Sinopse

"Neste espaço encontra-se reunida uma coletânea dos melhores textos, imagens e gráficos sobre o futebol, criteriosamente selecionados e com o objetivo de contribuir para a informação, pesquisa, conhecimento e divulgação deste esporte, considerando seu aspecto multidisciplinar. A escolha do conteúdo, bem como o aspecto de intertextualidade e/ou dialogismo - em suas diversas abordagens - que possa ser observado, são de responsabilidade do comentarista e analista esportivo Benê Lima."

sexta-feira, dezembro 25, 2009

Leon Claudio Myssior, vice-presidente de Arquitetura do Sinaenco
O importante da Copa de 2014 será o Brasil que se terá em 2015. É essencial planejar bem
Marcelo Iglesias

Mais do que construir ou modernizar arenas, os requisitos da Fifa exigem que o país-sede de uma Copa do Mundo possua uma eficiente rede de transportes (aeroportos, metrôs, sistemas rodoviário e portuário), estrutura hoteleira adequada e excelente rede de telecomunicações, além de hospitais, sistemas de segurança e energia em boas condições. Ou seja, a realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil é uma oportunidade única para o avanço do planejamento e para a renovação da infraestrutura do país.

Vice-presidente de Arquitetura do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), Leon Claudio Myssior destaca a fase de planejamento dos projetos que visam a realização da Copa no Brasil como essencial para o sucesso do evento. Ele coloca que o importante do torneio entre seleções é o Brasil que se terá em 2015, um ano após o acontecimento, visto que o evento será uma enorme vitrine para o país.

“Em nossa avaliação, a falta de planejamento e da cultura de planejar estão por trás da má aplicação do dinheiro público, das obras ruins e da falta de prioridade na alocação de recursos. Da mesma forma, é a nossa maior preocupação para a Copa em 2014, para a Olimpíada em 2016, e para o Brasil dos próximos 50 anos”, disse Leon Myssior, em entrevista exclusiva, por email, à Universidade do Futebol.

Dados da Fifa informam que cerca de 560 milhões de pessoas de 240 países assistiram pela TV a cada um dos jogos da Copa da Alemanha, em 2006, o que resultou em uma audiência acumulada de quase 30 bilhões de espectadores. Esse número supera até mesmo o das Olimpíadas de Pequim, em 2008, quando aproximadamente 4,4 bilhões de telespectadores assistiram ao evento.

Outros dados que apontam a Copa do Mundo como o evento esportivo de maior impacto são os que fazem referência ao turismo. Números da Administração Nacional de Turismo da China mostram que 450 mil turistas estrangeiros visitaram o país exclusivamente em função dos Jogos Olímpicos. Por sua vez, a Alemanha recebeu cerca de 1 milhão de estrangeiros com a Copa, segundo a organização do evento. No caso do país europeu, somente a arrecadação com o turismo foi de 1 bilhão de euros (não se levando em conta receitas como venda de ingressos, patrocínios e direitos de transmissão televisiva, por exemplo).

Esses números indicam que o Mundial é o acontecimento que tem maior apelo midiático e maior capacidade de gerar recursos para os setores direta ou indiretamente envolvidos em sua realização.

“É certo que a questão da sustentabilidade (em toda a sua amplitude) deva ser considerada não apenas nos projetos das arenas, mas em todos os projetos e intervenções envolvidas (infraestrutura, hospitalidade, mobilidade urbana, etc)”, comentou o entrevistado.

O Sinaenco abrange as empresas que prestam serviços de planejamento, estudos, planos, pesquisas, projetos, controles, gerenciamento, supervisão técnica, inspeção, discussão e fiscalização de empreendimentos relativos à arquitetura e à engenharia. O sindicato reúne cerca de 10 mil empresas instaladas no Brasil, mercado que possui faturamento médio anual da ordem de 1 bilhão de dólares, empregando cerca de 20 mil trabalhadores, 50% dos quais de nível superior.

