Realização de grandes eventos também promove a colaboração entre os setores público e privado e entre estes e as comunidades envolvidas
Ronaldo Crespilho Sagres
Em 30 de outubro de 2007, o Brasil foi escolhido para sediar a Copa de 2014. Estava com um colega almoçando em um tradicional clube de São Paulo quando acompanhávamos o anúncio oficial e ele me disse: “Agora o mercado para os advogados especialistas em Direito Desportivo irá expandir de forma significativa, mãos a obra meu amigo”. Concordei acenando com a cabeça enquanto olhava na TV a festa que os atletas faziam comemorando a escolha.
A Copa do Mundo estatisticamente não se compara a nada, não só em volume financeiro, mas também em grau de exposição, visibilidade e multidisciplinariedade dos países e pessoas envolvidas. O presente artigo tem a finalidade de compartilhar com os colegas uma visão pessoal, mas também a experiência profissional de um advogado militante no seara desportiva.
O Direito Desportivo ganhou grande salto e exposição no ano de 1998, com o advento da Lei Pelé. Muitos profissionais então se lançaram, ainda que timidamente, no Mercado buscando soluções aos seus clientes em face dos clubes que muitas vezes deixavam de recolher salários, FGTS, verbas de natureza previdenciária e até questionando a chamada bilateralidade ou não da cláusula penal.
Neste momento o advogado atuava de forma extremamente contenciosa levando os clubes e torcedores ao ódio de ter seus ativos desvinculados do patrimônio dos clubes em razão da inadimplência financeira com estes. Nos anos seguintes os clubes teriam grandes perdas financeiras e que talvez não seriam reparáveis a um curto espaço de tempo.
Muito advogados se beneficiaram do momento de transição de legislação para levar aos tribunais questões jurídicas que antes eram afetas aos tribunais disciplinares que também conheciam de matéria trabalhista.
Aqui não se faz nenhuma critica, mas o Judiciário naquele momento ainda não tinha qualquer familiaridade com a matéria causando muitas dúvidas nas decisões prolatadas e disparidade nos julgados.
Os anos se seguiram e a Lei Pelé sofreu inúmeras alterações causando dificuldades no entendimento dos profissionais envolvidos, mas gerando também oportunidades para o conhecimento e geração de valor aos profissionais do Direito Desportivo, que com dedicação e afinco se estabelecerão neste mercado e passaram a ser referência nesta matéria.
O perfil do advogado desportivo
Atualmente há um misto de profissionais migrando de outras áreas para atuar em Direito Desportivo, dada a sua multidisciplinariedade, e isso é muito positivo.
Temos visto profissionais da área de propriedade industrial assessorando os clubes em suas marcas, desenvolvendo licenciamentos e até mesmo buscando parceiros internacionais para o desenvolvimento de produtos na área esportiva.
Outra área bastante procurada por clubes principalmente vem dos advogados tributaristas que encontraram nos clubes de futebol fatia bastante interessante para levar suas teses à apreciação do Judiciário ou mesmo na esfera administrativa.
Com a escolha do Brasil para sede da Copa de 2014 e de um programa da Fifa chamado Green Goal haverá também a demanda por advogados com expertise em Direito Ambiental, visto que a Fifa exige o respeito total a sustentabilidade e qualquer de seus eventos.
O mercado de trabalho
No início o mercado de trabalho era bastante circunscrito as questões disciplinares desportivas, ou seja, os advogados atuavam nas Federações locais e Confederações.
Com o advento da Lei Pelé os Profissionais migraram para a Justiça do Trabalho e algumas matérias de extrema relevância chegam ao Tribunal Superior do Trabalho para serem decididas e nortearem os rumos dos próximos anos.
Recentemente temos visto grande crescimento nas questões disciplinares e jurídicas junto a Fifa o que faz com que o advogado se manifeste em outros idiomas e também compreenda e domine os regulamentos Internacionais.
O mercado de trabalho cresce também em razão dos grandes eventos Esportivos em que o Brasil sediará nos próximos anos.
O papel do advogado se mostra extremamente relevante a partir do momento em que contratos das mais diversas modalidades serão celebrados junto ao Poder Público ou com a iniciativa privada.
Os aspectos de propriedade industrial certamente terão grande destaque visto que produtos licenciados seguiram regras próprias, provocando discussões sobre a soberania da Fifa no território brasileiro e da sua amplitude.
No quesito sustentabilidade, Vancouver foi um ótimo exemplo. Para promover os Jogos Olímpicos de Inverno mais verdes da história, em fevereiro de 2010, a organização do evento pediu à pessoas que planejavam viajar para a cidade que adquirissem crédito para neutralizar as cerca de 268 mil toneladas de dióxido de carbono que os jogos iriam produzir.
