentíamos ao ver nossas garotas e mulheres pela TV, jogando nestas competições um futebol vibrante, determinado e espontâneo, beirando o altruísmo. Bem diferente do futebol masculino profissional atual, mais marcado por mercenários de todos os tipos e níveis (técnicos, juízes, dirigentes e jogadores) do que pela paixão pelo futebol. Para estes, mais vale preservar-se de “bolas divididas”, afinal, ganhando ou perdendo seu salário estará sempre depositado na conta bancária ao final ou começo do mês.
Temos que nos despir da hipocrisia e constatar que precisamos nos espelhar na garra e na vontade destas garotas e mulheres, que buscam o merecido reconhecimento de seus esforços e talentos em verdadeiras batalhas, não contra adversários dentro das linhas do gramado, mas enfrentando preconceitos simplesmente porque ainda existe a presunção da maioria dos dirigentes (de clubes e patrocinadores) de que “mulher e futebol não combinam”.
Poder-se-ia o prezado leitor questionar: isso não existe, é um absurdo afirmar que ainda ocorre este preconceito. A este respeito devolvo a dúvida com outro questionamento: afora as transmissões motivadas pelo “efeito Marta” nas partidas do Santos FC, o caro leitor lembra-se de ter assistido na TV alguma partida de futebol feminino em 2009? Tivemos a transmissão de incontáveis jogos e torneios das várias categorias de futebol masculino (sub-15, sub-17, juvenil, profissional, máster, etc), dos campeonatos italiano, alemão, francês, argentino, inglês, português, japonês e até da Turquia (com todo respeito)... mas de futebol feminino, como diria meu saudoso avô, necas de piti biriba.
Mais uma vez poder-se-ia questionar: mas não existem campeonatos femininos interessantes para as redes de TV no Brasil. Aí cria-se um circulo vicioso: não é interessante porque não consegue patrocínio, e não existe patrocínio porque não é interessante. É preciso iniciativas inovadoras e corajosas como a do Santos FC para fazer ruir este círculo vicioso.
DECEPÇÕES. No Estado do Ceará então, a situação do futebol feminino beira o ridículo e inaceitável. A Liga Cearense de Futebol Feminino-LCFF, juntamente com uma ou duas entidades igualmente abnegadas e esforçadas defensoras do desenvolvimento desta prática esportiva por estas paisagens, constantemente vêem suas idéias e esforços serem barradas justamente pela falta de patrocínio e, principalmente, pela falta de apoio institucional e financeiro daqueles que deveriam ser seus principais parceiros nesta empreitada: a Federação Cearense de Futebol e a Secretaria Estadual de Esportes.
Permito-me ressaltar que não se trata de críticas gratuitas e oportunistas. Lembro ao prezado leitor que em artigo anterior (A CÉZAR O QUE É DE CÉZAR... A FERRUCIO O QUE É DE FERRUCIO), publicado neste mesmo espaço gentilmente cedido pelo brilhante comentarista e locutor esportivo Benê Lima, tive a oportunidade de levar ao conhecimento público algumas injustiças cometidas levianamente contra a Sesporte e seu dirigente máximo. É uma constatação simples e objetiva: NÃO EXISTE BOA VONTADE E NEM INTERESSE DA FCF E DA SESPORTE EM AJUDAR NO DESENVOLVIMENTO DO FUTEBOL FEMININO NO ESTADO DO CEARÁ.
Poderia citar várias supostas razões para esta afirmação, mas vou usar do jargão popular mais apropriado para citar a principal: futebol feminino no Ceará “não dá ibope político”. Se assim não o fosse, o planejamento da LCFF de realizar o 1º Torneio Estadual de Futebol Feminino durante o período de recesso do futebol profissional masculino já teria saído da fase de “idéia” e estaria sendo executado. Ou alguém tem dúvidas do apelo motivacional para os torcedores de Juazeiro do Norte, por exemplo, ao saber que sua equipe feminina jogará contra a equipe feminina de Caucaia, no estádio Romeirão, em torneio cujo campeão irá representar o Estado em uma determinada competição nacional?
Temos no Ceará uma equipe de futebol feminino (Caucaia EC) que está entre as oito melhores a nível nacional, status conquistado na última Copa do Brasil da categoria. E este feito foi realizado com quase nenhum apoio das entidades do esporte estadual.
Permitam a estas garotas e mulheres praticantes do futebol feminino do Ceará demonstrar seus talentos e teremos em curtíssimo prazo uma representatividade do Estado ainda mais digna nas competições nacionais, e com certeza até com algumas destas atletas integrando a seleção canarinho. A bem da realidade fica uma pergunta para reflexão de dirigentes e patrocinadores: no futebol masculino teremos condição de projetar nacionalmente algum clube, e conseqüentemente seu patrocinador, em curto ou médio prazos?
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Benê Lima