Universidade do Futebol – Qual o papel do Sinaenco até a Copa de 2014 no Brasil?
Leon Myssior –
O Sinaenco (www.sinaenco.com.br) é uma entidade que zela pelas empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva em todo o país e, como tal, compartilha o olhar - e as preocupações - de seus associados com o planejamento e com os projetos que se pretendem para o evento.

A Copa do Mundo de 2014 representa para o Sinaenco uma oportunidade e, ao mesmo tempo, um desafio: a oportunidade de que o Brasil de 2015 seja muito melhor do que o Brasil de hoje (em termos de infraestrutura, mobilidade urbana, qualidade ambiental, etc); e o desafio de repensarmos o país a partir de planejamentos profundos e de longo prazo, priorizando investimentos e aplicando os recursos privados e públicos em projetos mais sustentáveis, mais racionais e contextualizados com os locais em que se encontram (para o qual temos um imenso know-how em nossas empresas e profissionais).

Neste contexto, o Sinaenco desponta como, possivelmente, a entidade mais comprometida em todo o território nacional, na medida em que não tem quaisquer outros interesses que não o aproveitamento amplo da oportunidade que se descortina para nosso país, na medida em que não representa fornecedores de materiais e/ou equipamentos.


A Copa do Mundo de 2014 representa para o Sinaenco uma oportunidade e, ao mesmo tempo, um desafio

Universidade do Futebol – Quais os reflexos práticos para os projetos das cidades-sede?
Leon Myssior –
Projetos de arenas esportivas guardam uma complexidade ímpar, pois são, ao mesmo tempo, um elemento arquitetônico incônico e polarizador de investimentos e desenvolvimento regional, instalações de grande porte com feição industrial, centro de shows e eventos, centro de compras e alimentação, e centros de mídia. Isto faz com que sejam obras complexas e caras, cujos impactos são sempre relevantes, em qualquer contexto urbano.

O Sinaenco vem provendo apoio institucional aos arquitetos, mas, mais do que isto, promovendo a integração entre os escritórios, e disponibilizando um rol de consultores que abrangem desde a questão da sustentabilidade e certificação LEED*, passando pela viabilidade econômica dos estádios, fornecedores de materiais, equipamentos, materiais e soluções de tecnologia.

Acreditamos que os projetos reflitam uma melhoria decorrente desta integração, da troca de experiências e das informações e conhecimentos apontados pelos consultores em nosso fórum.

*Nota da Redação: A certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design) é o que oficializa o conceito de construção sustentável, isto é, estabelece que um espaço foi construído, na sua concepção, construção e operação, com o uso de conceitos e procedimentos reconhecidos de sustentabilidade ambiental, proporcionando benefícios econômicos e para a saúde.

Universidade do Futebol – Qual o balanço que você faz dos debates regionais realizados durante 2008 e 2009? Terão sequência em 2010?
Leon Myssior –
O Sinaenco atua em frentes diversas, que vão desde o Fórum dos Arquitetos da Copa até a promoção de encontros multilaterais, passando pela recepção de missões comerciais de empresas estrangeiras interessadas no tema.

Todas essas atividades continuam não apenas em 2010, mas até 2016, ano da Olimpíada.

Nota da Redação: Para acompanhar de perto a preparação para a Copa de 2014, o Sinaenco desenvolveu ao longo de 2008 e 2009, nas cidades candidatas, encontros com autoridades públicas e empresários para discutir o planejamento das cidades para o Mundial. Para acompanhar o que foi discutido em cada uma das cidades-sedes, clique aqui.

Universidade do Futebol – Houve algum intercâmbio com especialistas sul-africanos ou alemães para troca de experiências que possam vir a ser valiosas para os projetos para a Copa no Brasil?
Leon Myssior –
A Copa do Mundo da Fifa é um evento de dimensão, relevância e alcance global, e, como tal, congrega atores de todas as partes do globo.

No que tange os projetos das arenas há contribuições alemãs (uma vez que a Copa da Alemanha desponta como um "divisor de águas" na história da Fifa), norte-americanas e britânicas.

