Rodrigo Azevedo Leitão
O FC Barcelona parecia preso pelo Estudiantes. Enquanto a equipe espanhola mostrava dificuldades ofensivas estruturais, o que é incomum, a equipe argentina apresentava jogo zonal com estruturas móveis muito bem organizadas. No final, somente no final, o Barcelona conseguiu fazer o que devia...
Muitas matérias, colunas, relatos e análises foram feitas a respeito da partida final do Mundial de Clubes da Fifa 2009.
Li artigos ingleses, espanhóis, portugueses, argentinos, paraguaios, uruguaios, brasileiros, enfim de diversas origens, e com diferentes tipos de abordagem e enfoque.
Muitas coisas boas e interessantes, coisas que não precisam ser ditas novamente, porque já foram muito bem colocadas.
Como também vi o jogo, e inevitavelmente, tive minha atenção captada por algumas questões que envolveram as dinâmicas das equipes, quero apresentar e acrescentar novos ingredientes a todas as discussões já feitas até então.
Vou então, explorar alguns detalhes do jogo que dizem respeito a organização das equipes, sob a perspectiva funcional e estrutural de suas dinâmicas, especialmente sobre o primeiro tempo da partida. Quero chamar a atenção e fazer apontamentos para as dificuldades da equipe do FC Barcelona que pareceu ter seu jogo “amarrado” pelo Estudiantes, o que de certa forma surpreendeu alguns torcedores desavisados, que esperavam um “atropelo” por parte da equipe espanhola.
O FC Barcelona tem um Modelo de Jogo bem definido, credenciado faz anos e posto à prova inúmeras vezes. Manutenção da posse da bola, ataques apoiados, transições defensivas rápidas e agressivas, tentativas constantes de recuperação da posse da bola. Esquema tático base (matriz), o 1-4-3-3. Não foi diferente no jogo (pelo menos em grande parte dele).
O Estudiantes de la Plata, com ações bem definidas e estruturadas, optou por um jogo de progressão rápida ao ataque, com intensas transições ofensivas. Defensivamente, realizou pressões setorizadas tentando recuperar a posse da bola, predominando porém, as ações organizadas para impedir a progressão do Barcelona ao campo de ataque (ações de ocupação racional do espaço, e não de ataque a bola). Sem a bola, estruturou um 1-4-4-2 (com meio campo em losango), que por vezes se pareceu com um 1-4-3-1-2 (mas não era), com excelentes estruturas móveis. Com a bola, construiu em campo um 1-3-4-1-2, que foi mais transitório do que realmente concreto.
Pois bem, com as equipes com propostas de jogo bem definidas, boa parte dos “especialistas” acreditavam que o FC Barcelona ia impor sua maneira de jogar, e que restava ao Estudiantes esperar o apito final do árbitro para formalizar a derrota.
Pois é, mas o que se viu foi um Barcelona, com posse de bola sim, mas com muita dificuldade para fazer evoluir seu jogo ao campo de ataque. A equipe espanhola teve tantos problemas que nem sequer seu jogo zonal de ocupação dos espaços conseguiu predominar.
O primeiro grande obstáculo para o FC Barcelona foi a forma com que o Estudiantes de la Plata estruturou seu posicionamento base (matriz) para a ocupação dos espaços. O encaixe entre os esquemas táticos das equipes, especialmente pela geometria apresentada pelo Estudiantes quando estava sem bola, fez com que a equipe espanhola tivesse quase que a todo tempo desvantagem numérica de jogadores nas regiões do campo onde estava a bola (principalmente a partir da linha do meio-campo, aumentando consideravelmente conforme o Barcelona tentava progredir).
A equipe argentina, apresentou um jogo zonal bastante interessante. Com estruturas móveis bem definidas, alguns jogadores, especialmente no setor de meio campo e na direita da linha de defesa, puderam trocar constantemente de posição nas recomposições após perda da posse da bola. Essas estruturas facilitaram a manutenção do esquema tático proposto por seu treinador, principalmente sem a posse da bola.
Como o jogo definido pelo Estudiantes preconizava, como uma das referências defensivas mestras, a vantagem numérica na região da bola (impedindo progressão, direcionando e depois atacando-a), com certa frequência precisou ter um número grande de jogadores recompondo atrás de sua linha (a linha da bola); o que foi uma vantagem defensiva, mas ofensivamente trouxe dificuldades.
Isso principalmente porque apostou em um jogo de progressão rápida ao campo de ataque – o que demonstrou problemas já que ao recuperar a posse da bola, normalmente tinha poucos jogadores já posicionados a frente dela, em condições de recebê-la e mantê-la no campo de ataque.
O FC Barcelona, com as dificuldades iniciais, desmanchou diversas vezes o seu sempre bem definido desenho tático. Não obteve êxito. Até mesmo o jogador Ibrahimovic, normalmente um dos principais responsáveis por aumentar o espaço efetivo de jogo em profundidade quando o Barcelona está com a posse da bola, passou a buscá-la entrando na linha do meio campo (tentando compensar a desvantagem numérica de sua equipe nesse setor).
O que aparentemente poderia ser parte da solução, na verdade aumentou os problemas da equipe espanhola, já que acabou por diminuir seu espaço efetivo de jogo, e eliminou diversas vezes a possibilidade dos passes em profundidade alongados (o Estudiantes marcava zonalmente, portanto a movimentação de Ibrahimovic não desencadeava desequilíbrios na linha de defesa argentina).
A força defensiva do Estudiantes de la Plata foi aumentada pelas típicas características da equipe espanhola, que nas transições ofensivas, primeiro buscava tirar a bola da zona de pressão para depois progredir; e que nas progressões sempre preferiu o jogo apoiado.
A inteligência do Estudiantes de la Plata, foi fazer com que o jogo preferido do FC Barcelona se tornasse de certo modo confortável a ele (Estudiantes); não tentou mudá-lo. Seus grandes pecados, foram, não estar totalmente pronto para a possibilidade (ainda que pequena) de uma mudança de comportamento típico da equipe espanhola (o que aconteceu no final do segundo tempo), e de ter perdido força ofensiva para cumprir suas referências defensivas.
O resto da história, todo mundo já sabe...
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Benê Lima