Diante dessa informação existe a real necessidade de advogados na área ambiental, muitas vezes para orientar e também para sugerir ações como esta, afim de agregar valor aos seus clientes, quer sejam provenientes da iniciativa privada, quer sejam da iniciativa governamental.
O legado também desses eventos esportivos, sem é claro entrar no mérito sobre a sua sustentabilidade econômica ou não, trará aos profissionais do Direito um crescimento exponencial aos interesses dos mega eventos, e dependendo de nossa avaliação enquanto organizadores esta evolução não cessará nas próximas gerações e este mercado certamente veio para ficar.
A internacionalização do Direito Desportivo
O profissional do Direito interessado em atuar ou desenvolver no seu escritório a área em Direito Desportivo terá também como missão de formar pessoas com habilidades internacionais não só na legislação competente como também na questão ética e corporativa.
Na legislação muitos escritórios se especializaram em mercados específicos como, por exemplo, o Japão, Coréia e China que nos últimos anos teve seu esporte bastante desenvolvido, sofrendo recentemente no ano de 2008 uma queda nos investimentos que fizeram na aquisição de atletas, mas esta crise afetou praticamente a maioria dos países contratantes.
Na questão ética e corporativa envolve o investimento em conhecer a cultura de seu cliente, a fim de evitar gafes nas negociações.
Temos conhecimento de inúmeras histórias vividas por colegas que por não se atentarem para estes fatos deixaram de realizar negócios milionários por detalhes não atendidos, como postura nas tratativas comerciais.
Os mega eventos na agenda
Os mega eventos esportivos mundiais, passaram a integrar a agenda de grande parte dos governos ao redor do mundo, constituem-se em elementos catalisadores de oportunidades tanto para empresas quanto para investidores ao influenciar diretamente o desempenho econômico, político e social de um país.
O Brasil sediará esses mega eventos nos próximos anos, Copa do Mundo da Fifa em 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Ao hospedar um grande evento, nosso país começará a experimentar rapidamente uma ampla gama de temas e atividades que não seria vivenciada em tempos normais. De fato, os mega eventos têm a qualidade de congregar as pessoas em um objetivo comum, como também de conduzir a realização de programas e projetos que levariam décadas para serem concebidos e concluídos.
Além disso, as iniciativas são incentivadas a serem realizadas de forma eficiente diante das exigências estabelecidas pelos organizadores dos eventos e até mesmo por conta da demanda local e estrangeira.
A realização de grandes eventos também promove a colaboração entre os setores público e privado e entre estes e as comunidades envolvidas. Eles flexibilizam e estimulam as relações entre os vários níveis de governo e melhoram a sua eficiência, além de introduzirem novas ideias e comportamentos, tais como os relacionados à sustentabilidade ambiental e à diversidade, entre outros.
A empresa de Consultoria e Auditoria Deloitte Touche Tohmatsu fez um estudo com o Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (IBRI) como as organizações e o mercado estão se posicionando diante dessas novas perspectivas.
A Copa do Mundo, organizada pela Fifa, também é um evento que suplanta seu caráter esportivo, oferecendo uma grande oportunidade para acelerar o desenvolvimento econômico e social das cidades-sede e de todo o País.
Na Alemanha, por exemplo, que sediou a Copa do Mundo de 2006, os benefícios envolveram um acréscimo de 8 bilhões de euros no Produto Interno Bruto alemão, no período 2003 a 2010, além a geração de 50 mil novos empregos e uma grande atividade para turistas — 52 mil espectadores, em média, por partida, e 800 milhões de euros gastos pelos visitantes. A Copa de 2006 também incrementou o turismo quando mudou a percepção dos estrangeiros sobre a fama da Alemanha em ser um país de povo frio e pouco hospitaleiro.
Assim o Brasil, país do futebol, terá uma oportunidade única para mudar de patamar político e econômico e esta decisão caberá aos seus organizadores.
Gestão de projetos para outros profissionais
Aqui cabe uma dica pessoal que pode agregar ao leitor que hoje busca uma oportunidade profissional. Quando iniciei os meus estudos, poucos eram os livros que abordavam este assunto, razão pela qual decidi por escolher este tema e compartilhar com os colegas.
Atualmente entendo importante ao profissional do Direito ter e desenvolver a habilidade de fazer projetos e este conselho tendo dito aos meus alunos e amigos visto no cenário esportivo há um demanda crescente desse profissional.
Existe uma infinidade de cursos de gerenciamento de projetos que poderão agregar ao profissional do Direito um valor no mercado, tendo em visto que participar muitas vezes de projetos ligados a construção de centros de treinamento, gestão de carreira de seus clientes e programas ambientais.
Assim, faz se necessário o conhecimento e a utilização de softwares a fim de entender as fases, os processos e clareza do escopo de seus planos.