Nota da Redação: O Sinaenco foi que iniciou a campanha para que o planejamento brasileiro para a Copa do Mundo de 2014 fosse iniciado o quanto antes, uma vez que o sindicato enxerga o torneio como uma oportunidade única para o avanço do planejamento em nosso país e para a renovação da infraestrutura de nossas cidades. Veja os encontros já promovidos pelo Sinaneco para discutir a Copa de 2014, clique aqui.


As Copas do Mundo dos EUA e da Alemanha, e o planejamento para a as Olimpíadas de Londres, em 2012, são as referências do Sinaenco

Universidade do Futebol – Nos últimos anos, tem-se usado muito os conceitos de sustentabilidade e legado para os mais variados projetos no Brasil e no mundo. Os projetos das cidades-sedes contemplam a aplicabilidade desses conceitos ou ficaremos na retórica?
Leon Myssior –
Todos os projetos das arenas abordam - e abraçam - a questão da sustentabilidade (não apenas a ambiental, mas também a social e a econômica), sendo esta uma das principais bandeiras do Fórum dos Arquitetos da Copa.

É certo que a questão da sustentabilidade (em toda a sua amplitude) deva ser considerada não apenas nos projetos das arenas, mas em todos os projetos e intervenções envolvidas (infraestrutura, hospitalidade, mobilidade urbana, etc), bandeira defendida fortemente pelo Sinaenco.

Nota da Redação: Sustentabilidade deve ser entendida a partir de três áreas, um tripé (ambiental, econômica e social) em que cada uma das bases tem a mesma importância. Para o Sinaenco, de acordo com o que foi apresentado por Leon Myssior, durante o Expo Estádio 2009, “é essencial que se realizem obras economicamente viáveis, que não prejudiquem irreversivelmente o meio ambiente, e que, principalmente, possuam algum resultado social, com a criação de empregos e a valorização das regiões onde elas localizam-se”.

Universidade do Futebol – Logo que o Brasil foi definido como o local que receberia a Copa de 2014, falou-se muito em Parcerias Público-Privadas (PPP). Contudo, pouco foi feito nesse sentido até o momento. Qual a sua avaliação? É um formato interessante e viável para os projetos das cidades-sede? O mercado, no geral, tem se mostrado interessado nesse formato?
Leon Myssior –
A Copa do Mundo é um evento privado, dirigido exclusivamente pela Fifa a partir da concordância irrestrita do país-sede (e de seus estados e municípios) com um conjunto de regras específicas.

Este contexto dificulta a adoção do modelo de Parcerias Público-Privadas para a construção dos estádios, na medida em que não é possivel saber de antemão quais as arenas que sediarão os jogos de abertura e encerramento, induzindo a um super dimensionamento de várias arenas, e prejudicando sua viabilidade econômica e financeira.

Somada a essa dificuldade, há uma superposição de objetivos, com as agendas políticas de cada estado e município.

Não obstante, se a aplicação do modelo de PPP apresenta dificuldades de aplicação quando trata-se das arenas, o mesmo não ocorre com as obras de infraestrutura, hospitalidade e mobilidade urbana, prometendo bons exemplos desse tipo de investimento.


Apesar de ter sido apresentada como uma possibilidade, as PPP para a construção e reformas de estádios encontram dificuldades de aplicação

Universidade do Futebol – Cuiabá é uma das cidades-sede que mais recebeu críticas, entre outros motivos, por não ter uma considerável representatividade no cenário futebolístico nacional para que tenha sido escolhida para receber os jogos da Copa do Mundo de 2014. Como a cidade está se preparando para que os seus projetos como, por exemplo, o do estádio que abrigará as partidas, não vire um “elefante branco”? E nas demais cidades-sede, como isso tem sido trabalhado?
Leon Myssior –
Este é, exatamente, o risco quando projetos políticos se interpõem (e/ou superpõem) ao planejamento e ao desenvolvimento regional, ignorando o contexto e as reais necessidades, em prol de interesses difusos e circiunstanciais.

