Clube inglês explicita confiança no atleta, na auto-avaliação do jogador sobre suas condições físicas e no comprometimento do mesmo de seguir os procedimentos indicados
Eduardo Fantato
Neste fim de semana assistia à uma matéria na televisão com o jogador Lucas, do Liverpool. Na reportagem, o jornalista Décio Lopes acompanhou o volante até os vestiários dos atletas e demais bastidores do clube.
Muito mais do que a tecnologia propriamente dita, me chamou a atenção a relação de confiança que se estabelece com o atleta.
Num determinado momento, Lucas apresenta uma balança localizada de frente para um aparelho de TV. Lucas disse que ali os atletas se pesam e anotam na TV (touchscreen) a informação, e esta já fica registrada para todos os departamentos. Ainda nesse monitor, o atleta pode indicar se apresenta algum desconforto muscular, dor, mal estar, indicando de 0 a 10 o nível do incômodo. Esse indicativo fica, automaticamente, registrado para todos os departamentos: fisioterapia, médico, preparação física, etc.
Na conversa informal entre Lucas e Décio Lopes é possível identificarmos por trás uma rotina contada pelo atleta de forma simples, que denota aquilo que sempre discutimos sobre tecnologia não ser apenas recursos e equipamentos, mas sobretudo processos. Um pouco mais adiante na reportagem, Lucas aponta um quadro branco no qual os atletas podem declarar interesse e agendar se querem ou não receber massagens.
Qual a diferença entre a balança de frente para o monitor touchscreen e o quadro branco? Apenas os recursos tecnológicos empregados, mas o processo que rege o funcionamento de ambos é o mesmo. E é o que merece destaque. É um modelo simples e objetivo de como pode ser utilizada a gestão do conhecimento no futebol. É certo que estamos simplificando o que esse tipo de gestão pode agregar, mas já é uma mostra clara de como as coisas são muito mais simples do que muitos imaginam e acabam se tornando resistentes à adoção de novos modelos tecnológicos e gerências no futebol.
O primeiro aspecto desse processo que Lucas demonstrou e que deve ser destacado tem um vínculo cultural que é importante, porque não significa que o mesmo modelo daria certo no Brasil. Esse ponto é justamente a confiança que o departamento de futebol deposita no atleta, na auto-avaliação do jogador sobre suas condições físicas e do comprometimento do mesmo de seguir os procedimentos indicados. Provavelmente (e isso fica no campo da suposição, pois a entrevista não nos permitiu ter clareza do que pode ser tomada como ação) o atleta que mente ou faz o famoso “migué”, seja nas informações sobre condição física ou no cumprimento dos procedimentos, deve ser cobrado e punido por isso. Talvez esse cumprimento à regra seja uma parte que dificulte o processo no futebol nacional.
Mesmo que os valores culturais possam criar certa distância, é imprescindível que esse compartilhamento de informações, que no caso inglês começa com o atleta, seja de fato valorizado dentro do clube, que exista o diálogo entre os departamentos, e que esse diálogo não fique apenas no discurso para “inglês” ver (sem querer forçar o trocadilho).
A disponibilização das informações, o compartilhamento das mesmas, facilita o histórico e a intervenção sobre uma determinada situação. Para isso o próprio Liverpool nos dá o exemplo de que seja com o advento tecnológico ou com uma simples lousa, a gestão do conhecimento acontece por estar pautada em processo.
Nada muito complexo, mas pode ser que para o futebol brasileiro, que insiste em considerar o processo um retrocesso, isso tudo possa ser um paradoxo, e o que é pior, um paradoxo do avesso, à medida que as informações compartilhadas precisam ser assumidas como verdade, e aí...
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por seu comentário.
Em breve ele será moderado.
Benê Lima