A cocência em Direito Desportivo
Um mercado bastante promissor para o advogado é a docência em Direito Desportivo.
Em razão de algumas universidades serem obrigadas no seu ultimo ano de sua graduação a determinarem matérias optativas aos seus discentes e por motivos da realização dos eventos esportivos ocorrerem nos próximos anos o interesse desses alunos por matérias e assuntos dessa natureza a demanda por este profissional e agora professor será certa.
Com a realização da Copa do Mundo e Olimpíadas as atividades de treinamento, gestão e especialização em esportes vem evoluindo de forma significante permitindo ao advogado especialista um grande mercado para atuar em universidades de diversas regiões e estados do território nacional.
O advogado parecerista
Inúmeras são as questões debatidas no Direito Desportivo, principalmente nas cortes trabalhistas, o que faz com advogados renomados se debrucem para estudar as questões especificas das diversas modalidades e após o pleno conhecimento e elaboração de artigos e arrazoados, muitos profissionais já renomados lançam seus entendimentos afim de esclarecer ou defender seus posicionamentos junto aos juízes, fazendo com que as decisões produzam futuros julgados e norteiam esta ciência que em breve será considera autônoma.
Advogado como agente de atletas
O advogado é bastante presente nas relações com os atletas, ocorre que em razão do aumento e da responsabilidade na elaboração dos contratos e da multidisciplinariedade de conhecimentos o profissional das leis vem sendo contratado por atletas das mais diversas modalidades para ser assessorado nas negociações envolvendo clubes, investidores, patrocinadores e empresas de licenciamento.
Os atletas buscam atualmente um gestor de carreira com conhecimentos jurídicos e domine os regulamentos internacionais da Fifa e diversas matérias, como Direito Tributário, Internacional, Civil e Penal.
Este mercado cresce com a evolução e profissionalização das diversas modalidades que buscam muitas vezes grandes bancas de advogados para cuidar apenas de um atleta, dada a repercussão e amplitude que esses profissionais ganham pelo mundo e do reconhecimento regulamentar por parte da Fifa do advogado com agente de atletas.
Advogado como gerente de clube profissional
Muitos clubes, das diversas modalidades, vêm cada dia mais necessitando da figura presente de um profissional que conheça todas as modalidades de legislação existente no cenário desportivo nacional e internacional, o que faz com que advogados sejam contratados para serem gerentes de futebol e atuarem não só na questão jurídica, mas também nas negociações envolvendo interesse de atletas e clubes profissionais.
Este profissional assessora os diretores e presidentes de clube e também funciona como um “filtro” do Jurídico com os demais profissionais.
Além da formação jurídica, muitos profissionais buscam também a formação na administração esportiva para conhecerem as atribuições que lhes cabem na administração dos conflitos existentes no dia a dia e nos bastidores dos clubes.
Importante também destacar a relação deste profissional com a imprensa, visto que qualquer declaração poderá gerar efeitos dentro e fora das quatro linhas do campo.
A relação com os assessores de imprensa também do próprio clube quando eventualmente emitem uma nota por escrito sobre determinado fato poderá antecipar, controlar ou inflamar um problema interno existente.
Outro ponto a ser conduzido é a relação com os agentes de atletas que buscam a exposição de seus clientes e trazem às vezes propostas comerciais de grande relevância onde o clube em razão de suas despesas e custo fixo tem que realizar eventual transferência e preencher ou substituir eventual falta.
Importante destacar o planejamento feito junto com as demais áreas, criando um veículo de comunicação bastante eficiente em razão da celeridade e dinâmica presente no negócio esportivo. Esta previsão inclui noções básicas de contabilidade e administração financeira que em muito caso facilita e muito a vinda de atletas renomados. Citamos como exemplo a vinda do atleta Ronaldo, que fez uma excelente parceria para complementar seus ganhos com ações de marketing desenvolvidas pelo clube.
Por fim cabe enfatizar que iniciativas como essa do Tribunal Superior do Trabalho em realizar este encontro com profissionais dos mais diversos campos de atuação e regiões do país se encontrarem para decidir os marcos, os nortes deste direito que mexe com a emoção, com o sonho, com a expectativa de milhares de pessoas que em determinadas modalidades conseguem suspender guerras e provocar reações passionais aos mais frios dos povos e dos lugares mais distantes do mundo.
Gostaria de encerrar este artigo com um frase que adoto sempre, de Martin Luther King: “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas sim o silêncio dos bons”. Cabe a cada um de nós deixarmos de ser coadjuvantes e sermos protagonistas desta história chamada Direito Desportivo.
Quanto mais profissionais se dedicarem a esta matéria, a este negócio, mais qualificação teremos, mais mercados serão explorados, e mais conquistas poderemos dividir na certeza que juntos podemos mais.
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por seu comentário.
Em breve ele será moderado.
Benê Lima