Este é o caso de Cuiabá, mas também o de Manaus e, em menor escala, o de Natal e Fortaleza.

Leia o estudo do Sinaenco sobre a situação dos estádios brasileiros

Nas demais cidades-sede, buscam-se uma convergência entre o potencial esportivo e os investimentos previstos.


Cuiabá, Manaus e, em menor escala, Natal e Fortaleza, correm o risco de que seus estádios para a Copa de 2014 tornem-se "elefantes brancos"

Universidade do Futebol – Em 2007 foi realizado o 8º Enaenco , primeiro evento a debater a infraestrutura para a Copa de 2014, sob o slogan “Planejar é preciso”. Na sua avaliação, o slogan ainda se encaixa para o atual momento?
Leon Myssior –
Em nossa avaliação, a falta de planejamento e da cultura de planejar estão por trás da má aplicação do dinheiro público, das obras ruins e da falta de prioridade na alocação de recursos. Da mesma forma, é a nossa maior preocupação para a Copa em 2014, para a Olimpíada em 2016, e para o Brasil dos próximos 50 anos.

Nota da Redação: O 8º Enaenco buscou congregar autoridades e empresários no sentido de centrar o ano de 2008 para o planejamento e projeto da infraestrutura necessária, para que a Copa de 2014 seja um sucesso e que seu acontecimento proporcione um legado sem precedentes para o país.

As palestras das autoridades federais, estaduais e municipais, assim como dos empresários, durante o 8º. ENAENCO, convergiram todas para a percepção de que:

- A Copa 2014 é muito mais que um evento esportivo;

- É uma oportunidade ímpar para o Brasil dar um salto de desenvolvimento;

- É preciso planejar;

-O verdadeiro resultado da Copa é o Brasil de 2015;

- A responsabilidade pelos investimentos nos estádios e na hospitalidade será fundamentalmente do setor privado, sem recursos públicos;

- A responsabilidade pela infraestrutura será do Poder Público, mas deverá contemplar a participação privada, mediante concessões e PPPs.


Para o Sinaenco, a falta de planejamento e da cultura de planejar estão por trás da má aplicação do dinheiro público. Por isso, a ideia de pensar o quanto antes a Copa de 2014

Universidade do Futebol – Como você vê a mobilização da sociedade e a consequente fiscalização dos projetos apresentados pelas cidades-sede até o momento?
Leon Myssior –
A sociedade vem demonstrando uma razoável capacidade de mobilização por meio de seus representantes e entidades associativas (como o próprio Sinaenco); o mesmo não se pode dizer do Poder Público, que tem uma visão essencialmente política da Copa (e não técnica), e ainda assim difusa e sem objetividade (em contraponto a, por exemplo, a Olimpíada de Londres em 2012 que montou, desde o princípio, uma entidade multilateral para planejamento e gestão do evento.

Os projetos das Arenas, por sua vez, vêm sendo analisados pela Fifa e pelos comitês locais (estaduais e municipais), e as licitações para as obras, esperamos, devem ser fiscalizadas pelos Tribunais de Contas (da União e dos estados), tanto quanto pela sociedade civil e seus representantes, evitando assim, o desperdício do dinheiro público.

Universidade do Futebol – Qual a sua avaliação dos resultados do relatório "Vitrine ou vidraça – os desafios do Brasil para a Copa de 2014”?
Leon Myssior –
O Sinaenco foi precussor ao 'pensar' a Copa no Brasil, o que não poderia ser diferente, na medida em que congrega, exatamente, as empresas de arquitetura, gerenciamento, fiscalização e engenharia consultiva, que têm o planejamento em seu DNA e razão de existência.

Gostamos de acreditar que o relatório 'Vitrine ou Vidraça' tenha sido o primeiro - e mais completo diagnóstico da situação da infraestrutura no país, tanto quanto um 'alerta' às autoridades para o desafio que se apresenta, e para o legado que esperamos para 2015.

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Benê Lima